Crítica | Ariana Grande, “Positions”

Indo na onda de lançamentos inesperados, Ariana Grande utiliza velhos métodos para mirar novos acertos em positions.

2020 é realmente um grande ano para as mulheres na música, tanto em qualidade quanto em quantidade. Depois dos grandes lançamentos de Lady Gaga, Dua Lipa e Taylor Swift (apenas para citar alguns exemplos) parece que nada mais pode acontecer. A não ser que algum nome muito grande na indústria decida simplesmente anunciar um disco novo alguns dias antes do seu lançamento oficial.

Quem realmente fatura com tudo isso é o público, que não tem do que reclamar devido a tantas músicas para adicionar nas playlists pessoais de mood. E esse volume de projetos sendo feitos em tempos de quarentena também é reflexo de falta da maior atividade que um músico tem que lidar no momento, a ausência de shows. Pensando de forma fria é possível até deduzir que faturamento monetário pode ser uma razão para tais lançamentos (o que faz mais sentido para um artista menor, devido a quantia paga por serviços de streaming). Mas quando falamos sobre uma das artistas de maior peso atualmente não pensamos em dinheiro… mas nos perguntamos: qual foi a razão que fez Ariana Grande optar por fazer isso agora?

Desde quando lançou ‘Yours Truly’ em 2013 a cantora não saiu do ouvido das pessoas. Conseguiu se livrar da sombra de coadjuvante de seriado infanto-juvenil e se tornar uma queridinha do público e da crítica, fazendo com que a curiosidade por cada trabalho musical se tornasse cada vez maior. Se o que despertou o interesse foram seus fantásticos vocais, o que tornou esse sentimento algo recorrente foi a sua musicalidade. A cada álbum ela trazia uma prova diferente de que merecia sim ter um lugar cativo entre os maiores artistas do momento, e conseguiu. Mas o que ‘Positions‘ adiciona de relevância a sua discografia?

Um dos maiores acertos é justamente a duração das suas músicas, mesmo que o uso excessivo de fade-out acabe dando uma sensação estranha, é bom ver como Ariana sempre soube trabalhar com um todo rondando cerca de quarenta minutos totais. Outro ponto positivo é não se parecer tanto assim com trabalhos passados, já que as críticas sobre uma sonoridade muito repetitiva é o que sempre assombrava qualquer novo single. Uma forma de inspiração ainda existe, como uma base para definir onde cada produção deve se guiar, mas de maneira mais leve… quase que com um objetivo de parecer menos trabalhado. 

Em ‘shut up’ a adição de um instrumental próximo do cru com apoio de cordas é o que realmente dá o enfeite necessário, funciona como intro tanto quanto como uma música comum. Soltar demais isso acaba deixando a produção apática, como acontece em ‘34+35’. O que acontece com ‘nasty’ e ‘six thirty’ é dar uma impressão de que tudo foi criado como se fossem faixas pop que no meio do caminho sofreram uma mudança de direção. Trazendo aquela famosa reclamação à tona: de que suas canções soam muito parecidas.

Algo que realmente pesa é a falta de criatividade nos vocais, principalmente vindo de uma vocalista tão poderosa quanto a que temos aqui. É triste ouvir modulações quase idênticas, onde apenas poucos retoques que levariam seu canto a diferentes caminhos já poderiam fazer uma grande diferença.

‘my hair’ e ‘love language’ conseguem sair da zona de conforto de forma tímida… o que ajuda o disco a não se tornar refém de seu próprio ritmo, já que a vibe das duas é algo um pouco fora da curva.

A faixa ‘Positions’ não foi o suficiente para trazer uma grande ansiedade para o disco, justamente por parecer algo muito básico vindo da artista. Ela soa como uma boa bonus track de ‘thank u, next’, o bastante para enganar os ouvidos durante alguns dias, ao mesmo tempo em que corre o risco de ter tanta força quanto ‘Focus’ teve em sua carreira.

Os melhores momentos acontecem quando Ariana não está sozinha, em ‘motive’ a produção acelera um pouco, quase com uma pitada de dance, e a colaboração com Doja Cat trás uma sintonia tão boa que chega a dar saudades das faixas com Nicki Minaj, provando que um dueto com rapper feminina é sempre bem vindo. ‘safety net’ com Ty Dolla $ign engata o bastante para animar novamente o ouvinte sem oferecer algo tão novo, além de ser uma típica canção arroz com feijão da artista, que tende a agradar qualquer desavisado que apenas busca um dueto bonitinho.

Felizmente a expectativa para a nova participação de The Weeknd foi alcançada, e ‘off the table’ é a que ganha mais pontos. A forma como os dois combinam é tão mágica que sempre deixa desejos de um possível álbum colaborativo, e propositalmente ou não essa também é a faixa mais sensual de todo o álbum.

Positions’ é um pequeno passo na tentativa de mirar novos acertos se baseando em velhos métodos. A real discussão aqui é sobre sua estrutura, já que em muitos momentos nem se parece tanto com um álbum oficial, e sim um projeto paralelo. Fica mais difícil ainda acreditar que houve realmente uma abordagem séria (principalmente após a cantora ter dito que não tinha planos de lançar qualquer disco durante a pandemia) quando ele não parece fazer qualquer cócega para agradar os ouvintes. O disco não tenta inventar a roda, e não tem problema algum nisso, mas ele também não tenta ao menos trazer algo que o faça ter qualquer tipo de importância na discografia que faz parte.

A sorte de Ariana Grande é ser uma artista acima da média, então qualquer pouco esforço ainda sim é o bastante para entregar um projeto sólido. Mas quando temos uma nivelação por cima, não se espera nada além de algo que realmente faça a diferença, e que diga (ou cante) que existe sim um espaço para este trabalho dentre tantos tão significativos. O resultado final é como um brinquedo novo, impossível não ficar sem brincar com ele durante os primeiros dias, mas que em algum momento será esquecido e trocado por um outro [disco da discografia], algum que mesmo tão criticado e batido ainda oferece muito mais diversão. 

Nota do autor: 68/100

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