Crítica | 5 anos de “DAMN.” do Kendrick Lamar

O quarto registro de estúdio do rapper lançado em abril de 2017 é uma força viva espetacular em um tipo de corpo que nunca dorme

O rap em si é fervorosamente poético, e quem o recita é quem o torna ainda mais quente e poderoso. A cena nos dias de hoje ganhou um espaço estrondoso, tendo ocupado um lugar de imponência nos palcos da indústria musical. Mas para que tal acontecimento viesse a se tornar real e que esse tipo de música finalmente ganhasse respeito, a caminhada foi árdua.

Óbvio que isso são linhas gerais e extremamente superficiais sobre toda a corrida que esse movimento precisou para continuar vivo, e ao mesmo tempo ganhar vida, de uma maneira que hoje, seja vista da como merece: algo que vai além das barreiras sonoras e alcança um patamar social.

Um nome poderoso dentro do estilo é Kendrick Lamar. O rapper urge uma sinestesia insana dentro da importância do que é o rap em si. E com o “DAMN.“, lançado a 5 anos, em 2017, ele consegue intensificar esse sentimento como algo que vai além das palavras e da música. Dá para afirmar com muita da certeza que o ouvinte carrega no peito ao escutar o projeto: Lamar é uma força que não somos capazes de compreender. Temos aqui, a arte que transcende.

“Is it wickedness? / It is weakness? / You decide / Are we gonna live or die?” são os primeiros versos de “BLOOD.“, que gritam com uma melodia calma sob um coro, uma reflexão sobre toda injúria, crime e a brutalidade envolvendo pessoas negras. Surreal como com em uma peça de menos de 2 minutos somos conduzidos a visão sonora do projeto de maneira meticulosa e ímpar.

A faixa acaba e vamos rumo a um frenético som construído sobre a narrativa de que o hip-hop mata mais que o racismo, “DNA” toma para si um dos pontos mais altos do trabalho, mas é só início, porque a seguir o ouvinte é surpreendido com a cortesia “YAH.“, que trama um único caminho quanto as batidas, mas garante o cortejo suficiente para que o rapper consiga lançar todo o seu poder lírico em diferentes rotas.

Ver como esse trio da abertura se comporta e faz as engrenagens rodarem é o primeiro jeito de compreender para onde o plano estabelecido para contar a história do disco pretende ir. São subidas e descidas que entoam com ênfase os males da sociedade com uma agitação sobre dores mais pessoais.

A mixagem de conceitos opostos funciona de modo tão espetacular que a digestão do álbum corre pelos ouvidos como uma história contada com uma boa escolha de palavras e uma perfeita execução e diagramação, mas ao mesmo tempo como se estivéssemos lavando o rosto com uma água em temperatura baixíssima; tal respostas parecem hoje, após meia década, ainda mais certeiras.

Como se não bastasse usar com facilidade assustadora elementos técnicos, o trabalho vocal do artista também nos faz questionar como tudo visto aqui é possível, ele anda sob águas equanto canta, e estamos totalmente dispostos a louvá-lo. “XXX.“, com U2, serve perto do final como o exemplo cirúrgico para representar a unção de tudo que torna esse disco tão potente; as suas oscilações.

O contraponto dono dessa história contada é como encontrar algo em seu habitat natural, mas é também a solução para que essa sensação fosse provocada e distorcida. “LOVE.“, com participação de Zacari, vista antes da faixa acima, ergue a mesma linha de composição, mas usufruindo apenas de um grave mais lento. Uma obra prima.

Habitualmente, é difícil descrever quem Kendrick é, mas faltam mais termos e adjetivos para posicionar como a corrente sanguínea do “DAMN.” é pulsante ao ponto de ser atordoante de se acompanhar. No melhor sentido possível. É uma viagem mágica e brutalmente pensada para caminhar pelas veias desse projeto. Essa sensação não vai se findar, não quando estamos falando do Lamar.

Nota: 100/100

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