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Crítica | Casa de Antiguidades mostra as raízes da identidade

Estrelado por um Antonio Pitanga sensacional, o filme selecionado para Cannes em 2020 debate temas como identidade e racismo

Qual criança nunca ouviu um “Boi, boi, boi, boi da cara preta, pega este menino, que tem medo de careta”? Talvez pra geração antes da de quem vos escreve, a canção nunca sequer tenha passado por seus ouvidos. A música aplacava diferente a um tempo, e hoje, vendo Casa de Antiguidades, ela se reflete em contextos envolvendo tempo e valor.

Na trama, conhecemos Cristovam (Antônio Pitanga), um senhor que trabalha numa fábrica de lacticínios austríaca localizada na região Sul do pais. Cada dia mais não se identificando com o lugar que teve que viver em busca de condições melhores, sua identidade e alma se transformam em algo duro e muito do modo que um branco enxerga um negro. A partir desse ponto, a obra decide implementar elementos oníricos, máscaras e selvageria.

São diversos discursos na língua estrangeira, que não ganham tradução ou ganham interpretação ordinária pela secretária, e um uso de metáforas que poderiam ser mirabolantes a ponto de nos tirar da cadeira. É necessário dizer que para conduzir uma trama envolvendo como o racismo apaga e segrega, seria necessário um pouco mais de sutileza (e menos exageros) para contar como muito da nossa história está sendo apagada. O longa, responsável por representar o Brasil em Cannes no ano da pandemia e que chega finalmente aos cinemas do nosso território, carece infelizmente de um ponto chave: crença em si mesmo.

O espectador vai encontrar planos longos, densos, que aproximam e ao mesmo tempo distanciam o protagonista de sua própria pele, mas que causam uma sensação estranha de negação; tal escolha acarreta na nossa própria dificuldade de aproximação por Cristovam.

Não há como negar, o fato em como o ambiente lhe molda negativamente nos atinge sim, ninguém merece tornar-se diferente por causa do próximo, a nossa essência é nossa, as nossas antiguidades são como mapas que não merecem ter seus pontos alterados. Ponto altíssimo para a obra aqui, em verbalizar essa denúncia com certa astúcia.

Por um outro lado, a narrativa insere alguns subcontextos que parecem não fazer muito sentido ou que deveriam ter o dobro da importância, mas lá no decorrer do terceiro ato muito parece ter sido em vão. Quem não deixa essa sensação de falta é Antonio Pitanga, que exerce com muita força uma performance visceral sem que haja a necessidade de apenas falar. O ator parece querer correr o tempo todo, ou talvez seja o personagem, e isso sem precisar mostrar muito.

Casa de Antiguidades, de João Paulo Miranda Maria, oferece debates certeiros, mas infelizmente (infelizmente mesmo!) falta uma contextualização melhor e uma construção de fatos que prenda atenção o suficiente para não só desgrudar os olhos da tela, mas também ao terminar de assistir, conferir todos os pontos sem nós da história e ficar completamente fisgado pelo desejo de que a humanidade fosse diferente.

Nota: 35/100

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