Em 2015, uma jovem de 19 anos, com cabelo azul e voz urgente, surgiu no centro do pop alternativo carregando um mundo inteiro dentro de si. Badlands, álbum de estreia de Halsey, nasceu como uma paisagem sonora árida, quase sufocante, e paradoxalmente se tornou refúgio para milhares de jovens que se reconheceram nas dores da artista. Uma década depois, o disco não perdeu força: continua sendo mais do que um registro de época — um território emocional compartilhado, onde dor, identidade e pertencimento colidem.
Com sintetizadores pesados, letras confessionais e uma estética visual cuidadosamente arquitetada, Badlands não se encaixava nos moldes do pop de rádio em 2015. Ainda assim, estreou em segundo lugar na Billboard 200 e foi certificado três vezes platina. Um sucesso inegável — mas o mais impressionante é como o disco atravessou o tempo: faixas como “Ghost”, “Hurricane” e “Gasoline” permanecem tão vívidas e impactantes quanto na primeira vez em que foram ouvidas.
A força de Halsey está na construção de um universo próprio. “Castle” abre o álbum como um prelúdio cinematográfico, metáfora para a ascensão precoce à fama; “New Americana”, com toda a sua ironia geracional, coloca na mesa o retrato de jovens criados num mundo globalizado e competitivo, à base de cultura pop, redes sociais e ídolos mortos; “Control” expõe os demônios internos de forma crua, quase desconfortável; enquanto a aparente suavidade de “Drive” esconde um desencanto melancólico. Até mesmo “Colors”, que a própria artista admitiu não gostar tanto atualmente, persiste sendo uma favorita dos fãs, que acolhem a canção com a memória afetiva de um tempo que passou e já não volta mais. Não há nada inteiramente seguro ou leve em Badlands — cada faixa soa como uma tentativa de sobreviver em um território hostil.
Os críticos da época dividiram opiniões. Alguns acusaram Halsey de ser derivativa, herdeira direta de Lorde e Lana Del Rey. Outros reconheceram o álbum como uma obra conceitual coesa, quase literária. A verdade é que Badlands sempre foi as duas coisas: filho legítimo de suas influências, mas também um manifesto de singularidade. Halsey nunca se propôs a ser neutra — e é justamente nesse excesso, na estética maximalista, nas letras carregadas, na entrega visceral, que reside o magnetismo do álbum.
Dez anos depois, seu legado é incontestável. Badlands é lembrado como o trabalho mais querido da discografia da artista, aquele ao qual os fãs sempre retornam. Foi o disco que solidificou Halsey como representante de vozes marginalizadas no mainstream: uma mulher jovem, birracial, bissexual e bipolar, falando abertamente sobre identidade e fragilidade num momento em que o pop ainda relutava em encarar tais temas.
Em 2025, Halsey escolhe revisitar esse território com a mesma dramaticidade que o originou. A Badlands Decade Edition resgata faixas antes relegadas à categoria de bônus, agora integradas oficialmente ao corpo do álbum. O box triplo Badlands: Anthology abre as portas para demos e versões orquestrais que expandem a mitologia do disco. Há também o lançamento de Badlands: Live From Webster Hall, registro do show de 2019 que já circulava como culto entre fãs. E, como se não bastasse, o lançamento dos clipes inéditos para “Gasoline” e “Drive” reaviva a estética distópica que marcou a era.
Tudo culmina na turnê Back to Badlands, anunciada para 2026 — um retorno ao palco de onde tudo começou, mas agora com o peso de uma década de carreira consolidada.
“Badlands é sobre um estado de espírito aterrorizante e aprisionador”, escreveu a artista nas redes sociais este ano. “Fiquei aliviada e horrorizada em saber quantos de vocês puderam se identificar. Dez anos significam dez anos que vocês conseguiram. Vocês venceram.” Há uma sinceridade desarmante nessa fala: Halsey reconhece que o disco que a projetou também foi o espelho de tantas dores coletivas.
Em retrospecto, Badlands não é apenas o retrato de uma artista em ascensão; é um álbum que encontrou sua força ao abraçar o desconforto, ao transformar alienação em pertencimento. Talvez por isso continue tão relevante hoje: porque os desertos internos sobre os quais Halsey cantou em 2015 não se evaporaram — apenas se transformaram em chão fértil para uma geração inteira.