Wolf Alice retorna com “The Clearing”: um registro vulnerável sobre maturidade

Apesar de completamente diferente de tudo que o Wolf Alice já fez, The Clearing jamais poderia existir sem seus predecessores

Não é nada incomum encontrar o nome do Wolf Alice entre as melhores expoentes da música britânica na última década, e isso não é por acaso. No ano de 2025, a banda formada por Ellie Rowsell (vocal/guitarra), Theo Ellis (baixo), Joff Odie (guitarra) e Joel Amey (bateria) celebra dez anos desde sua estreia com o álbum My Love Is Cool, que já foi o suficiente para lhes render uma menção na shortlist do Mercury Prize de 2015, uma das maiores honrarias da música do Reino Unido e Irlanda, prêmio que seria finalmente conquistado por eles em o seu segundo álbum, Visions of a Life, lançado em 2017. 

O projeto mais recente do grupo até então havia sido o deslumbrante e apoteótico Blue Weekend, lançado em junho de 2021, que deu ao quarteto seu primeiro Brit Awards na categoria melhor grupo britânico, desbancando nomes de peso como Coldplay e Little Mix. No ano seguinte, a banda encerrou seu contrato com a Dirty Hit, gravadora independente com a qual lançou os três primeiros discos, e passou a integrar o catálogo da RCA, selo pertencente à Sony Music.

A mudança para uma gravadora maior, o início de uma nova década de vida para os integrantes, todos na casa dos trinta, e o tempo extenso passado nos Estados Unidos sob a produção de Greg Kurstin (Harry Styles, Adele) foram essenciais para a concepção do álbum The Clearing, quarto projeto do quarteto londrino, que deixa de lado a rispidez do indie rock tão presente em seus registros anteriores para dar lugar a influências do glam e soft rock setentista muito bem representado pelo grito de empoderamento e autoconfiança que é o lead single “Bloom Baby Bloom”, canção escolhida introduzir a nova era de um grupo já conhecido por sua competência acima da média.

O segundo single lançado, “White Horses”, marca a primeira vez desde My Love Is Cool que o baterista Joel Amey assume os vocais, em “Swallowtail”. Na nova faixa, Amey divide os vocais com Ellie Rowsell, cuja interpretação remete fortemente a de Dolores O’Riordan, com uma dinâmica e instrumentalização se assemelham aos moldes do Fleetwood Mac, enquanto refletem sobre identidade, família e pertencimento.

“Thorns”, uma poderosa balada regada a violinos e piano, abre o novo capítulo do Wolf Alice refletindo justamente no capítulo anterior, onde relacionamentos interpessoais foram abordados de diversas formas ao se questionar “tirar o espinho te ajudou? Contar para o mundo inteiro que você se machucou? […] Eu devo ser uma narcisista, Deus sabe que eu não consigo resistir a fazer uma canção sobre isso e dançar”. A faixa estabelece de imediato a proposta de observar passado e presente sob uma ótica mais madura que serve de fio condutor durante todo o projeto, onde a banda encara as próprias fragilidades de forma crua, acompanhada de uma roupagem sonora mais polida. 

Indo para um direcionamento mais leve e desencanado, “Just Two Girls” é um aceno atualizado a “Bros”, que celebra amizades saudáveis entre mulheres, mas que agora, ao invés de abordar a inocência de um grupo de jovens descobrindo a vida, passa a refletir sobre a rotina de uma relação amadurecida pelo tempo. Embora o novo álbum não possua momentos de catarse como “Yuk Foo” e “Play the Greatest Hits”, que de certa forma fazem falta, “Passenger Seat” e “Leaning Against the Wall”, que são os momentos mais românticos do disco, funcionam como respiros emocionais que revelam uma outra faceta da banda: menos explosiva, mas ainda fiel a sua essência de evocar emoções em todos os tipos de intensidade. 

O destaque lírico do álbum fica com a faixa “Play It Out”, facilmente a mais vulnerável do disco, cuja temática é centrada em questionamentos sobre o futuro, que envolvem o peso do relógio biológico, principalmente na perspectiva feminina, maternidade (ou a ausência dela), e o desejo de envelhecer graciosamente, abordando sem rodeios diversas incertezas que se agravam com a pressão do mundo externo e regras impostas pela sociedade. 

Apesar de completamente diferente de tudo que o Wolf Alice já fez, The Clearing jamais poderia existir sem seus predecessores, uma vez que foi necessário atravessar todas as etapas da última década para alcançar este ponto de autorreflexão, em que o passado já parece mais distante do que o futuro. Com a consciência de que cada fase foi essencial para moldar sua identidade artística, a banda abraça uma nova era e mostra que amadurecer também pode ser um ato revolucionário.

80/100

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