Se “O Lagosta” (2015) e “A Favorita” (2018) apresentam lados distintos de um mesmo diretor não convencional, “Pobres Criaturas” chega agora para consagrar não apenas a arte de Yorgos em fazer filmes que fogem do padrão e desafiam as regras, mas para reafirmar a importância do diretor em entregar trabalhos indiscutivelmente irresistíveis.
Com romance, fantasia, ficção e dramédia, “Pobres Criaturas” chega hoje aos cinemas trazendo um dos filmes mais diversos e incríveis da temporada — sendo um candidato quente com 11 indicações aos Oscars. Com tantas categorias e indicações, parece pleonasmo rasgar elogios à trama, mas não nos resta outra escolha. Contando a história de Bella Baxter e ambientado na Era Vitoriana, o filme é inspirado no homônimo escrito por Alasdair Grey e tem referência claras ao famoso Frankenstein.
Partindo de um experimento científico realizado por Godwin Baxter (Williem Dafoe): que utiliza o cérebro do filho que era gestado antes de sua mãe cometer suicídio e o implementado no corpo da própria mãe, o doutor dá vida a Bella (Emma Stone), que parece um ser disfuncional. Com movimentos, fala e comportamentos de um bebê no corpo de um adulto, a criatura é estranha e, curiosa e cativante. Mais surpreendente ainda é ver o “avanço” de Bella, à medida que seu cérebro parece se adaptar e se desenvolver com melhoria nos sentidos, expressões e percepções humanas.
É esse avanço que fará com que Bella tenha o desejo de conhecer e vivenciar o mundo — coisa que a era negada pelo cientista, mas que acaba cedendo e proporcionando as aventuras presentes na tela, que se desenrolam ao lado de Duncan Wedderburn (Mark Ruffalo), um advogado de moral duvidosa e carisma inegável que se apaixona pela criatura.
Trazendo para a tela um surrealismo fantástico e um universo alternativo mesmo com elementos reais, o longa propõe debates atuais sobre temas inerentes à espécie humana e a vivência feminina. Sexo, liberdade, filosofia, desigualdade social e machismo são apenas alguns tópicos desafiados por Bella, em sua vivência irreverente e deliciosa.
Com excelente execução técnica (direção de arte e produção, fotografia, direção e trilha sonora) e desempenho do elenco, “Pobres Criaturas” é um filme cativante, magnético e irresistível, que desafia o pensamento crítico e as convenções sociais. A soma de todos os elementos fazem do longa um dos melhores filmes apresentados em anos, com um material robusto e que tende a agradar a maioria dos aficionados por cinema, entregando algo raro, ousado, perturbador e brilhante.