Crítica | Duda Beat, “Tara e Tal”

“Tara e Tal” marca um momento de profunda evolução na carreira musical de Duda Beat, que aqui mergulha em um oceano de sentimentos e experiências

“Tara e Tal” marca um momento de profunda evolução na carreira musical de Duda Beat. Neste álbum, a artista pernambucana mergulha em um oceano de sentimentos e experiências, distanciando-se, ao menos um pouco, dos álbuns antecessores. De fato, o novo registro pode ser considerado primo (mas não filho) de Sinto Muito (2018) e Te Amo Lá Fora (2021), com sua sonoridade mais ousada, mas abordando nas letras, entretanto, o mesmo universo já conhecido pelos fãs.

A previsibilidade já faz parte da marca da artista. Começa pela capa — uma bela imagem que remete ao surrealismo — e permanece nas letras de mal querer, como em “Na Tua Cabeça”, faixa que fecha o álbum. O ouro do registro reside na pesquisa sonora da artista, que passa do pop ao manguebeat, do reggaeton ao drum’n’bass, novidade que mandava um aceno em seu pop eletrônico do álbum anterior.

As guitarras, já bem utilizadas nos registros anteriores, retornam com mais agressividade em NIGHT MARé. Em momentos de maior interesse, as melodias do registro alternam entre o descarrego de energia e suavidade, conferindo um dinamismo dignos das pistas de dança e festas techno — aparentemente o público alçado por Duda. Mas no meio dos enérgicos sintetizadores, há espaço para faixas mais calmas como Por Aí Mozão, no segundo bloco do álbum.

Talvez para manter a base cativa interessada, a faixa Saudade de Você foi lançada como single, e serviria exatamente como uma faixa à parte: ainda que converse com a estética de Tara e Tal, a faixa parece solta — ou talvez em um destaque que merecesse mais desdobramentos — entre as 12 que compõem o álbum. Embora a artista percorra diversos gêneros musicais ao longo de 37 minutos, como no caso do reggaeton protocolar em Baby, a faixa parece estar ali apenas para entregar algo para uma ala de ouvintes um pouco mais conservadores.

Ainda há espaço para falar da produção de Tomás Tróia e Lux, que entregam arranjos complexos e cheios de camadas. A experiência auditiva de fato remete aos ambientes escuros, iluminados pelas luzes quentes de baladas, em outros momentos puxando o ouvinte para o pré-rolê que se estenderá noite adentro. Mais impressionante que as melodias cuidadosamente escolhidas para complementar a potente voz de Duda são as participações especiais: a doçura de Liniker em Quem Me Dera e a lendária guitarra de Lúcio Maia replicando Côco Dub, do álbum de estreia de Chico Science e Nação Zumbi. 

Gabriela Schmidt / Direção criativa Marcelo Jarosz

Em termos temáticos, Tara e Tal descreve, em 12 faixas, as vivências e reflexões de uma mulher que acorda cheia de questões mal resolvidas e, ao longo de um período, resolve digerir suas mais recentes experiências afetivas, agora buscando um equilíbrio entre a tara – o sentimento que nos leva para a frente, mesmo que desajeitadamente – e o tal– a necessidade de não deixar que os amores líquidos atropelem o crescimento. Não é à toa que o álbum encerra com “Na tua cabeça”, a canção que constata que, mesmo ainda se sentindo rejeitada e abandonada, a protagonista tem certeza de que veio para ficar, veio para marcar a vida do outro.

O projeto traz todos os elementos que alimentam a intensa comunicação que Duda Beat tem com seu público – mas vai além. Traz elementos de underground muito fortes, só sugeridos nos trabalhos anteriores. Escancara a vulnerabilidade emocional – e a transforma em motor de crescimento. Não tem medo de ser ambíguo, complexo e intrigante. Se joga inteiro na pista como uma pessoa de carne e osso o faria: com expectativas, angústia, ansiedade, sonhos, e um caminho bem delineado de superação.

No entanto, Tara e Tal tem momentos fracos e apagados, forçando Duda a recuperar a atenção do ouvinte na faixa seguinte. Ainda assim, mesmo nas músicas menos inspiradas, há um clamor próprio de Duda Beat que permite que a faixa se destaque. No geral, o novo registro pode não ser o favorito de muitos, mas é uma conquista notável para a artista e uma boa adição ao pop brasileiro recente.

Tara e Tal é um álbum que celebra a diversidade de gêneros musicais e que comprova a intenção da musicista de expandir seu leque para além do confortável, o conhecido pelo público cativo, aproveitando ainda para elevar a régua de suas apresentações ao vivo e seus projetos futuros.

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