Independente da cena — seja uma festa catártica ou um espaço só seu — certos sons pedem para o corpo se mover. Tudo do que Mia Badgyal já colocou na pista mira nisso, mas o panorama ainda mais underground do seu novo álbum acelera ainda mais essa proposta.
Ao longo dos últimos anos, Mia moldou sua identidade em camadas que ressoaram sempre entre o underground e a pista. Agora, o segundo projeto completo parece condensar essa energia num trabalho afiado que fala mais alto.
Diferente do primeiro projeto da multiartista, o MUCHO SEXY (o seu segundo) crava suas intenções num só volume. O melhor é como essa intensidade perdura por toda a vivacidade que o disco emana. Se no seu trabalho de estreia completo (o EMERGÊNCIA) havia certa instabilidade de ritmos e vontades, aqui temos firmeza de ideias.
O conjunto de gêneros da co-produção agitada de FUSO! emana uma pregação própria de ritmos. Seja no eletrônico puro de “GIVE2ME” ou nos ecos de summer eletrohits no final de “HOT”, todas as diferenças entre os elementos fazem sentido quando são mixadas com máxima orientação experimental.
MUCHO SEXY sempre liga o seu motor por meio dessas rupturas bem executadas. De um lado temos uma brecha que equaliza vários tipos de sons; do outro, uma só circulação de um mesmo gênero. Ambas as escolhas produzem uma energia sintonizada em um tipo de coesão sonora que dá liga a tudo.
“NÃO CONSIGO ESQUECER”, assume raízes leves de um rock distorcido e de um funk mordaz pra logo em seguida alcançar os acordes de uma rave capaz de gerar um clímax sensual. A voz de Mia assume tons deliciosos de ouvir e MC Morena entra na hora certa para mexer na atmosfera densa da canção. Produção de alto nível de BBYNITO.
Já em “RAVE DE BONECA”, com Lia Clark e Katy da Voz e as abusadas, entra em cena a consciência de manter-se numa só consistência. A música é em seu total um techno plugado a um funk potente (que, inclusive, coloca em evidência as raízes paulistanas de Mia). “ATITUDE”, a primeira do disco, também executa esse mesmo destino de uma só constância.
Mesmo que haja uma união de diferentes propostas dentro de praticamente todas as músicas, quando as composições agarram isso e decidem percorrer uma energia singular (que é sempre diferenciada pelo artista convidado), o ouvinte se depara com uma sinestesia de explosões excelentes.
O que mais funciona é o quão concentrada a tracklist é. Há uma unidade sonora recorrente que não hesita em manter o ritmo desde a primeira marcha. A maior diferenciação e prazer em escutar esses sons está na quebra das novidades por meio de ondas exacerbadas de eletricidade.
A trajetória completa, com pitadas de uma ode automotiva (motor, velocidade, gasolina e acelerar), preenche com veracidade e uma certa elegância trash (quase inexplicável) a bolha do underground.
Se o MUCHO SEXY fosse ainda mais longe em suas pirotecnias experimentais, era certeza que iríamos encontrar talvez o triplo do resultado positivo já visto aqui. Ainda assim, Mia Badgyal trouxe no seu trabalho mais potente uma unção de sons que faz pulsar o motor do underground, deixando claro seu alcance no ritmo e a energia da pista.