A primeira imagem de “Babygirl” é, na verdade, um gemido. A cena em questão dispõe Romy (Nicole Kidman) por cima e seu marido, Jacob (Antonio Banderas), em baixo. Uma clara metáfora para o jogo de poderes que o longa aborda com firmeza dentro do que se pode no meio Hollywood. O filme de Halina Reijn é a uma das primeiras movimentações que o início de 2025 terá no universo cinematográfico; um thriller erótico que explora, vorazmente, fetiches, gênero, moral e, claro, sexo. Nesse mix, o resultado é um longa de quase duas horas provocante, sensual e (in)tenso.
Como uma aventura erótica cercada de sequências provocativas munidas de uma trilha sonora altamente elegante e uma Kidman sempre acompanhada dum senso de pura elegância, que a traz como CEO de uma empresa de tecnologia que dá duro para conciliar trabalho, família, vida pessoal e autocuidado.
Porém, os pratinhos começam a quebrar, um a um, quando ela cede às provocações do jovem estagiário Samuel (Harris Dickinson), o que a coloca num dilema interno quando se trata de seu relacionamento com seu marido. A partir do momento que Romy entende o quão seu sub consciente (aliado ao desejo primitivo) pode detê-la, a película levanta seus motes por encontros e jogos do casal que alavancam pura tensão. Há uma disseminação do fetiche como realidade psicológica muito audaz, sempre usando da chama para ser o combustível de progressão.
Talvez seja nesse destrinchar das “casualidades” de Romy e Samuel que a melhor coisa do filme escorre; grande maioria das trocas mais íntimas (com cada passo nunca sendo básico, ainda que “simples”) não geram desconforto, mas sim atenuam o debate principal com firmeza. Ainda que o foco esteja claramente na protagonista e em seus conflitos emocionais, o texto perante sua presença reforça o conflito central: a apreensão entre submissão e poder.
Se por um lado Romy precisa ser urgentemente verbal e responder aos comandos, o decorrer de como isso é plantado em tela é justamente o oposto. Nada necessita ser precisamente dito e reafirmado, mas o caminhar da situação é literalmente tudo que estamos vendo, sem mais nem menos.
Vencedora do prêmio de Melhor Atriz no Festival de Veneza pelo filme, Kidman realmente dá um show de atuação. Isso, no entanto, não é surpreendente quando se fala de uma atriz de tal calibre. Dickinson, por sua vez, entrega uma atuação que a complementa, representando um jovem que mistura charme, manipulação e desejo de controle. Os olhares do ator servem o suficiente. Já Banderas, conhecido por seu charme e carisma que o tornaram um sex simbol, fica ofuscado em um filme em que a sensualidade é o centro das atenções. O ator espanhol fica sob um olhar de pena vindo do espectador, uma vez que, do lado de cá da tela, sabe-se que a personagem que interpreta está sendo traída por sua esposa.
É inegável que dentro de tudo que “Babygirl” decide apostar, o sistema de raízes do longa para debater um tema tão forte como poder e o abuso dele tem força por vir via uma carga criativa responsável e sexy, sem usar disso como objetificação.