Flavia K está chegando agora com o primeiro álbum de estúdio, “Janelas Imprevisíveis”, mas seu prodígio não é de hoje
Aos 22 anos, a jovem já ostenta uma carreira de dez e currículo de gente grande, tendo tocado ao vivo com Ed Motta, Simoninha, Jair Oliveira, Jimmy Bo Horne e outros. A boa relação no meio musical demonstra as afinidades de Flavia com a bossa nova, o jazz, a MPB, mas são as melodias joviais que dão o tom de seu trabalho, marcado pela pulsão do soul e da geração neon de cabelos coloridos.
“Janelas Imprevisíveis” é resultado de uma sequência de anos dedicados a traçar uma ponte entre o rebuscado e o casual, abrindo espaço para um jazz autoral com a diversidade da música contemporânea. Pianista de formação, Flavia K tem no instrumento um grande aliado para a composição de melodias originais e distintas, propondo contrastes entre o bucólico e o urbano, ou a noite e o dia, como nas faixas “Canção do Sol” e “Atelier do Silêncio”, com participações de Roberto Menescal e Slim Rimografia, respectivamente, o que demonstra a musicalidade solta da compositora, capaz de visitar a bossa nova e o rap com talento. Convidou Menescal para dividir o brilho e a leveza da bossa através de um tema lúdico e cheio de vida; ao lado do rapper Slim Rimografia, apresenta um trip jazz noturno de refrão climático e ar futurista.
Parte do requinte da música de Flavia está em sua bela voz, de afinações notáveis e timbre natural, e em como ela explora essa habilidade para compor as harmonias vocais que dão consistência às canções. Vale ressaltar que todas as vozes no disco são gravações orgânicas e não precisaram ser corrigidas ou afinadas na pós-produção.
A minúcia dos arranjos está também nos instrumentais, para os quais convidou um grande elenco de músicos para trabalhar ao seu lado no desenvolvimento de uma arquitetura musical rica, com flugel horn, percussão, teclados, guitarra, pianos e eletrônicos.
As bases de jazz, soul e blues ganham mais corpo com a rítmica de baixo e bateria, numa dinâmica estilosa que se estende por todo o álbum. As letras, feitas em co-autoria com sua mãe, Anete K, têm um toque surrealista e absurdo, uma poesia descritiva pertinente ao século 21, urbana, que se divide entre altos e baixos, com clímax, quedas e outras semelhanças com a vida real.
No disco, a fluidez de Flavia já se mostra nas faixas iniciais, “Neon”, “Sem Glúten” (single que foi distribuído no Japão através do selo Rambling Records, que colocou a faixa em uma coletânea de música brasileira) e “Janelas Imprevisíveis”, em que consegue apresentar seus elementos mais notáveis em sequência: o piano jazz em alta, a forte marcação do baixo, sempre em diálogo com o groove, o cenário perfeito para ela passear com sua voz pela MPB, neo soul, com o balanço do funk e além.
Em “Contramão”, o solo de piano de Leandro Cabral traz a nostalgia do cool jazz, enquanto o solo de guitarra de Renato Taimes em “Atrás do Vidro” explora o rock’n’roll, deixando as influências de Prince em alta. Com Marcellus Meirelles faz o interlúdio “Se Pá Tum Derê”, aproveitando das onomatopeias para dar movimento aos arranjos de voz e cordas; já “Tom” e “Plural” têm uma veia pop com ambiências de R&B.
Os eletrônicos e o uso de synths são aquele tipo de detalhe que conta muito, e, em Janelas Imprevisíveis, se propõem a reunir timbres retrôs e modernos na medida certa em busca de um Vintage Futurista, como tenta definir a própria Flavia.