Em um sábado chuvoso e um domingo de mais esperança, o Paramore subiu ao palco montado no Centro Esportivo Tietê para duas apresentações esgotadas – que reuniram mais de dezessete mil pessoas em cada dia. Depois de uma passagem no Rio de Janeiro, a turnê celebrou em São Paulo o encontro com o Brasil — e fez valer cada segundo das apresentações, que eram aguardadas pelos fãs desde a última vinda da banda para cá, nove anos atrás.
Se no sábado a chuva quase torrencial pareceu não abalar os fãs, que vibraram e cantaram todas as faixas apresentadas a plenos pulmões, no domingo o astral era diferente. Sem vaias que confundissem a banda ou capas de chuva coladas no corpo, o show de domingo pareceu seguir mais leve. Com duas substituições no setlist e a inclusão de uma das faixas mais amadas e pedidas pelos fãs do Brasil, a apresentação foi elogiada pela própria vocalista, Hayley Williams, que brincou com o fato do show ter sido melhor na segunda apresentação.
E falando em vocalista, Hayley é mesmo um show a parte. Sem dúvidas a integrante mais conhecida e querida do público geral, a animação e os vocais da artista são surpreendentes. Sabemos que “ser a mais famosa” dos integrantes não é sequer uma preocupação da artista, que a todo tempo exalta seus colegas de banda e os traz para os holofotes, mas é fato que a simpatia e carisma sustentam com magnetismo sua presença no palco, e dão liga a banda como um todo de forma hipnotizante.
As interações orgânicas com o público iam de comentários sobre as roupas que usavam e seus cortes de cabelo e sorrisos constantes, a um breve e emocionante discurso sobre lições que a cantora aprendeu com o amor ao passar dos anos, encerrando enfática: “O maior e mais duradouro amor da minha vida é o Paramore. Obrigada por amarem isso tanto quanto a gente”.
O contato visual e as brincadeiras da banda pareciam deixar tudo mais aconchegante e intimista, mesmo que em alguns momentos pudéssemos ver pelo telão a quantidade de pessoas conectadas ali. O poder de escrita nas letras escancaravam uma afinidade atenuada por traumas e amadurecimento, acolhimento de vulnerabilidades e consciência do mundo ao redor.
É o que propõem letras como “The News” e “Running Out Of Time” do trabalho mais recente (This Is Why), “Hard Times” e “Rose-Colored Boy”, de “After Laughter” ou “All I Wanted”, do “Brand New Eyes” e um dos pontos mais altos do show: fechando a apresentação antes do bis, com novos e caprichados arranjos de bateria comandados por Zac Farro e escancarando o poder vocal de Hayley, que por anos evitou cantar a música e agora nos presenteia dando vida a essa jóia da discografia. A setlist faz um satisfatório passeio pelos principais álbuns da banda, contemplando também o mais nostálgico “Riot!” e honrando os fãs de longa data.
Coroando essa intimidade e festejando o sucesso do último show, a banda voltou para o encore surpreendendo a todos com “Decode”, música de 2008 que fez um sucesso estrondoso no Brasil e que marcou a trilha sonora do filme “Crepúsculo”. Claro que esse ponto de atenção arrancou gritos ensandecidos do público, que vibraram com cada segundo da canção. “Misery Business” foi outro clássico trazido de volta, que contou com a participação de uma fã no palco e que levou a plateia ao delírio. “This Is Why”, faixa título do álbum mais recente, fechou a apresentação com chave de ouro, agitando os últimos minutos das quase duas horas do literal espetáculo.
De forma geral, as apresentações do Paramore no Brasil estreitam um laço antigo de carinho e cumplicidade da banda com seus fãs, e parece reforçar um comprometimento não verbalizado da banda de continuar amadurecendo seus pensamentos e atitudes, apresentando um show inclusivo, consciente e refrescante, bem como o repertório de álbuns da banda, que parece não envelhecer, e sim se atualizar de forma invejável.
As novas canções, apresentações e posturas dos artistas demonstram humanidade e, principalmente, atenção para o presente e futuro, garantindo novos e constantes passos na estruturação do Paramore não apenas como uma das bandas mais importantes e marcantes do nosso tempo, mas como referências quase atemporais de musicalidade e comportamento que são louváveis — e foram muito bem celebradas nessas apresentações.