Crítica | Cidade Invisível conduz trama sobre folclore brasileiro repleta de mistérios

Nova série nacional da Netflix, Cidade Invisível usa investigação policial como fio condutor de uma trama mística sobre o folclore brasileiro.

Dirigida por Carlos Saldanha (Rio/O Touro Ferdinando) e com história desenvolvida por Carolina Munhóz e Raphael Draccon, Cidade Invisível é a nova aposta nacional da Netflix. A série acompanha a história de Eric (Marco Pigossi), um policial ambiental que perde a esposa em uma situação suspeita e se dedica a investigar a causa da morte dela. Durante uma festa junina, ocorre um incêndio suspeito na floresta e em busca da filha do casal, Luna (Manu Dieguez), Gabriela (Julia Konrad) morre aparentemente asfixiada.

No decorrer da investigação, ao se aprofundar nos mistérios que cercam o ocorrido, Eric descobre que muita coisa não é o que parece e que o Rio de Janeiro está repleto de seres místicos, que antes só pareciam ser personagens de livros escolares. Em busca de descobrir o que realmente aconteceu, o policial ainda encontra o corpo de um boto-cor-de-rosa na praia e isso o leva até Inês (Alessandra Negrini), uma dona de bar misteriosa que esconde mais do que aparenta.

Com uma atmosfera que de suspense, a série é sagaz ao construir sua narrativa de forma quase ambígua, botando em cheque os personagens de forma que leva um tempo para descobrir o real vilão ou vilã. Em 7 episódios, Cidade Invisível constrói uma trama envolvente e densa, que apresenta o folclore brasileiro de uma forma praticamente inédita.

Outro ponto extremamente forte da produção é o elenco, Marco Picossi, Alessandra Negrini, José Dumont e Fábio Lago já são nomes conhecidos da TV e entregam interpretações à altura de suas carreiras, com muito dinamismo e carisma. Contudo, os novos rostos surpreendem de igual para igual, Jessica Córes e Wesley Guimarães brilham como Camila e Isac e entregam personagens muito coerentes e cativantes.

Em Cidade Invisível ainda temos uma fotografia muito bonita, que foca em aspectos do Rio de Janeiro diferentes daqueles constantemente mostrados em novelas. Longe de Copacabana e do Leblon, a série opta por passar mais tempo em florestas, nos Arcos da Lapa e no Aterro do Flamengo.

Visual e enaltecimento do folclore brasileiro

Um ponto importante da série é a forma que ela escolhe para conduzir sua narrativa, a investigação policial é apenas um caminho, mas sua real história é a apresentação e o enaltecimento do folclore brasileiro. Em determinado ponto, cada episódio se inicia com uma pequena introdução sobre a história das lendas folclóricas, justificando como cada personagem se tornou um ser místico.

Com visual bonito e bem elaborado, um roteiro bem amarrado e personagens fortes, a série deixa de lado inspirações europeias e americanas para focar na riqueza do nosso folclore. Somos apresentados à Cuca, Iara, Curupira, o Boto-cor-de-rosa e o Saci (genialmente nominado pelo anagrama Isac) vivendo suas vidas como pessoas normais em meio a nossa sociedade. Um ponto alto desse contexto é a linda cena de Camila/Iara cantando ‘Sangue Latino’ no bar.

É extremamente bonito ver como os efeitos visuais foram desenvolvidos e contribuem para beleza e personalidade de cada um dos personagens. A Cuca, embora sombria e intimidante, ganha um aspecto mais delicado, conduzindo sua bruxaria por meio de borboletas. A calda da Iara é um deleite visual dentro e fora d’água e torna Jessica Córes ainda mais exuberante. O redemoinho do Saci parece de fato algo natural e até mesmo o Curupira, que possui os efeitos mais complexos de se montar, entrega um visual crível.

A série não se apoia em soluções simples ou já esperadas, mesmo contendo elementos na trama que podem nos conduzir a esperar isso, ela sabe bem sair dos clichês e incorporar discussões ambientais ao universo do místico. Talvez o único ponto a se questionar sobre a produção, é o fato de não existir uma explicação narrativa para que as criaturas do nosso folclore – comumente situadas na região amazônica – vivam no Rio de Janeiro.

Cidade Invisível vem para mostrar que produções brasileiras são sim dignas da nossa atenção e que nosso país consegue entregar ótimas produções, ricas em roteiro, visual e narrativa. Explorar nosso folclore de forma sombria e dramática é uma ótima maneira de elevar nossos mitos e lendas ao patamar aclamado de outras mitologias e a série com certeza acerta muito nisso. O último episódio amarra basicamente toda história, deixando apenas uma ou outra ponta solta para justificar uma continuidade. Esperamos que os viciados em séries mordam a isca e assistam essa produção para que a Netflix possa renová-la para uma nova temporada.

Assista Cidade Invisível na Netflix.

Nota do autor: 90/100

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