Crítica | Doechii, “Alligator Bites Never Heal”

A rapper recebeu três indicações para a 67ª edição do Grammy: uma delas por “Alligator Bites Never Heal”, seu disco de estreia

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– Como vai, Doechii?
– Ei, meu bem.
– Sabe, faz um tempinho desde que a gente conversou pela última vez.
– Verdade?
– Provavelmente desde o seu último EP, “Oh The Places You’ll Go”.
– Uau, realmente faz tempo.
– Eu tenho recebido algumas ligações.
– É mesmo?
– As pessoas estão um pouco preocupadas contigo.
– Não estão, não.
– E eu sei que eu meio que era aquela pessoa com quem você desabafava, então…
– Você era.
– Por que você não me conta o que tem acontecido?

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É assim que Denial is a River, quarta faixa do disco Alligator Bites Never Heal, da rapper Doechii, começa. Após esse diálogo do que parece ser da cantora consigo mesma, a letra da composição conta a trajetória da artista desde que passou a investir em sua carreira musical. Relembrando o caminho percorrido desde 2019, Doechii fala sobre sua vida nos campos profissional, amoroso e pessoal.

Seu investimento em sua carreira garantiu três indicações ao Grammy: Artista revelação, melhor performance de rap por Nissan Altima e melhor disco de rap com o álbum aqui apresentado, Alligator Bites Never Heal. Considerando seu tempo em atividade e que seu lançamento mais recente é o primeiro álbum de sua discografia, percebe-se que Doechii não veio para brincar. Foi só uma questão de tempo até que a rapper se tornasse queridinha de outros rappers, fizesse uma performance no programete NPR Tiny Desk, passasse a bombar no Twitter (X) com elogios a sua lírica impecável e, sobretudo, à sua curadoria artística. A rapper se apresentou no programa televisivo estadunidense “Late Show” no início de dezembro de 2024. Na ocasião, performou as faixas Denial is a River e Boiled Peanuts.

Quando Doechii sobe ao palco, seja pequeno ou grandioso, a artista encorpora este termo, provando que leva seu trabalho a sério. Por causa disso, Alligator Bites Never Heal ganhou um espaço especial no play de muitos ouvintes de rap, R&B e de quem mais aprecia sons irreverentes e inovadores. A mixtape, composta por 19 faixas, reflete as pressões e os desafios de uma carreira em ascensão meteórica. Desde o início de sua trajetória, Doechii deixou claro seu compromisso em desafiar limites artísticos. Em seu primeiro disco, essa intenção é levada a um novo patamar. 

Mostrar seus lados pantanosos (referenciando o título do álbum, que em português pode ser traduzido para “mordidas de jacaré nunca saram”), seus pensamentos intrusivos e suas voltas por cima não são problemas para a rapper, que aborda até mesmo seus momentos de glória com humor ácido. A produção é tão distinta quanto a própria Doechii e brinca com diferentes gêneros e timbres. No entanto, a tentativa de abranger múltiplos estilos faz com que a artista peque, embora execute todos com maestria, e resulte em um álbum inconstante.

Doechii não precisava lançar um disco para provar ser uma força única no hip-hop contemporâneo, mas foi por causa de Alligator Bites Never Heal que a artista passou a ocupar mais espaços – dentro e fora do ambiente cibernético. Bem como seu impacto sonoro, o contexto de seu álbum de “estreia” solidifica a posição de Doechii como uma artista disruptiva na indústria. 

72/100

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