Foi apenas vergonhoso quando Lana Del Rey revelou os novos singles de sua atual fase. Em meados de maio, recebemos três novas canções que vieram acompanhadas de capas simplesmente horrendas. A princípio, elas representaram o desleixo da artista para com os fãs em entregar algo aos menos decente em termos visuais para essa leva de produções. E pode não parecer, mas a comunicação visual é e sempre será um impulso importante para consumirmos algo, nem notamos muitas vezes, mas ele é um divisor de águas impactante.
“Text Book”, “Wildflower Wildfire” e “Blue Banisters” trouxeram a tona para si um lado um tanto negativo quanto a tal situação. Visualmente: pavoroso. Sonoramente: um passo excêntrico na carreira da artista. As três músicas somadas a tracklist do 8º álbum de estúdio de Del Rey marcam um compasso diferente. A primeira, que serve de abertura é certamente uma canção sábia e coloca em foco a entonação pessoal dela que muitos de nós não tínhamos visto até agora: “Let’s rewrite history, I’ll do this dance with you”, canta ela na faixa que fala abertamente sobre como não ter uma figura paterna a atormenta por todas as suas conexões. Se até então ela recitava poesias meio que gerais em suas obras, agora, o momento é explanar as poesias que estavam guardadas em suas gavetas e não as feitas para um livro. Esse é então, o seu melhor lado.
Sem Jack Antonoff na produção pela primeira vez em dois trabalhos seguidos (“Norman Fucking Rockwell!” e “Chemtrails Over The Country Club”), quem assina dessa vez são Gabe Simon, Drew Erickson e Barrie-James O’Neill; que certamente pesam de maneira absurdamente positiva para a construção ímpar do disco, onde temos um levante que prioriza voz e sentimentos, sem muitos batimentos pesados (a impecável “Interlude – The Trio” é a que mais possui isso), e quando de repente aparecem, são sucintos e incríveis diante da proposta do projeto.
“Living Legend” é feita por piano e voz, mas no seu final prioriza uma distorção vocal sob a frase “Why, why, why” que faz qualquer um vislumbrar com a melodia um filme antigo; essa parece ser a faixa que mais concentra vestígios das estéticas sonoras de outros álbuns. “Dealer” também é basicamente instrumento e vocal, e assim como a outra, é potente, porém, essa se consagra como uma das melhores coisas já feitas por Lana Del Rey. Miles Kane e a cantora cantam por entre uma atmosfera mortalmente melancólica, que ela já foi enganada por algum namorado; “Gave you all my Money, gave you all me Money / I don’t wanna live / I don’t wanna give you nothing”.
A discussão sobre o quanto a fama complica relacionamentos é também abordada em “Violets For Roses”: “You tried to trade in my new truck for horses”. Ela não quer a custo algum manter mais tais desavenças em segredo. A canção é quase como um sopro caloroso no ouvido, mesmo que pareça fria às vezes. Essa consistência em termos de composição e proporções musicais é algo que ela já carrega em mãos como um primor único, mais uma evidência disso são as 15 músicas presentes aqui, que ao ficarem em uma só melodia que se expande conforme andamos, decidem não se parear a um convicção demasiadamente triste ou um romantismo que soasse chato. E é inegável, um trabalho como esse se agarraria a tal finalidade. Mas no fim, juntas, todas as canções soam marcantes como devem ser e parecem uma fusão impactante de todos os seus outros projetos.
“Beautiful”, com vocais exorbitantes e toques no microfone; “Thunder”, que possui um refrão denso e uma construção um tanto cinza; e “Nectar of the Gods”, que parece um alívio sonoro para o ouvinte ao ser erguida com um violão, possuem cada, um tipo de nuance diferente e disforme, mas representam auges importantes para o crescimento do registro de estúdio. Essa inflamação no âmago do “Blue Banisters” é importante para ponderar que medo não é algo que passa pelas veias do disco, a segurança da artista diante das suas composições ultrapassa qualquer limite que alguém de fora veja aqui dentro, chega a ser cortante, assim como as músicas.
“Sweet Carolina”, que encerra o trabalho, tem no seu último verso: “Closer to you than your next breath, my dear”. E agora devemos apenas torcer para que os próximos respiros em formato de música que Lana Del Rey traduza, chegue até nós assim como esse seu segundo álbum do ano: uma carta íntima e poderosa.
Esse é, ao menos musicalmente, o melhor período que Del Rey poderia estar. Seus três últimos discos colocam em plano o quanto a artista deve ser considerada mais do que nunca, uma lenda. E aqui ela alcança um feito implacável para tal nomenclatura.