Crítica | “Nimona” irradia sinceridade e carisma

Projeto engavetado pela Disney, Nimona estreia na Netflix e conquista o selo ‘Fresh’ do Rotten Tomatoes com 93% de avaliações positivas.
Crédito: Netflix (2023)

Adaptação da história em quadrinhos homônima de Nate Stevenson, Nimona chegou a Netflix e fecha de vez o ciclo de obras da Blue Sky. Produtora que ficou famosa por títulos como ‘Rio’ e ‘O Touro Ferdinando’, encerrou suas atividades em 2021 com a compra da Fox pela Disney.

Na animação, acompanhamos Ballister Coração Bravo (Riz Ahmed), um aspirante a protetor do reino, que escolhido pela rainha, é o primeiro da história que não descende da heroína Gloreth a receber o direito de se tornar um cavaleiro.

Na cerimônia de oficialização como cavaleiro, Ballister é vítima de uma armação e acusado injustamente de um crime grave. Fugitivo e em busca de provar sua inocência, ele conhece Nimona (Chloë Grace Moretz), jovem que tem o poder de se transformar em quem quiser – animais ou pessoas.  

Crédito: Netflix (2023)

Nimona é cativante, tem uma língua afiada e não possui nenhum tipo de filtro para expressar suas vontades e pensamentos. Já Ballister Coração Bravo é mais sisudo, protetor e traz um ar de “pai e filha” para a relação dos dois.

A animação tem como cenário um mundo medieval-futurista e isso a torna ainda mais paradoxal e interessante. A trilha sonora do filme também é excelente e traz uma vibe punk rock que casa perfeitamente com seu ritmo. 

O filme é extremamente carismático, sincero e direto em tudo que precisa expor, mas constrói tudo de forma respeitosa e com um nível de profundidade bem assertivo. Como toda adaptação, ele apresenta mudanças, que no geral, agregam valor à narrativa e a tornam ainda mais divertida. 

Crédito: Netflix (2023)

Principais diferenças de Nimona na animação e na HQ

É normal que toda adaptação – de games, livros, HQs ou graphic novels – passe por mudanças em seu roteiro para se tornar um filme. Em Nimona não é diferente, mas ao aqui, cada alteração ajudou a enriquecer ainda mais a narrativa.

Em recente entrevista, o criador da obra ND Stevenson (que também é responsável pelo graphic novel que deu origem a nova versão de She-Ra na Netflix), apontou que “é preciso fazer o que é melhor para a trama, mesmo que isso signifique sacrificar elementos pessoais.”

Listamos algumas diferenças entre o material original e o filme da Netflix, que serviram como uma luva para tornar o longa ainda mais satisfatório:

Ballister Coração Bravo

A primeira mudança no personagem é seu sobrenome, que na obra original é ‘Coração Negro’. Além disso, nos quadrinhos, ele tem uma transição mais longa para alcançar o perfil de anti-herói. 

Ballister chega a ser de fato vilanesco, mas apresenta caráter e valores em suas atitudes. No longa isso não ocorre e a postura de anti-herói é apresentada já nos minutos iniciais, não havendo um momentos de vilania de fato.

Crédito: Netflix (2023)
Ambrosius Ouropelvis

Ambrosius (Eugene Lee Yang) é outro personagem muito significativo na trama e sua versão nas telas é muito mais “honrada” do que nos HQs. O companheiro de Coração Bravo é praticamente um arqui-inimigo da dupla principal, é mais ambicioso e até malicioso para atingir determinados objetivos.

O visual do personagem também sofre alterações, na animação ele tem traços orientais e um cabelo curto. Já na história em quadrinhos, o ex-amigo de Ballister tem longas madeixas louras.

Nimona

A anti-heroína e agente do caos tem mais ideais amargos na sua versão dos quadrinhos, enquanto na animação, ela ganha maiores camadas de sensibilidade e fragilidade. Esse fator torna seu desenvolvimento mais profundo e abrangente.

Graças as suas características é possível se relacionar tão profundamente com a personagem, que de modo amplo, se conecta com todo tipo de espectador, sendo a personificação de emoções de uma forma quase física.

Crédito: Netflix (2023)
Relações e novos personagens

Um fator muito interessante na adaptação é a forma com que suas subtramas são desenvolvidas. Na versão das telas, a relação entre Ballister e Ambrosius ganha camadas mais profundas e expositivas se comparada aos quadrinhos. 

Outro ponto positivo é a criação de novos personagens para agregar novas camadas à trama, como mais alívios cômicos e desenvolvimento para história. Um exemplo disso são o superconfiante Sir Thoddeus Sureblade (Beck Bennet) e o escudeiro Diego (Julio Torres).

Crédito: Netflix (2023)

Nimona apresenta valores importantes de forma natural e assertiva

Um dos maiores trunfos desta adaptação é como ela entrega seus ideais de forma natural e muito certeira. Temas importantes são explorados no decorrer do longa de forma sensível, clara e muito bem estruturada. 

É extremamente claro do começo ao fim que o filme tem um caráter queer. Nimona é sem sombra de dúvidas uma obra que explora gênero e sexualidade com muita delicadeza e traz o tema sem utilizar a bandeira LGBTQIAP+ de forma forçada.

A interracialidade é outro dos temas expostos no filme de forma muito respeitosa, mas notável, tendo Ballister, Ambrosius e também a rainha Valerin (Lorraine Toussaint) como personagens não brancos.

Crédito: Netflix (2023)

A vilania é o guarda-chuva principal do filme, “o que é ser um vilão?” ou “ser um vilão é apenas ir contra as regras?” e traz sob sua estrutura recursos que abraçam de forma única demais valores. 

Nimona é uma animação contestadora, subversiva e irreverente. Sua narrativa é forte, mas delicada e sensível. Seus visuais, que transitam entre 2D e 3D, agradam muito e criam uma atmosfera moderna, encantadora e ainda sim nostálgica.

É fato que por ser conservadora ou optar por ser o mais subjetiva possível, a Disney perdeu uma ótima oportunidade engavetando uma obra muito interessante, potente e que tem um potencial gigante por conta do carisma de sua personagem principal.

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