Crítica | Childish Gambino, “Bando Stone and the New World”

Childish Gambino, alter ego do artista Donald Glover, está de volta com um projeto audiovisual ambicioso. “Bando Stone and the New World”, lançado em 19 de julho de 2024, serve não só como um projeto sonoro inédito, como também ambientaliza o longa “Bando Stone”, criado e dirigido por Glover, ainda sem data de estreia confirmada.

O álbum, que conta com 17 faixas — algo não muito comum nas produções sonoras atuais — traz Gambino em um tom mais experimental, explorando uma mistura de gêneros musicais que vão do eletro-pop, R&B, jazz, rap e rock. A mistura, que é uma marca registrada do artista, nem sempre aqui funcionam.

Logo no início de “Bando Stone and the New World” mergulhamos em uma das melhores faixas do disco, “Lithonia”, carro-chefe do álbum e primeiro single de trabalho. A música explora temas como aceitação, solidão e amor, e é apresentada em uma melodia que ora mescla elementos do rock, ora se revela como um R&B moderno. A produção, assinada pelos renomados Max Martin, Ludwig Göransson, Michael Uzowuru e pelo próprio Donald Glover, também é um dos destaques. Na primeira parte somos introduzidos à voz do artista com produção sintética e piano, o que muda rapidamente para acordes mais densos com a presença de guitarras e bateria, trazendo um frescor para a canção.  

A melhor faixa do disco, no entanto, é apresentada mais adiante e reflete quem Childish Gambino é como artista. Em “Beach Steps”, somos imersos em uma balada R&B sensual com vocais focados em falsetes. A produção da faixa, apesar de simples e apresentar poucos elementos sonoros como violão e teclado, é, acima de tudo, elegante. A letra, sem soar clichê, nos inclui em uma história de amor: “Todo dia criamos momentos na areia e todo dia sabemos que tudo isso será lavado. Quando começamos o para sempre, se não for hoje?”

Outro destaque do disco está nas suas colaborações que aqui aparecem de forma certeira e claramente bem pensadas. Em “In the Night”, o artista se junta a Amaarae e Jorja Smith para uma faixa com uma produção sedutora que flerta com o afrobeat e apresenta um baixo ao fundo, quase imperceptível, que dá um toque especial à canção, mais uma das experiências rítmicas do disco. A letra também é cativante e nos convida a dançar — “Você está bem? Te vi com aquele cara. Eu disse de jeito nenhum, de jeito nenhum” — enquanto somos apresentados a uma relação amorosa conturbada e misteriosa.

“Bando Stone and the New World”, porém, não parece encontrar uma direção artística coesa, seja pela sonoridade ou pela ordem sequencial das músicas no álbum. Exemplo disso é a faixa “Got to Be”, uma mistura de R&B e eletrônico e com letra simplista, que nos apresenta algo semelhante aos piores momentos do Black Eyed Peas. A faixa reflete uma anarquia sonora que Childish Gambino tenta comandar, mas sem muito sucesso. Em “No Excuses”, faixa creditada como colaboração de Ludwig Göransson e Kamasi Washington, somos introduzidos a mais uma melodia afrobeat com sons sintéticos e um solo de saxofone hipnotizante. A música, apesar de ser, melodicamente, a mais interessantes do disco, peca por sua sua extensão — que conta com 7 minutos — tornando-a um efeito rebote do que deveria ser, cansativa e repetitiva da metade para frente. 

Começando bem e animado, “Bando Stone and the New World” se torna cansativo em sua segunda parte, reflexo das 17 faixas propostas pelo cantor. Apesar de melodicamente cativantes, algumas músicas do disco, como “Real Love” e “Running Around”, são liricamente simplórias, datadas e soam como sucessos do início dos anos 2000 — não de um jeito positivo.

“A place where loves goes”, última música do álbum, é perfeita para as pistas de dança, mas não soa como a melhor escolha de finalizar o disco. A produção da faixa, que mistura eletrônico e pop com back vocals bem marcados e em destaque, não reflete a experiência sonora distópica da grande parte do trabalho. 

Algo no trabalho de Childish Gambino, no entanto, permanece constante: sua necessidade de renovar sua imagem e sonoridade como artista, arriscando em áreas que fogem de sua zona de conforto. Com altos e baixos na mesma medida, “Bando Stone and the New World” talvez funcionasse melhor se tivesse sido lançado junto com o longa-metragem prometido por Glover — onde sua principal e mais ambiciosa característica causaria menos estranheza e desconexão. Dessa forma, poderia apresentar a unidade idealista que o artista originalmente propôs em estúdio.

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