Em 2019, antes de todo o caos mundial da pandemia, The Weeknd abria mais um capítulo de sucesso em sua carreira. Dando início aos trabalhos de After Hours, o artista começava sua narrativa densa e sombria enquanto nos apresentava uma nova persona. Conhecido por performar diferentes personalidades ao longo da carreira, The Weeknd assume em After Hours o resultado de todas personas passadas.
A narrativa visual começa com o primeiro single da era, “Heartless” nos apresenta um homem que vive para o luxo mas que precisa encontrar novos prazeres, tudo isso sob um espectro sombrio. Essa primeira amostra revela um dos pontos centrais da obra. Aqui no escutai o After Hours foi eleito um dos 50 melhores de 2020.
Identidade
Ao nos introduzir no universo de After Hours não é difícil de relembrar como The Weeknd já transitou entre outros alter egos. A imagem mais recente do artista é construída sob a referência de filmes como Fear and Loathing in Las Vegas (1998), o drama policial Casino (1995) e o recente Joker (2019). Além do referencial cinematográfico é importante relembrar a aura oitentista das músicas, o que também reflete em seu estilo.
Usando um característico terno vermelho, óculos escuros e elementos que vão surgindo durante a evolução da era, o artista não poupa da criatividade e assim como nas músicas, os visuais são interligados e juntos contam uma história. Aqui ganha destaque especial os hematomas e machucados que o personagem ganha a cada novo passo. Além disso, a identidade visual é sempre mantida por The Weeknd nas performances ao vivo, em premiações ou acústicos.
Mas essa construção não é algo isolado em sua carreira. Logo no início de sua jornada, Abel Tesfaye assume como identidade XO, e a partir dela The Weeknd constrói uma imagem marcante, saindo do anonimato e se jogando nos braços da fama, luxúrias e extravagâncias. Inspirado em figuras como o rei do pop Michael Jackson e o artista Jean-Michel Basquiat, seu visual se tornou uma marca registrada.
Anos depois The Weknnd decide elevar o nível. Não só artisticamente, mas visualmente, Abel “mata” a construção de XO, e dá espaço para Starboy. Apostando em uma imagem mais amadurecida e, abandonando os dreads que eram sua marca registrada, o artista parte para um patamar acima. Ainda se relacionando com a fama, é aqui que The Weeknd se coloca como inalcançável e desfruta do momento de consolidação no meio Hip-Hop/R&B.
The Weeknd e os excessos
Em After Hours tudo isso explode. Os excessos da fama já parecem não fazer tanto sentido para The Weeknd e se tornam letais. Percebe-se uma aura de solidão logo no início da jornada visual com “Heartless”, aqui o artista nos conduz pelo momento de cartase onde as drogas, luxúria e a solidão se encontram. Desse encontro nasce o fio narrativo que vai levar adiante a história central do “homem do terno vermelho”.
Na sequência lógica visual caímos no segundo single da obra, a grandiosa e recordista “Blinding Lights” dá continuidade ao caminho tomado pelo artista. Na sequência o artista está sob efeito de um alucinógeno que o transforma em uma espécie de criatura desequilibrada. Cortes de cena com o personagem dançando sozinho em uma avenida, pilotando em alta velocidade e flertando com uma mulher dão margem para interpretações distintas, seria este o efeito da fama? Ou uma alusão à liberdade? Ele canta: “No one’s around to judje me”.
Entre seus delírios um grupo de homens surge e com eles o seu primeiro machucado. Após apanhar The Weeknd foge, ou pelo menos é assim que entendemos. Em After Hours (Short Film) ele parece estar ainda mais refém das alucinações, e misteriosamente entra em um elevador seguido de um casal, em seguida ouvimos gritos.
Guarde suas lágrimas
Toda a narrativa psicodélica e caótica se estende por mais três ou quatro vídeos que arrematam a história criada pelo artista. Após perseguir uma “final girl” em “In Your Eyes“, The Weeknd perde a cabeça e a mocinha comemora aquele grande prêmio. Na sequência, que agora parece caminhar para o desfecho, uma espécie de ritual acontece e a cabeça ganha um corpo, mas é preciso estar atento ao tom crítico desse momento. The Weeknd aqui busca de certa forma tecer uma crítica à sexualização dos corpos negros.
O tom crítico se estende e em “Save Your Tears” temos The Weeknd no capítulo final dessa história, uma espécie de conserto acontece e ele é a figura central. Rodeado de personagens que emulam um certo tom de riqueza, uma espécie de elite. Em seguida vemos uma possível crítica ao Grammy, que ignorou todo o trabalho produzido pelo artista e não lhe deu nenhuma indicação á premiação. Ele canta e se sobrepõe sob essas pessoas. Demostra indiferença ao receber um prêmio. E talvez este seja o grande ápice da nova figura que The Weeknd construiu, comprometido com a arte, pensando além dos prêmios e livre dos excessos anteriores. Apenas com seu terno vermelho e seu talento.
Ainda é válido relembrar que durante sua performance no VMA 2020 e no show do Superbowl 2021, a estética e o visual utilizado por The Weeknd permaneceu a mesma, em alguns momentos com machucados aparentes e outros com o rosto enfaixado. A fidelidade com a identidade visual coroa está que é uma, senão a, das maiores eras de The Weeknd.