Entre 2015 e 2019 uma história em quadrinhos chamada Paper Girls publicada pelo selo da Image Comics viveu anos de aclamação. Do começo ao fim, durante suas trinta edições, a HQ se tornava cada vez mais presença garantida na lista de leitura de muita gente, e durante esse tempo, era muito difícil não se deparar com um comentário reiterando o quanto o conteúdo da HQ era ‘adaptável’.
Tais preces foram atendidas, pois logo em seu último ano de existência, os estúdios da Amazon anunciavam que iriam transformar a serie em produção audiovisual. Já não é novidade para ninguém que comparar adaptações de quadrinhos para TV é algo recorrente para as pessoas.
Essas mídias tão únicas e distintas não costumam mais andar tão lado a lado assim no que diz respeito a fidelidade na história (dois ótimos exemplos de caminhos um pouco divergentes são The Walking Dead, da NBC, e Watchmen, da HBO). Então, é sempre bom se preparar para assistir algo diferente do que foi lido em páginas e páginas.
A produção não tem problemas no quesito fidelidade, e o carisma do seu elenco é o suficiente para fazer com que uma jornada condensada em oito episódios seja interessante o bastante para ser acompanhada, mesmo que alguns tropeços em ritmo sejam um pouco recorrentes.
O ano é 1988 e após a noite de Halloween quatro garotas acordam na madrugada para entregar os jornais locais. Seria um dia de trabalho normal para Mac Coyle (Sofia Rosinsky), Tiffany Quillkin (Camryn Jones), K.J. Brandman (Fina Strazza) e a novata Erin Tieng (Riley Lai Nelet), caso as garotas não tivessem se envolvido em uma guerra temporal que as faz viajar entre passado e futuro enquanto trombam com outras versões de si mesmas. Durante toda a temporada as pré-adolescentes tentam não apenas voltar para a casa, mas voltar exatamente para o ano de que saíram.
Apresentar um mistério com crianças nos anos 80 não é novidade há muito tempo, então não há tanta originalidade nessa história. Mas o fator criativo não é o maior convite daqui. O desenvolvimento das quatro protagonistas é a maior força que essa produção tem. E para que isso seja referência é preciso que as personagens estejam em uma sintonia envolvente o bastante para que o público comece a torcer para todas, não apenas sozinhas, e além de tudo, como um grupo.
O entrosamento entre as entregadoras de jornal acontece de forma gradativa. Acompanhar o começo de uma amizade entre as quatro é o que faz torcer para cada uma delas. Em contrapartida, o roteiro tem um ritmo um pouco estranho. Em uma situação que demanda ações e pensamentos rápidos não é a todo momento que temos um senso de urgência que sirva para dar peso a narrativa. Os momentos de calmaria são até desnecessários, mesmo que esses momentos sirvam principalmente para enriquecer a personagem de Tiffany.
A série também passa um pouco de tempo demais lembrando o telespectador que estamos lidando com meninas de doze anos de idade. Não que isso seja um problema, mas diante de uma situação colossal de perigo é difícil imaginar que elas sequer lembrariam de ter algumas conversas. No quesito desenvolvimento, K.J. é a mais interessante (e aqui vale um ponto para a produção, que fez a atriz Fina Strazza parecer uma impressão perfeita da personagem dos quadrinhos).
Paper Girls não se faz difícil de acompanhar ou entender em qualquer momento, e essa facilidade para apresentar uma trama um pouco complexo é um ponto positivo. As cores no seriado (uma das maiores qualidades nos quadrinhos) são por vezes escuras e monótonas, fazendo com que algumas cenas resultem em algo apático visualmente. Mesmo os super presentes tons de roxo, que são essenciais para descrever os momentos de viagem no tempo, parecem carecer de um melhor acabamento.
Os coadjuvantes fazem um trabalho sólido, em especial Ali Wong e Adina Porter, que pegam muito bem a vibe das personagens que interpretam. Em suma: a série não faz feio, mas também não chega a encantar tanto o quanto poderia (e que gostaríamos)… Mas ainda assim é fácil torcer para que em uma possível segunda temporada ela seja mais animadora nesses quesitos.