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Crítica | Tyler The Creator, “CHROMAKOPIA”

Um caleidoscópio da agressividade do começo de carreira e da peculiaridade intencional do artista, o álbum não se amarra em gêneros para entreter o ouvinte

Enquanto o personagem da vez de Tyler, The Creator parece ser o que estampa a capa do lançamento “CHROMAKOPIA” — um eu mascarado, monocromático e apelidado de ‘Saint Chroma’ —, o oitavo álbum de estúdio do artista revela que, desta vez, a narrativa não é cantada apenas pelo seu alter ego. Com conselhos de sua mãe, Bonita Smith, misturados ao instrumental, o projeto mostra como Tyler mantém a sua luz acesa diante de uma era mais madura e de vulnerabilidades. 

“Você é a luz. Ela não está em você, ela vem de dentro”: é justamente essa fala de Smith que dá o pontapé do disco, em “St. Chroma”. Dando o gostinho da turbulência que será entregue na progressão do álbum, a faixa traz logo de cara que o estilo emblemático do musicista está mais bem experimental e sofisticado desde seu último lançamento,Call Me If You Get Lost” (2021).  

Com ritmos e elementos sonoros peculiares e uma agressividade no rap que remete aos primórdios controversos de sua carreira — vistos na mixtape “Bastard”, de 2009 —, o artista revisita seu talento de acompanhar uma produção caótica com o seu vocal. Quase metade do álbum segue esse lado mais selvagem, com as poderosas “Noid”, “Rah Tah Tah” e “Thought I Was Dead”. 

Meio um entoar militar, meio ego trip rap, fica claro que Saint Chroma traz um elemento paranóico e sombrio por baixo de sua máscara. Aos fãs antigos, é um momento de nostalgia e de se deliciar. 

O ponto alto do segmento é “Sticky”, com aparições de GloRilla, Lil Wayne e Sexyy Red. Embora o próprio Tyler se apague na soma, o protagonismo dos convidados traz um hype a mais para o álbum, especialmente com a combinação de Lil Wayne e os instrumentais excêntricos e animados. Childish Gambino também faz sua aparição em “I Killed You”, sendo uma combinação tão fora do comum como a música. 

Mas, de longe, o foco do álbum é outro: o artista se encontra em “CHROMAKOPIA” nos seus momentos mais suaves, que exploram o R&B, acústico, jazz e soul. De escutar, o ouvinte é teletransportado para a era “Flower Boy” e “Call Me When You Get Lost”, que foram divisores de água na discografia de Tyler. 

O lado vulnerável do personagem, acompanhado pelas falas de sua mãe, visita inseguranças como o envelhecer, o medo de não ser bom o suficiente e sobre estar se perdendo diante da fama e dos desafios da fase adulta. Em “Like Him”, por exemplo, o alter ego prepotente dá espaço para um diálogo honesto com a Bonita Smith sobre o abandono de seu pai. Enquanto “Answer”, de WOLF, aborda o mesmo tema, dessa vez ele é revisitado de uma forma madura e sofisticada, acompanhado de violão, vocais harmonizados e uma mudança repentina no meio da música. 

E os temas mais densos não tornam o álbum pesado. A ternura inesperada na letra cantada e a produção dinâmica e versátil tornam as faixas leves e quase fantasiosas, como se seus versos fossem tirados de uma história em quadrinhos. Isso já é sinônimo de Tyler a este ponto, já que ele desempenha com maestria a ambientação de universos em seus álbuns.

“Take Your Mask Off” e “I Hope You Find Your Way Home”, que amarram o álbum, fortalecem ainda mais a ideia de que Tyler está a caminho de um campo mais experimental, alinhado à transição entre gêneros e produção pelo próprio artista. “Você nunca cansa de me impressionar; continue brilhando”, incentiva a mãe, no fim do disco. 

E de fato, “CHROMAKOPIA” é sobre isso. Talvez não seja um disco que surpreenda tanto os fãs do trabalho de Tyler — até porque a criatividade e versatilidade são esperados quando se fala dele. Muitas das coisas que ouvimos no lançamento já eram parte do repertório do músico, tanto que lembram trabalhos antigos do mesmo. Tampouco é um álbum introdutório para a discografia dele, já que “Flower Boy” ocupa o posto desde o seu lançamento e segue sem ser superado. 

Mas desde o play até os últimos momentos do álbum, é inaugurado mais um capítulo no livro de narrativas do artista, que vale a pena ser escutado. Mais do que nunca, ele tira a própria máscara e se permite ser maduro diante da audiência que o acompanha desde os experimentos da adolescência. A diversão — e a luz — desta vez vem disso. 

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