Crítica | Melanie Martinez, “After School”

Deixando um pouco de lado sua personagem Cry Baby, com “After School”, Melanie Martinez coloca-se como a protagonista de suas próprias emoções e nos mostra que sua genialidade pode brilhar até mesmo em músicas mais cotidianas

Melanie Martinez anunciou o combo “After School EP” + clipe de um dos singles da obra, ‘The Bakery’ para esta última sexta-feira (25). A obra é colocada como uma edição deluxe do último disco da artista, “K-12”, lançado há um pouco mais de um ano.

“After School” – Melanie Martinez (2020)

Apesar da temática infantilizada ainda presente, o nome “depois da escola” e as instrumentais que realmente parecem ter sido produzidas na mesma leva do “K-12”, Melanie aposta em músicas mais pessoais, abrindo mão de Cry Baby, sua personagem e protagonista de todos seus trabalhos. Inclusive, de acordo com a própria artista, ela trabalhou nessas músicas desde 2017, provavelmente em conjunto com as de seu disco lançado em 2020. Inclusive, em sonoridade não há nada “muito inovador”, assemelhando-se bastante e cumprindo bem o papel de uma edição com faixas-bônus.

Mesmo assim, em alguns atos, há alguns sinais de que Martinez ainda pode explorar novos modos para passar sua mensagem.

Nas 7 faixas, ouvimos uma artista um pouco mais livre e menos engessada a cumprir um único conceito proposto, como o de sua obra anterior, em que descrevia a vivência em um colégio. Em “After School” temos uma compositora que nos apresenta músicas extremamente pessoais e narrativas diferentes, em busca de entender emoções muito distintas.

‘Notebook’ é a primeira delas. Em uma letra um tanto quanto “rude”, fala sobre o rompimento de um relacionamento sem compromisso. A melodia contagiante e com sons bem característicos, soam como uma transição perfeita de “K-12”.

Escreva essa merda em seu caderno, baby
Já que você nunca escreveu cartas de amor para mim, para mim
Não se esqueça de todas as coisas que eu te ensinei
Você vai precisar disso para alguém que não sou eu, não sou eu

O começo triunfal de ‘Test Me’ soa como uma evolução do estilo da artista. A canção fala sobre “aceitar os desafios da vida como testes do universo que constroem força e sabedoria”. Com uma guitarra oferecendo uma carga emocional a mais, a música acaba se perdendo com um refrão quase imperceptível. 

Já em ‘Brain & Heart’, a vibe “infantil” retorna e faz com que a faixa possa ser considerada um verdadeiro “clássico Melanie Martinez”. Mesmo nos mostrando mais do mesmo, aqui temos uma das maiores amostras de que as composições de Melanie ficam cada vez mais trabalhadas e complexas com o passar do tempo.

Ajude-me quando eu estiver muito desapegado e frio
Dê-me a vitalidade que eu preciso para confiar mais no amor
Sangue para a água, nenhum dos dois pode nos alimentar sozinho
Fervência em minhas artérias, paixão florescendo em meus ossos

“After School” – Melanie Martinez (2020)

Os barulhos de caixa-registradora aparecem e assim inicia ‘Numbers’, com uma pegada com influências urban, e que soa tão brilhante como algo que Lily Allen faria para criticar a indústria musical. A faixa fala sobre “se sentir mal pago e sobrecarregado em um sistema que trata você como se fosse descartável”. É sem dúvidas um dos grandes destaques do EP e uma das produções mais diferentes da artista, com um refrão forte e uma grande virada ao longo da canção.

‘Glued’ em um primeiro momento parece uma “irmã mais velha” de ‘Recess’ (faixa presente no “K-12”). Com um instrumental delicado e doce, que nos lembra aquelas caixinhas de músicas, Melanie canta sobre apego e desapego. Traz um certo respiro e frescor ao todo.

E logo em seguida ‘Field Trip’, uma das faixas que também têm o “selo de qualidade Melanie Martinez”. É uma canção poderosa e que se destaca pelo seu refrão forte e crítico, mesmo com um vocal tão angelical. Aqui, a artista discute como ela é empática, além de debater o que as pessoas esperam que ela seja e o que ela realmente é.

Até então único single e que ganhou clipe no dia do lançamento, ‘The Bakery’ é, sem dúvidas, o grande destaque da obra e um dos melhores lançamentos de Martinez em toda sua carreira. Cantando sobre quando foi demitida em uma padaria na época do colégio, quando precisava trabalhar para “sustentar sua arte”, os vocais doces do começo transformam-se em um ritmo mais rápido e envolvente. Este é o caso de uma música em que até o verso é viciante, e o refrão mais ainda. Temos aqui a prova de que Martinez pode viajar em outras realidades sonoras e que seria uma ótima aposta investir nisso, inclusive.

Seria injusto dizer que é bom ver a artista saindo do roteiro de uma personagem tão bem construída quanto a Cry Baby é ao longo desses últimos 5 anos. E com certeza é incrível ver uma artista que se mantém fiel a um conceito desses.

O grande mérito de “After School” é trazer a própria Melanie Martinez como protagonista de sua própria história, sem nenhuma amarra. E principalmente, como sua genialidade pode brilhar até mesmo em músicas mais “amenas” e cotidianas.

Em sua maioria, não nos mostra algo novo, e com certeza nem pretende fazer isso. Mas também nos dá indícios de que ainda temos muito a ouvir de suas complexas composições e nos dá uma prévia de alguns rumos que pode seguir. É um trabalho inegavelmente completo, desde sua produção, até o resultado final.

Nota do autor:
70/100

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