Finalzinho de 2020, um ano imenso, interminável, e completamente improvável e improdutivo pra grande parte das pessoas. Se a gente perguntar nas ruas como foi essa pandemia, a maioria possivelmente dirá que foi um ano perdido e que trouxe muita falta de criatividade, indisposição e até transtornos psicológicos. A minoria irá dizer que aprendeu novas coisas, estudou e conseguiu ter lapsos criativos, abrindo até negócios. Entretanto, pra ninguém esse ano conseguiu ser melhor na carreira que para a Taylor Swift.
Em meio a um isolamento social, a loirinha se viu interrompida de ter sua turnê mundial com o Lover Fest, divulgando até então o seu último álbum de estúdio. Para outras pessoas, isso seria frustrante a tal ponto de ser um impeditivo, entretanto, durante seus anos de carreira, o que entendemos é que Swift não faz muita coisa do que se espera dela.
Talvez o que menos se esperasse dela seria o volume de álbuns em tão pouco tempo. Em pouco mais de um ano, Taylor Swift tem três álbuns de estúdio em sua conta. Ok, Lover pode não ter sido lá a obra do ano, mas folklore e evermore, até então, são seus álbuns mais elogiados pela crítica – e mais diversos de acordo com sua discografia.
Entre mudanças de gênero musical – tivemos country, pop, eletrônico -, Swift fez do evermore seu segundo álbum de gênero alternativo, contudo essa é a provavelmente sua maior expressão do gênero. Enquanto o folklore se mantém, como o nome diz, em folk e em um lado mais calmo do alternativo, focado nas letras, é em evermore que Taylor tem espaço pra brincar com as melodias.
‘Willow’, faixa título, é um grande exemplo disso. Swift, ao anunciar o evermore, deixou claro que esse seria o álbum irmão de folklore, e é no seu lead que observamos isso claramente. Mesmo que ignorássemos o clipe – um dos mais bonitos visualmente da Taylor que é claramente uma continuação de ‘cardigan’ -, ‘Willow’ parece, sonoramente, ser irmã da primeira.
Entretanto, é aqui que observamos as diferenças temáticas principais das duas: enquanto ‘cardigan’, apesar de ser uma história de amor, é melancólica e traz ideias de dor e mágoa, ‘Willow’ é calma, reconfortante e soa como um alento ao nosso coração, nos dá esperança. Além da mudança óbvia de tema em questão de lirismo, a melodia também nos apresenta algo novo. ‘Willow’, mais uma das parcerias entre Taylor e Aaron Dessner, parece ter saído de um dos discos do Faun – com um pouco menos de harpas.
Com uma ambientação de músicas medievais, Swift nos transporta para um mundo antigo, no meio de uma floresta, e é exatamente esse o mundo visual que a Taylor enxerga enquanto parte do folklore para evermore.
Em evermore temos também um dos featurings mais esperados pelos fãs da Taylor Swift: HAIM. As três irmãs, amigas da Taylor há alguns anos, e que estão indicadas junto com ela ao Álbum do Ano nos Grammys, trouxeram uma música um tanto quanto inusitada na carreira da loira. ‘no body, no crime’ é mais um dos trabalhos de contadora de histórias da Taylor – aqui em parceria com as três -, e conta a história de Este, uma mulher que foi assassinada pelo parceiro. A eu-lírico, amiga da protagonista, revoltada com a morte da sua amiga, acaba assassinando o viúvo. Tema nunca antes usado por Swift, é assumidamente uma influência dos podcasts que ela vem escutando na pandemia, e resultou em uma obra liricamente interessante e um country bem old Taylor.
Ao ouvir o álbum é perceptível a mudança melódica que a Taylor quis trazer no evermore, e isso fica bem claro quando observamos três músicas: ‘gold rush, long story short‘, mas principalmente ‘closure‘. As três contam com produções mais animadas, entretanto ‘closure’ passa por vários estágios dentro de si mesma. A canção conta com produção de BJ Burton (que trabalha com Charli XCX, Eminem e Bon Iver) e James McAlister (trabalhou com Sufjan Stevens e The National), e resultou em uma mistura tanto quanto interessante, soando tão diversa quanto parece, com elementos muito peculiares dos trabalhos dos dois produtores.
Engana-se quem acredita que a loirinha não trouxe toda sua melancolia para o ‘evermore’. Isso fica escrachado quando observamos outras três faixas: ’tis the damn season‘, ‘tolerate it‘ (nossa faixa 5) e ‘happiness‘. As melodias das três são bem parecidas com o que escutaríamos no ‘folklore’, influências fortes do piano e violão e um foco maior na voz. ‘happiness’ inclusive está, assim como ‘All Too Well‘, no hall das músicas tristes da Taylor que passam de cinco minutos.
Fechando o álbum, tivemos mais uma colaboração com Bon Iver que nos entregou a obra-prima ‘exile’ no folklore. Entretanto, ‘evermore’, faixa de mesmo nome do disco, não se mantém no mesmo nível que a primeira. Enquanto ‘exile’ traz uma dor e sofrimento palpáveis, ‘evermore’ é mais contida e demora a se desenvolver, e quando se desenvolve é completamente inesperado. A descontinuação da música e a quebra de expectativas quando Justin Vernon finalmente entra na canção é algo que pode ser visto tanto como seu ponto forte, como sua fraqueza.
Apesar de ser um álbum extremamente bem construído liricamente assim como o folklore e ter essa vantagem de trazer uma coisa mais fresca e invernal às melodias, evermore me parece não ter uma simbologia e músicas fortes tanto quanto seu antecessor. Ainda que aqui eu não veja nenhuma canção filler, o álbum anterior tem músicas muito atraentes para quem está de fora, tais como ‘exile’, ‘the 1‘ e ‘betty‘, parte da tríade betty/james/augustine, um dos grandes atrativos do disco.
Em evermore, Taylor se permitiu falar mais das suas próprias experiências, mas também contar histórias alheias, o que para mim, soa muito mais pessoal e mais relacionável que o folklore, além de tão criativo quanto. São dois álbuns irmãos, como a própria Taylor disse, que se complementam e se casam perfeitamente, exaltando o trabalho – já muito reconhecido – de Taylor Swift enquanto compositora e musicista.