Crítica | Clairo, “Sling”

O retorno inesperado de Clairo presenteia ouvintes com Sling, um trabalho de qualidade, mas que se faz difícil de aproveitar.

Algumas vezes pode ser fácil definir o momento perfeito para ouvir um determinado disco. Alguns soam mais como o calor, outros como uma brisa leve… e alguns soam completamente feitos para um tempo frio. Isso significa que se um álbum com uma pegada invernal é lançado durante um tempo gelado isso faz dele automaticamente bom? não. O pior é quando isso acontece em um momento que se está sem paciência alguma para o termômetro batendo poucos graus. O resultado é uma coisa boa que cansa, mas que causa um pensamento contraditório estranho, que fica difícil entender como algo tão legal e perfeito para um momento pode também soar tão chato ao mesmo tempo. Essa é a sensação que ‘Sling’, novo trabalho da cantora Clairo causa. 

Esse tipo de pensamento é tão atípico que faltam palavras para descrever exatamente como uma produção maravilhosamente minimalista, vocais suaves e letras que despertam curiosidade podem resultar em algo tão monótono. Do começo ao fim ele parece prover exatamente uma extensão de uma mesma canção, mas isso não quer dizer que todas as músicas soem iguais, porém todas soam como uma continuação desnecessária uma da outra. O maior desafio de resistência é conseguir chegar à segunda faixa, e quando isso é alcançado parece que lidamos com um vilão de videogame, que deixou sua primeira forma ser abatida apenas para revelar outra tão mais robusta. Porque chegar na terceira é praticamente uma prova de fogo, de tanto que a vontade de apertar pause parece dominar o corpo do ouvinte.

Clairo: Blouse (The Tonight Show starring Jimmy Fallon)

A razão pelo qual é tão esquisito descrever ‘Sling’ dessa forma é porque não é possível dizer que ele é inaudível, além de ser impossível definir o conjunto de faixas como um trabalho ruim. E para ‘piorar’, em nenhum momento a artista mudou drasticamente, ou mostrou uma faceta irreconhecível. Ou seja; também há personalidade aqui.

Existem momentos interessantes, com ‘Zinnias’, ‘Blouse’ e ‘Joanie’ já é possível marcar uma boa trinca de faixas, mas que acabam sendo afogadas pela maré de indiferença que as outras causam. Clairo veio de um pontapé incrível com ‘Immunity’ e aqui decidiu  fazer algo mais linear e rebuscado, mas que simplesmente não parece ser algo feito para este momento específico da cantora. Em alguns momento fica um pensamento de que ela está apenas tentando mostrar uma maturidade, mas de uma forma não natural (mesmo que isso claramente exista, vide entrevistas em que ela fala sobre o processo de criação).

Sling‘ é um resultado bonito, e que soa melhor em tempos onde é possível pegar os fones de ouvido enquanto se enrola em cobertas, mas mesmo com este ponto que o valoriza ainda não é o bastante para defini-lo como um ótimo entretenimento musical. Este é um daqueles casos que causa até tristeza não aproveitar tanto um projeto, mas para quem chegar até o final (se conseguir chegar sem pregar os olhos) é bom aproveitar bem, pois repetir isso é algo tão árduo que deveriam dar uma medalha para quem conseguir tal feito.

Nota do autor: 66/100

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