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Crítica | Manu Gavassi, “GRACINHA”

Manu Gavassi distorce visões e surpreende em GRACINHA, provando que sua parte criativa sempre se reinventa e que de sua cabeça costumam sair ideias mais interessantes e profundas do que qualquer um espera.

Há pouco mais de um ano, Manu Gavassi era uma das personalidades que muito se fazia presente em conversas cotidianas sobre celebridades. Possivelmente em algum momento ela era a pessoa famosa mais comentada por aí, isso pela razão de estar ao vivo, vinte e quatro horas por dia, naquele que se tornou um dos maiores eventos anuais da TV brasileira: O Big Brother Brasil. Hoje ela é uma das personagens mais memoráveis dentro das suas mais de vinte edições, e mesmo que atualmente outra cantora saída do mesmo reality show seja o maior símbolo de fama pós-confinamento, Manu ainda é presença fixa na memória de muitos. Seja por razões boas ou ruins.

Manu Gavassi – sub.ver.si.va

Alguns parecem se esquecer, mas a artista é uma mulher há muito tempo. Se enganou quem achava que seu comportamento público e baixa estatura representavam uma menina mimada e que pouco acrescentava à arte que produz. A cantora (e atriz, e produtora e muitas outras coisas) de vinte e oito anos já vem exercendo uma maturidade relevante em sua música, mesmo que a maior parte de seus fãs seja composta por pessoas jovens. Manu Gavassi aproveita de visões distorcidas para surpreender muito positivamente em GRACINHA, provando que sua parte criativa sempre pode se reinventar e mostrar que de sua cabeça costumam sair ideias mais interessantes e profundas do que qualquer um espera.

Logo nos primeiros momentos é possível ouvir um toque de fantasia abrindo os caminhos para sonoridades que vão do lo-fi, passando por MPB e típica música pop. O clima é chique, sublime e de uma leveza que nunca foi uma grande definição da musicalidade de Manu. Se em outros momentos suas letras evocavam lembranças de relacionamentos mal acabados, agora ela foca mais do que nunca em si mesma. Mas nada disso soa como alguém que quer esquecer do passado, mesmo que ele seja marcado por fases esteticamente um pouco duvidosas e apostas em melodias que até ficavam na cabeça, mas que ainda não eram exatamente tudo que ela tinha para mostrar seu real valor.

Dessa vez ela desperta mais que uma simples curiosidade, e seus trabalhos antigos foram necessários para que ela se tornasse o que mostra agora. Se com os EPs “CUTE BUT PSYCHO” e “CUTE BUT (still) PSYCHO” ela já caprichava em letras e algo um pouco fora da curva, aqui ela vai completamente para um mundo novo e demonstra ter pensado no projeto como algo grandioso da melhor forma; sem parecer ter tido qualquer tipo de dificuldade em executar este plano com excelência.

Agora a voz mudou, o canto está mais maduro e suas falas sobre como sua fama e personalidade podem até sufocá-la também deixam a conexão com suas palavras mais fácil. Manu Gavassi demonstra leveza na fragilidade musical que emana logo nas primeiras faixas. ‘GRACINHA’ e ‘Eu nunca fui tão sozinha assim’ são reflexos do quanto a experiência de estar sendo vigiada no passado a afetou, mas ela evita soar traumatizada, em vez disso narra como eventos comuns a fazem ficar reflexiva sobre sua própria vida, por mais (surpreendentemente) banal que às vezes pareça. A aposta em músicas que se conectam sonoramente e vão crescendo e chegando a picos de batidas mais marcantes é um dos maiores acertos do disco, quando se percebe isso em ‘sub.ver.si.va’, logo já é possível se pegar dançando com ‘Tédio’.

O maior momento acontece em ‘Bossa Nossa’, a faixa vicia logo nos primeiros versos e demanda muita força do ouvinte para que não acabe em um looping quase eterno… Quando recomenda ações como beber cachaça para si mesma e entende que foi mais uma ideia do que realmente um símbolo único de força, é quando ela mostra que estar com os pés no chão sobre quem é a tornou (para alguns, finalmente) uma pessoa agradável e identificável. Essa forma coesa e minimalista que as produções de Lucas Silveira acompanham os vocais pode até parecer uma montagem tímida, mas basta uma segunda ouvida para perceber que elas complementam os vocais da artista da forma mais mágica possível.

GRACINHA é seu melhor trabalho até então, e parte do que o faz ser tão bom é dar a impressão de que ela escondeu de propósito tudo que realmente pode fazer. Sua sonoridade é muito bem cuidada, rica sem parecer esnobe e leve… Indo contra o pensamento de que a cantora não conseguiria fazer com que sua arte evoluísse algum dia.

Ela arrisca, mas de forma cuidadosa e sem andar mais que as próprias pernas, isso porque sabe muito bem como se dirigir, como cada aspecto da sua carreira deve se portar e quando ela deve ou não ousar. E esse auto controle quase frio pode ser o que a fez se sentir um pouco deslocada quando o grande público finalmente a conheceu na televisão, mas é por causa dele que ela se mantém firme em uma corda bamba imaginária onde qualquer um visado por milhões de pessoas costuma cair tão facilmente. Manu Gavassi é inteligente como musicista, mas essa qualidade só vem pelo fato do que ela é como pessoa: muito, mas muito esperta.

Manu Gavassi – Bossa Nossa

Nota do autor: 79/100

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