Os anos 1990 foram de grande pulsão em Seattle, estado do noroeste dos Estados Unidos. Por lá estava nascendo o grunge: subgênero do rock inspirado no punk. Soundgarden, Pearl Jam e Alice in Chains são alguns dos nomes que ajudaram não só a criar, mas também a consolidar o grunge entre a juventude e, assim, expandi-lo para terras além-Seattle. No entanto, o nome responsável por emplacar o grunge nas paradas de rádio foi Nirvana, que conseguiu esse feito com seu segundo disco, “Nevermind”, que completa trinta anos em 2021.
Com inspirações nos trabalhos dos grupos Pixies, R.E.M. e Sonic Youth, Nevermind veio ao mundo sem pretensões de integrar o universo mainstream, que não era condizente com os ideais do Nirvana. Com todas as improbabilidades que o disco viesse a ser um clássico, levando em consideração o espaço que era concedido a pequenas bandas, ao grunge e a pequenas bandas de grunge, voltar trinta anos no tempo é se surpreender com as mudanças que Nevermind causou no meio musical e, sobretudo, do rock. É como se o álbum fosse um divisor de águas que marca o início do caos.
Ainda falando sobre a repercussão pública de Nevermind, o disco soa como um exemplar da hipocrisia nirvânica (mesmo que essa hipocrisia não exista nos demais trabalhos do grupo). Nevermind critica todas aquelas pessoas que não cumprem o que dizem – e assim foi com o disco. Contudo, a banda não tinha culpa: toda a malícia do marketing de vendas foi uma consequência do sucesso que a banda fez, e nunca sua intenção. Hipocrisia, portanto, torna-se uma palavra forte. Que tal chamarmos de contradição, ironia? Toda a fama conquistada pelo Nirvana com Nevermind viria a ser um dos intensificadores do vício de Kurt Cobain, vocalista e guitarrista do grupo, em heroína, o que colocou Kurt em espiral e o levou ao suicídio, em 1994.
Na década de 1990 a música não enfrentava um momento tedioso. Muito pelo contrário: grandes nomes da música estavam para lá de efervescentes, assim como Michael Jackson, Guns n’ Roses, Metallica e Iron Maiden. No meio de todos esses artistas, Nirvana surpreendeu a todos – até a eles mesmos – e emplacou a faixa “Smells Like Teen Spirit” nas paradas musicais. A música nunca foi a preferida de Kurt Cobain, vocalista do grupo, que não apostava na canção para ser uma das preferidas do público. Mas não há como negar que Nevermind é um discão.
A capa do disco foi um tanto polêmica na época: Robert Fisher, idealizador da fotografia, decidiu colocar o bebê Spencer Elden, pelado, em uma piscina. Depois de alguns shoots, foi escolhida a fotografia que seria a capa do disco. Kurt, ideiudo como sempre, sentiu que faltava alguma coisa ali e colocou um anzol com uma nota de um dólar. A edição no Photoshop não era tão simples nos anos 1990, mas mesmo assim foi um sucesso. A capa é icônica, impossível de ser esquecida. Você pode não relacionar a arte ao disco, mas com toda certeza já viu a fotografia do pequeno Spencer circulando por aí.
Elden viria a ser um dos maiores fãs de sua própria fotografia anos depois, o que o faria reproduzir a capa de Nevermind de tempos em tempos – dessa vez, é claro, vestindo roupas. Depois de anos de animação para repetir sua foto embaixo d’água, Elden decidiu processar o Nirvana. Um pouco contraditório, não? A decisão do bebê crescido foi motivo de críticas ácidas de Frances Bean Cobain, filha de Kurt. É, isso não pegou muito bem para Elden.
A sonoridade do Nirvana deixa de ser menos crua em Nevermind e, mesmo diante de uma influência nítida do punk, permite que suas composições sejam mais melódicas. O grupo não abre mão de suas letras sombrias e passionais (cortesia de Kurt), que conquistaram jovens que se tornaram adultos e influenciaram jovens que continuam a influenciar pessoas. A influência de Nevermind sobrevive aos anos – seja aos trinta que percorreu até aqui ou aos trezentos que ainda virão.