Crítica | Orville Peck, “Bronco”

Orville Peck capricha em um som dramático com ‘Bronco’, mas ainda não é o bastante para que sua música seja maior que sua persona.

Qualquer pessoa que olhe para uma fotografia de Orville Peck pode acabar passando mais tempo do que o necessário tentando analisar todos os detalhes do visual do cantor. Mesmo que seus looks sejam os mesmos de qualquer cowboy comum, um simples adendo já transforma o ser em uma criatura quase mítica. Em seu caso, uma máscara com franjas.

Esteticamente o artista tem uma presença tão grande, que é impossível não ter um pingo de curiosidade para ir atrás do tipo de arte que ele pratica, e a partir do momento que se ouve qualquer música sua, surge logo uma dúvida: isso é realmente quem ele é totalmente, ou a aposta nessa persona de rodeio uma extravagância necessária para se fazer tão interessante?Enquanto se passeia pela sua discografia, a resposta dessa questão vai desaparecendo aos poucos, porque logo se faz notável que isso não faz diferença alguma.

Ficar se perguntando se estamos lidando com uma caricatura é perder um tempo que poderia ser investido em realmente aproveitar um som agradável. Perceber o quanto musicalmente ele vale a pena é uma crescente que começa tímida, mas que depois já prova o quanto sua voz e qualidades realmente conseguiram algo que parecia muito difícil a princípio: superar o artista em seu modo estático.

“Bronco” é o disco onde ele deseja deixar claro que a atenção a sua música deve ser maior que a do misterioso mascarado. Colocar isso na mesa é fácil, mas para que a ação tenha efeito é necessário mostrar um trabalho valioso. E em uma longa apresentação de quinze faixas, o cantor parece estar em um touro mecânico — onde em alguns momentos domina a máquina tão bem que poderia deixar suas mãos ao alto. Enquanto em outros, a sensação é de que a qualquer momento ele pode cair de cara no chão.

O disco acerta muito no clima que ele oferece. Adaptando uma sonoridade retrô sem ser brega e colocando muita dramaticidade em algumas músicas, o que funciona muito bem com a sua voz. A maior prova disso está em “The Curse of The Blackened Eye”, onde mesmo que seja um pouco estranho tentar entender a letra e sua relação com uma maldição ou trauma de relações passadas, ainda é possível se envolver naquele tom quase fúnebre que percorre a melodia lenta. Já na faixa anterior, “Daytona Sand”, temos um tom até dançante, o que faz bonito para animar qualquer ouvinte que começar do início.

O projeto se faz longo, e em alguns momentos pode ser cansativo por causa de algumas introduções desnecessárias, como as de “Kalahari Down” e “Let Me Drown”. É fácil simpatizar com a persona e toda essa aura que ele emana, mas para quem não tem um gosto tão desenvolvido para a música country e suas raízes mais clássicas, pode ser um uma experiência um pouco turbulenta. Em vários momentos fica claro as homenagens a décadas passadas do gênero, e o resultado é decente, porém nada tão magnífico.

Orville Peck sabe muito bem ditar como ser visto artisticamente, e todo o conceito criado por ele é executado da melhor forma possível. Mas sempre fica claro que seu apelo como ser está um pouco mais acima do que seu trabalho musical. Ele é um bom cantor, ótimo performer e seu carisma (mesmo que escondido sob uma máscara) é um dos maiores e melhores convites para conhecê-lo.

Mas para conseguir tirar um bom proveito é necessário um pouco de paciência, pois para cada três boas faixas em “Bronco”, em seguida sempre surge uma que não precisava estar ali. A evolução desde a primeira aparição é notável, e como artista ele se tornou muito mais interessante do que aquele que vimos em “Pony”, mas não soa errado se perguntar se ele atingiu seu pico tão rápido, que agora está fadado à estagnação artística. Resta torcer para que esse não seja seu destino.

Nota: 76/100

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