“Por Vida” é fundamental para entender Kali Uchis

A celebração da primeira década do trabalho de estreia da colombiana é, inevitavelmente, a legitimação da carreira de Kali Uchis como um todo

Lançado em 4 de fevereiro de 2015, Por Vida marca a estreia definitiva de Kali Uchis no cenário musical. Ainda uma artista em ascensão na época, com apenas 19 anos e os cabelos descoloridos, a cantora colombiana trazia um trabalho repleto de personalidade, misturando gêneros como soul, R&B, pop alternativo e, é claro, influências latinas. O EP (que tinha outra capa à época) foi disponibilizado gratuitamente na internet. Por ser uma artista independente na era do streaming, essa foi a estratégia de Kali para divulgar seu som por aí. Spoiler: deu certo.

O lançamento de Por Vida aconteceu no mesmo momento em que o R&B alternativo dava seus pulos para ter seu devido destaque, aproveitando a mobilização que artistas como Frank Ocean, FKA Twigs e The Internet vinham fazendo desde o início da década de 2010. Esse alvoroço questionou padrões comerciais do gênero e abriu espaço para criações mais experimentais e sensíveis. Nesse cenário estava Kali Uchis, que, na crista da onda, aproveitou para se jogar no mundo ao flertar com o vintage, mas sem que seu som deixasse de soar contemporâneo. Não demorou muito para que essa fusão sedutora chamada Por Vida chamasse a atenção de críticos e outros músicos influentes.

Dez anos depois, Uchis coleciona parcerias com alguns desses profissionais, a citar Tyler, the Creator, Steve Lacy, Jorja Smith, Bootsy Collins, PARTYNEXTDOOR, Omar Apollo, Summer Walker, além de KAYTRANADA e Matthew Tavares, produtores da faixa “Rush” e companheiros de Kali na conquista do primeiro Grammy da colombiana, conquistado pela composição “10%”.

Por Vida lançou Kali Uchis na indústria como uma artista completa: cantora, compositora e diretora criativa — o projeto, inclusive, antecipou a estética visual e sonora que seria explorada em seus discos seguintes. Ou seja: logo de cara, em seu trabalho primogênito, a colombiana apostou todas as suas fichas. Após vencer na loteria, como uma referência à quarta faixa de Por Vida, cada disco foi como uma escada para Uchis ascender ao reconhecimento e à admiração de quem é fã, bem como de quem também não é.

A sonoridade de Por Vida

Falando sobre a sonoridade do álbum, imagine que você está em um sonho agradável. A temperatura é amena, o sol suave e um vento delicado corre lentamente pelo ar. Você se deita em uma cama de algodão doce rosa. Não há ninguém por perto, porém você não sente solidão. Tudo está em seu devido lugar, não há preocupações ou tempo. Há uma suspensão do mundo, como se tudo flutuasse. Assim é Por Vida: onírico, encantador, espirituoso. As melodias são cativantes e as letras, ora em inglês, ora em espanhol, são introspectivas. Solidão, autoconfiança e busca por liberdade emocional são os temas concêntricos das faixas, e são equilibrados com batidas modernas (algumas que, dez anos depois, viraram démodé) e elementos retrô.

Uma das características mais marcantes do disco é sua capacidade de transitar por diversos gêneros sem perder a coesão. “Rush”, com sua pegada psicodélica, contrasta com o groove suave de “Melting”. A composição que abre Por Vida, “Sycamore Tree”, lança mão do experimentalismo. “Know What I Want” expõe várias camadas de multiculturalismo. 

A primeira década de Por Vida mostra que o disco permanece uma obra fundamental para entender a trajetória de Kali Uchis em sua carreira musical. Não apenas por ser seu trabalho de estreia e, indo além, condensa a generalidade de seu estilo. Se o disco fosse uma fábula, a moral da história seria: siga sua liberdade criativa, sua autenticidade e seus sentimentos. Você colherá muitos frutos antes de chegar ao fim da década. 

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