Crítica | 5 anos do “Emotion” da Carly Rae Jepsen

Há meia década, “Emotion” fez uma viagem por emoções amorosas e paisagens sonoras oitentistas, consagrando Carly Rae Jepsen como uma das queridinhas do pop alternativo

O “Emotion” (ou como foi estilizado “E•MO•TION”) comemora meia década de lançado, e também a transformação e consolidação de Carly Rae Jepsen além dos estereótipos de a “menina do Call Me Maybe”. Sendo aclamada pela crítica e acumulando elogios como “um dos melhores álbuns do ano”, a cantora ressurgiu com um trabalho extremamente polido e mostrou que ainda tinha muito a oferecer. Apesar do sucesso comercial não ter sido gigantesco, seu terceiro disco foi cirurgicamente necessário para colocar a artista como a queridinha do pop alternativo.

O ano de 2015 com certeza foi um ano memorável na música pop e de lançamentos de “gente de peso” em todos os setores: o mainstream tocava no repeat ‘Cool For The Summer’ de Demi Lovato, ‘Hands To Myself’ de Selena Gomez e vários outros hits da época. O indie e o pop alternativo cultuavam discos como “How Big, How Blue, How Beautiful” de Florence + The Machine, “Honeymoon” de Lana Del Rey e até mesmo experimentaram a vibe excêntrica do Froot de Marina (ex-and The Diamonds). O melhor daquele ano era: não haviam modismos tãaaaaao característicos e tendências para ditar o que deveria ou não ser executado nos streamings, que estavam se popularizando. Era uma época de experimentações.

Divulgação

Esse com certeza foi o cenário mais propício para se lançar um projeto como “Emotion”. Neste, ao contrário de seu trabalho anterior, “Kiss” (2012), Jepsen não se agarrou aos modismos e promessas de “fórmulas do sucesso”, que vinham sendo utilizados por muitos na indústria musical.

Claro que o teen pop característico do álbum anterior ainda é o que permeia esta obra, mas agora com influências mais maturadas, oitentistas, synth pop e que flertam com o dance pop, soando até mesmo como algo que Robyn faria (inclusive foi uma das inspirações de Carly).

Ao que parece, o processo de composição foi muito produtivo e acredite: ela chegou a escrever cerca de 250 canções para o disco, de acordo com a Rolling Stone. Nomes sinônimos de hits, como Sia, Shellback (Britney Spears, Kesha e outros) e Ariel Rechtshaid (Kylie Minogue, Adele, Madonna e outros), foram envolvidos na criação e produção do trabalho, junto a nomes não tão óbvios: Dev Hynes (conhecido como Blood Orange), e Rostam Batmanglij (envolvido com Solange Knowles, Charli XCX, Lykke Li e outros), além de Tegan And Sara.

Incluindo as bônus da edição deluxe, são 15 faixas (além de algumas descartadas que lançou no ano seguinte em um EP denominado “Emotion: Side B”). Como o próprio título sugere, a artista nos leva para uma viagem dentro de suas emoções, 99% amorosas. E isso é reforçado na capa do disco, com uma inusitada definição da palavra “emoção” no dicionário:

“Um estado natural instintivo do mundo derivado das circunstâncias, humor ou relacionamento com os outros. Ex: “Ela estava tentando controlar suas emoções.”

Na obra ouvimos várias nuances românticas, marca registrada de Carly, e que praticamente não sai desse lugar. Não é o tipo de obra que se destaca por falar de temas polêmicos e extremamente delicados. Uma especialidade bem intrínseca da cantora são as narrativas bem construídas, que em conjunto com as paisagens sonoras dos anos 80 do trabalho, e com sintetizadores e bateria característicos da década, nos proporcionam uma sonoridade com um certo “frescor” e letras românticas de fácil identificação: desde o auge de uma paixão, até mesmo perceber que você estava tentando mudar para outra pessoa.

Ao primeiro play, um saxofone toca e soa como algo triunfante: essa é ‘Run Away With Me’, que inclusive foi o segundo single oficial. Sem dúvidas é um jeito brilhante e enérgico de se começar um álbum. A letra, pegajosa na medida certa, em conjunto com uma melodia que ganha força a partir do pré-refrão e torna-se extremamente explosiva no refrão, mostram muito bem o que a obra tem a nos oferecer, com as emoções à flor da pele! E até ganhou um clipe em que a artista nos leva para fugir com ela por aí.

A faixa-título, ‘Emotion’, no começo até chega a se assemelhar ao estilo do “Kiss” e seu estilo mais puro e jovial. Aqui, o destaque é para um pré-refrão viciante com que nos prepara para um refrão super dançante no meio de um vibe bem teen. “Na sua fantasia, sonhe comigo. E tudo isso poderíamos fazer com essa emoção”

A canção seguinte é o lead single ‘I Really Like You’, responsável por representar o álbum comercialmente, e que cumpriu muito bem esse papel de pedaço mais radiofônico do todo. Liricamente, apresenta uma letra chiclete com as características melancólicas e adolescentes de algo que “ainda não é amor, mas é quase”. E a cantora trouxe um clipe super divertido estrelado por nada mais, nada menos, que Tom Hanks, em que botou o ator para fazer um belo lipsync da canção e dançar, junto com Justin Bieber!

Single promocional e também responsável pelo nome da turnê promocional do disco, ‘Gimmie Love’, chega a ser despretensiosamente “bobinha” sonoramente falando, mas ao mesmo tempo polida. É um verdadeira sofrência pelo ex de uma forma dançante. Mas aí os ritmos acalmam com a balada ‘All That’, que nos transporta para lembranças de baladas clássicas dos anos 80. É praticamente o único “ponto de respiro” da tracklist. Além de ser um dos pontos onde Carly mostra uma incrível versatilidade sonora.

Os anos 80 continuam e voltam a ficar dançantes e calorosos com ‘Boy Problems’, que foi o quarto e último single. A faixa mostra o quanto Jepsen evoluiu até aqui com seu estilo e fecha a parte mais comercial do disco. A música apresenta uma introdução falada pela cantora e compositora Sia, que co-escreveu a música com Jepsen: “Ouça, apenas saia ou fique … mas eu terminei com você esta noite”.

O clima fica um pouco mais “experimental” em alguns momentos a partir de ‘Making The Most of The Night’. Apesar de um pouco confusa, é essa diferenciação sonora do resto que acaba deixando o som interessante.

O synthpop rola solto no ‘Your Type’. O terceiro single é uma faixa poderosa e um dos pontos altos do álbum. A bateria marcante e o sintetizador incisivos casam perfeitamente com os vocais com alta carga sentimental, apesar da voz angelical da Carly. É uma sofrência de qualidade!

‘Let’s Get Lost’ se apresenta como uma faixa morna, principalmente por vir após ‘Your Type’, porém, nos proporciona sons interessantes de saxofone. Quem destoa do restante, e positivamente, é ‘LA Hallucinations’. Na letra, a artista sai por um único momento de seus relacionamentos amorosos para falar sobre dinheiro e fama. A melodia rápida e os sintetizadores fogem totalmente da produção até então empregada, soando até mesmo como algo que Britney Spears faria. Essa seria uma música que veríamos em uma série adolescente dos anos 2000. E logo temos a poluída ‘Warm Blood’, com uma pegada experimental. 

Essa vibe permanece com ‘When I Needed You’, a última faixa da edição standard. Ela encerra na mesma vibe dançante que o disco começou, apesar da letra um tanto pesada, o que prova que até nesses momentos Carly consegue transformar em algo leve e divertido. 

Na edição deluxe temos ‘Black Heart’, um pop que poderia ser facilmente cantando por Lindsay Lohan na época da Disney. Não é algo memorável, mas realmente cumpre seu papel como faixa-bônus. Seguida de “I Didn’t Just Come Here To Dance” que apesar de genérica, soa como um hino da pista de dança. Talvez possa ser considerada uma das poucas heranças de fato do trabalho anterior.

E vale muito mencionarmos o baque com a transição para a balada ‘Favourite Colour’, a faixa de encerramento da edição deluxe. Apesar da quebra de ritmos, essa seria uma música de créditos finais de filme. Ou seja, o final perfeito para um disco que percorre clichês amorosos e os tipos de emoções que eles podem nos proporcionar. É completamente apaixonada, com um coral dando força à canção e vocais extremamente doces.

No todo, é um álbum muito conciso e com uma narrativa liricamente muito bem amarrada. Não é o tipo de disco que inventou a roda e nem há uma variedade de temas. E talvez a proposta não seja essa.

O foco em letras extremamente bem escritas e em uma sonoridade impecável, com direito à algumas fugas do “estilo clássico Carly Rae Jepsen”, nos proporcionam uma verdadeira obra “pop perfection”. Inclusive, para celebrar o aniversário do disco, a cantora preparou alguns mimos para os fãs: uma “Emotion Karaoke Party” para o dia 27 de agosto e também liberou as faixas bônus “Never Get to Hold You” e “Love Again”, presentes na edição japonesa do álbum. Parece que alguém ficou empolgada, né?

Nota do autor: 90/100

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