Crítica | Drake, “Honestly, Nevermind”

Drake mergulha de vez nas pistas de dança com o bom “Honestly, Nevermind”

Se ainda haviam questionamentos sobre os caminhos trilhados por Drake não só na cultura hip hop como também no mundo da música pop, após o lançamento de Honestly, Nevermind, seu mais novo disco, é provável que as dúvidas se tornem inexistentes — pelo menos por um tempo.

O sétimo trabalho de estúdio do artista chega exatamente nove meses depois de Certified Lover Boy, sexto álbum da carreira, fazendo alusão ao que se pode entender como o período de gestação de uma mãe — agora tornam-se claros os motivos por trás da arte de capa da obra de 2021. No entanto, ainda que o também popstar tenha criado certa conexão entre um trabalho e outro, o novo álbum vai na contramão das expectativas e não funciona exatamente como uma sequência do antecessor.

Capa do Certified Lover Boy (reprodução)

Honestly, Nevermind é um passo complacente e corajoso em destino a glória pop de quem há muito tempo não possui necessidade de aprovação. Em canções diretamente influenciadas pela house music, Drake mostra qualidade na voz — uxiliada pelo ótimo uso de efeitos como autotune e melodyne -, tornando protagonistas as melodias cantadas antes já vistas em tracks como “One Dance”, “Passionfruit”, “Hotline Bling” e “Hold On, We’re Going Home”. O mood alegre, festivo e veraneio do conjunto aponta para mais um sucesso comercial, é claro, mas também soa como a justificativa perfeita para o canadense guiar a trilha sonora dos amores e aventuras summer type do território norte-americano.

Produzido com a colaboração da banda africana Black Coffee, trabalho é refrescante, um pouco furtivo, muito dance e se distancia da temática complexa sobre a vida vista em Certified Lover Boy, por exemplo: pela primeira vez na carreira o eu-lírico abandona totalmente o rap para explorar vertentes da música pop. Não funciona nas primeiras três músicas completas que sucedem a boa intro, mas a partir da ótima “A Keeper” é possível entender de onde vem a força que engrandece a obra e torna o play muito fácil.

Sticky”, “Massive” e “Flight’s Booked” é a tríade brilhosa de Honestly, Nevermind e merecem ser singles, principalmente se o canadense ainda possuir como objetivo principal se estabilizar como referência popular na indústria fonográfica mainstream, ainda que ele grite aos quatro ventos que o reconhecimento mundial não é mais um combustível na carreira.

Overdrive” também merece menção como uma espécie de ótimo carro-chefe de headliner de festivais EDM, por exemplo. O fato do rapper se aproximar sonoramente das fórmulas prontas que seguem padrões há muito tempo utilizados no mainstream pode irritar os que possuem dificuldade de entender que não são tão importantes assim para consumir apenas o que não é de conhecimento e apreciação geral, mas a verdade incontestável que rodeia esta nova é simples e direta: Drake quer fazer com que seus ouvintes dancem e aproveitem a experiência com leveza e de forma descompromissada.

Ainda assim, o MC encontra tempo para trazer 21 Savage na última canção. Excelente, “Jimmy Cooks” carrega sonoridade tomada pelo trap. Aqui, volta a falar sobre assuntos antes visitados em Certified Lover Boy, como a agenda lotada entre os períodos de gravação, turnês e eventos dignos de um superstar. Passeia entre assuntos como a traição de falsos amigos, menciona o parceiro J. Cole, deseja que Lil Keed e Drama King descanse em paz, mas ainda que a track seja de grandíssima qualidade, soa como se fosse um presente para manter os antigos fãs atentos até o final do disco. Por si só, funciona com muita facilidade. No entanto, para quem tenta apreciar o conjunto da obra como uma única experiência, é até um pouco desajustado perceber que um bom disco dance termina sua passagem com uma grande faixa trap.

Drake para a THE FADER Magazine (reprodução)

Honestly, Nevermind é groovy, robusto e atraente como as coreografias desajeitadas de um par romântico em meio a uma noite acalorada de boate entre flashes e gelo seco; tudo soa muito luxuoso e instintivo de forma bem executada. Não se tem a menor dúvida que estes futuro-presentes hits serão figurinhas carimbadas nas maiores rádios e playlists de todo o planeta, entretanto, é importante analisar o fato de um popstar com números estratosféricos estar trazendo para seu catálogo artístico a estética da dance music, que faz conexão direta às raízes da música negra contemporânea, assim como o rap.

Expressivo, moderno, piscante e conceitual, ainda que com pouca profundidade em seus temas, o sétimo álbum de estúdio de Drake o introduz às novas gerações como uma personalidade muito distinta da que conquistou espaço no posto mais alto do “rap game”.

Dreezy talvez esteja cada vez mais longe do que os fãs de rap esperam, mas caminha a passos largos para consolidar com veemência seu nome na eternidade. E em 2022 é mais do que necessário entender que talvez não o faça sendo unânime.

Nota: 66/100

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