O ANTI representou uma faceta muito mais intimista da cantora, trazendo um repertório bem menos ligado ao pop comercial. Com elementos do rap, trap, hip-hop e R&B tradicionais, Rihanna apresentou um material – que como o próprio nome sugere – representa uma ruptura ou oposição ao que ela vinha fazendo até então.
No 8º álbum, Rihanna oferece composições que exprimem fragilidade, sensualidade e intimismo. Seu tom é completamente envolvente no sentido mais sombrio da exploração instrumental e vocal. Músicas que não conversam com a “simplicidade” dos trabalhos anteriores e que exigem dos ouvintes uma conexão mais profunda do que a simples vontade de dançar.
Letras íntimas, polêmicas, que falam sobre sexo, drogas e sentimentos controversos estão presentes ao longo da carreira da cantora, mas nada como o que é apresentado no ANTI. O projeto pode parecer confuso aos ouvidos de quem acompanha Rihanna há anos e se apaixonou pelo pop desbocado da cantora, mas em seu todo é muito coerente com o tema de romper estruturas já estabelecidas.
Se opor a própria questão artística e industrial do segmento é um objetivo claro na obra, até porque neste álbum, ela também é a produtora executiva. ‘Consideration‘ (parceria com a brilhante SZA) abre o álbum com uma letra que em diversos pontos pode evocar esse aspecto de romper com conceitos da indústria que lhe foram impostos durante boa parte da carreira.
‘Work‘ – que repete a parceria da cantora com Drake – é talvez a canção mais “radiofônica” do ANTI, composta por um refrão mais repetitivo e uma batida dançante. ‘Love On The Brain‘ e ‘Kiss It Better‘ fazem parte das músicas que mais caíram no gosto do público, canções que trazem a mente sensualidade, paixão e elementos sonoros que remetem os anos 50 e 80. ‘Desperado‘ é uma canção forte no álbum, mais agressiva e intensa. Rihanna fala sobre um relacionamento perigoso, um amor que ela estaria disposta a investir e fugir junto. Na canção Rihanna evoca samples de “New Person, Same Old Mistakes”, do Tame Impala.
Já em músicas como ‘Close To You‘ e ‘Never Ending‘, ela demonstra mais melancolia e delicadeza. De modo geral, cada faixa é um combo de sentimentos, desiguais musicalmente, mas alinhados ao momento da cantora.
Um álbum que exprime conceito, reconhecimento e principalmente identidade
ANTI vai ainda mais além no ponto de ser um álbum conceitual. Seu propósito é tão sonoro quanto visual, da capa aos ensaios relacionados ao álbum. Criada pelo artista Roy Nachum, a capa do álbum foi apontada por Rihanna como a sua preferida dentre todas já desenvolvidas e demonstra o significado que a mesma quis expor com a obra: “Uma pessoa contrária a uma política, atividade ou ideia em particular”. Já na parte fotográfica, Rihanna trabalhou com o fotógrafo Paolo Roversi, nome forte no segmento e também diretor criativo da i-D Magazine. A parceria acabou gerando dois belíssimos ensaios para a promoção e para o encarte do disco.
Em uma indústria que cobra ainda mais das mulheres, o ANTI é a forma de Rihanna se posicionar como alguém que lutou para chegar em um patamar de excelência que a possibilita cantar o que quiser – algo que cantoras como Beyoncé e Lady Gaga também fizeram e outras novas seguem fazendo. Há de se apontar ainda que o disco pode dizer nas entrelinhas o porquê a cantora se afastou da música e decidiu ampliar seus horizontes profissionais.
A ressonância black excellence trata de um dos conceitos mais comentados há um tempo tornando-se até trend e por vezes esvaziado como temática. Mesmo que pessoas negras o alcancem, não passam de ser vistas como medianas diante de artistas brancos. Mostrar facetas que vão além do sucesso na indústria musical – na qual ela já se consolidou – é também uma forma de mostrar que ela (e os seus) podem ter sucesso em absolutamente tudo que se propõem, já que não tem medo de se esforçar para tal.
O ANTI conta com parceiros de peso em sua produção que reforçam, inclusive, as referências sonoras do disco. Nomes como Timbaland, Travis Scott e Hit-Boy estão entre as assinaturas artísticas que constroem o projeto. Embora apresente uma certa disparidade sonora que cause estranheza nos amantes das farofas anteriores da artista, o álbum não poderia ser mais coeso e representativo do que Rihanna é: dona de si, dona daquilo que produz e representante de uma força não só como empresária, mas como mulher preta dentro do showbizz.