Crítica | Wolf Alice, “Blue Weekend”

O 3º disco do quarteto expõe através de detalhes técnicos impecáveis, canções primorosas e vigentes, mesmo retratando tudo com melancolia.

O mar que qualquer obra, ainda mais sonora, pode explorar é imenso. Porém, o que melhor culmina um bom resultado é a inserção de explorações com devida cautela. Ninguém gosta de presenciar inúmeras coisas ao mesmo tempo que não façam sentido. Por isso, é importante saber subtrair para poder somar. Dentro do ramo musical, artistas inserem diversas camadas musicais que a cada vez que se ouve o trabalho, desbrava-se sonoridades novas, que logo, põem em órbita uma nova experiência. E esse ano, até o momento, quem soube mesclar grandiosas cores e ondas dentro de músicas, foi a banda Wolf Alice com o 3º álbum de estúdio, o “Blue Weekend“.

O quarteto retorna após os trabalhos do “Visions Of a Life” (de 2017) com um disco que auto expande a sua estética e atmosfera de maneira mágica por através de jogos musicais que evidenciam grandeza. Com as guitarras sendo o ponto chave para fazermos nos adentramos no azul e opaco universo, ela as vezes chega a imitar um mar de loucuras dignas de se prestigiar com o coração e a alma, em produções que não poupam aprofundar-se o tempo todo em suas próprias águas turbulentas.

A jornada se torna imersiva logo em “The Beach“, que se fazendo por guitarras tranquilas em seu começo, passa a se estremecer da metade para o final em um som que desde o seu primeiro momento, pestaneja confiança. É surreal ver como apenas a voz de Ellie Rowsell em um tom maior e os gritos produzidos pelo instrumento juntos de vozes no fundo, somam à música um tipo de euforia mística.

Os 5 minutos de “Delicious Things” evocam a mesma aura, que com melodias encantadoras e charmosas são capazes de fazer o ouvinte levitar ao ouvir Ellie esticar o “I” em “I, I won’t say, I’ll give it a go”, sempre circundado uma construção de narrativa insana pela letra, se mantendo melodramática até o seu fim.

Entonada pela voz de Roswell como um recital logo na entrada, as batidas que tornam o coração de “Lipstick On The Glass” azul são feitas por uma canção que através de sobreposições e o bom uso de melodias simples compostas pelo uso majestoso dos instrumentos, tornam tudo visto aqui em grandioso, é uma das canções com aquelas nuances mais densas que a banda preza.

O breve lamento no começo de “Smile” é apenas um alarde para o punk eufórico que vem a seguir, que ao mesmo tempo que se mostra feroz, sabe quando tem que acalmar o incêndio e ceder um espaço ao ouvinte. E com uma transição fenomenal, entramos em “Safe From Heartbreak (if you never fall in love)“, que em seus quase 3 minutos soa perfeita para deixar tocar enquanto entra na água gelada do mar. É surreal o tanto de modulações que a canção pode se adentrar, seja pelo seu parecer mais angelical ou pela diagramação que ao não esbanjar muito, ecoa o melhor. Ellie toca no âmago ao cantar o verso final.

Fluindo quase sorrateiramente para uma troca de música incrível, “How Can I Make It Ok?” é uma balada até contente em algumas bifurcações, e que na primeira troca de tom, faz o ouvinte percorrer em um espaço cintilante que abraça e contagia. É um dos pontos mais altos, mas até agora, todos são.

If you want me, you can find me at the bar
Lost souls congregate at the bar

Parte da ponte de “Smile“.

O verso “Urgency takes hold / But to live in fear isn’t to live at all” (em tradução: “Urgência toma conta / Mas viver com medo não é viver”) da faixa anterior parece ser o estopim para mostrar na selvagem “Play The Greatest Hits” a exaltação e o tumulto expostos pela música repleta de sentidos que parecem o raio ideal para sintonizar o oposto das linhas postas em “How Can I Make It Ok?”.

Feeling Myself” se torna real pelo funk baixo que não perde tempo em partir para um amontoado de sons que ao chacoalharem, tornam a canção inteligente, no sentido de construção e também no que ela que quer transmitir, é silenciosa nos seus próprios tons e é a prévia da calmaria que continuará na parte final do álbum.

Talvez dentre todas, “The Last Man on Earth” seja a peça desse registro de estúdio da banda que mais soa distante da proposta. Por um lado, isso não seria bom, porém, a maneira que ela se amarra com a sua totalidade faz dela, o melhor momento de toda essa história. A letra incisiva se junta aos tons de uma poderosa balada clássica para ceder uma transposição de atmosfera dominante que se estenderá para o fim.

Not sure what I believe in
But I’ll be safe from heartbreak if I never fall in love

Parte do verso quatro de “Safe From Heartbreak (if you never fall in love)“.

A benção final se faz por inteira em “No Hard Feelings“, que exemplifica ternuna em um som mais acústico, mas que não deixa de lado as similaridade captivas e engenhosas vistas nas outras faixas. É o momento de serenidade que ata todas as interrogações do enredo. E então, quase tudo sucumbe por entre marés baixas no que é o maior acerto do álbum: “The Beach II” transporta o ouvinte para o fim em uma das melhores coisas vista nesses últimos anos.

É por entre as muitas definições intelectuais que o “Blue Weekend” emana por suas veias o melhor trabalho do ano até agora. A voz estupenda de Ellie, a narrativa, atmosfera, as cores, os visuais magníficos e estranhamentes conceituais (todas as músicas vêm ganhando clipes, o último foi de “Play The Greatest Hits”), e as canções ecléticas repletas de maturidade emocional, lírica e sonora, põem a banda primeiro plano quando o assunto é tratar com calor e profundidade emocional um álbum que provavelmente vai envelhcer como uma obra-prima.

Nota do autor: 100/100

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