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Crítica | Amyl and The Sniffers, “Cartoon Darkness”

O disco é uma evolução bem vinda para Amyl and The Sniffers, quarteto que não tem medo de arriscar e questionar as convenções do punk

Novos queridinhos do mundinho punk, a banda Amyl and The Sniffers, liderada pela potência e pelo carisma da vocalista Amy Taylor, lançou recentemente o seu aguardado terceiro álbum de estúdio, Cartoon Darkness. O novo trabalho do quarteto australiano vem depois de dois discos muito bem recebidos pelo público e pela crítica, Amyl and The Sniffers (2019) e Comfort To Me (2021), que deram ao grupo o selo de futuro do punk rock por conseguir refrigerar a cena mundo afora.

Em atividade desde 2016, a banda começou a ganhar repercussão mundial de verdade após o lançamento do primeiro trabalho, em 2019, por trazer características muito caras ao punk rock: diversão, ironia e crítica social. Outro aspecto que virou os holofotes para o grupo foi a vocalista Amy Taylor com seus cabelos loiros oxigenados setentistas, seus shortinhos curtos, a voz quase rouca e uma presença de palco assustadoramente poderosa. É impossível não ter a atenção captada quando ela está ao vivo e até mesmo em seus videoclipes.

Embora a boa repercussão inicial, foi mesmo em Comfort To Me, em 2021, que a banda alçou voos maiores. Foi nessa época que foram convidados para abrir shows de nomes como Weezer, Fall Out Boy e Green Day, chegando a excursionar nas turnês do Smashing Pumpkins e do Jane´s Addiction. Neste ano de 2024, inclusive, eles pegaram as estradas americanas com o Foo Fighters para apresentações em estádios. 

Antes da virada de chave com os discos de estúdio, Amyl and The Sniffers já haviam lançado dois EPs: Giddy Up (2016), que foi gravado em 12 horas; e Big Attraction (2017). A experiência com os palcos começou a ser construída nessa época. Suas apresentações em pubs eram sempre caóticas, com Amy pulando feito canguru e gritando até onde suas cordas vocais pudessem aguentar. 

O caos organizado de shows de punk rock, com gente voando por cima das outras e se acotovelando enquanto a banda faz barulho, é a definição perfeita de como a sonoridade dos australianos se projeta. A diferença do quarteto para a maior parte dos grupos atuais é que, nesse caso, o trio de músicos só está ali para que todos possam ver a vocalista transmitir a sua mensagem. 

E ela tem muitas mensagens a passar, sem rodeios e pouco preocupada se vão gostar ou não. A artista é uma voz abertamente a favor da legalização do aborto e preocupada com os direitos reprodutivos das mulheres, uma crítica assídua da exploração capitalista e frequentemente alfineta os roqueiros conservadores que têm infestado o rock. A banda foi bastante atacada no começo da carreira por esse último público, inclusive. 

Em “Cartoon Darkness”, no entanto, a visceralidade é, de certa forma, amenizada. O trabalho traz uma certa maturidade ao quarteto, mas sem ficar chato e pretensioso. Eles continuam barulhentos e fazendo piadas sobre peido de garotos do colegial, por exemplo. Mas, aqui, abre-se espaço para baladas e músicas mais dançantes. A mescla de assuntos também traz um tom menos juvenil e mais atual. Quando perguntada por um jornalista sobre do que se trata o álbum, Amy disse:  “é sobre crise climática, guerra, IA, pisar na ponta dos pés nas cascas de ovos da política e pessoas sentindo que estão ajudando ao ter uma voz online quando estamos todos apenas alimentando a fera de dados das Big Techs, nosso Deus moderno”.

É interessante notar que eles falam desses assuntos, à primeira vista sérios e até com certo tom academicista, de uma forma popular. A cozinha musical de três acordes do punk clássico se mesclam a guitarras mais complexas e traduzem um pouco a sonoridade fácil e agitada do grupo. “Cartoon Darkness” tem quatro singles bem trabalhados que ganharam videoclipes inusitados e criativos. U Should Not Be Doing That”, “Chewing Gum”, “Big Dreams” e “Jerkin”. Esse último traz cenas de nudez frontal, com uma versão censurada no Youtube e uma completa no site da banda com um aviso de classificação indicativa para maiores de 18 anos, mas que já está fora do ar. 

“Big Dreams”, “Bailing On Me” e “Going Somewhere” marcam a presença de faixas menos explosivas, com bons arranjos e sonoridade bem construída. Elas são pontos de respiro do trabalho, que conta com 13 faixas em quase 34 minutos. O álbum saiu pela  B2B Records e Virgin Music Records e foi gravado no 606 West, em Los Angeles, nos Estados Unidos. O estúdio é conhecido por ter sido o local onde foram gravados álbuns icônicos como o “Nevermind” do Nirvana, e o “Rumors” do Fleetwood Mac.

Embora a banda aparente ter dado um passo em direção a uma sonoridade mais complexa e uma reflexão mais aprofundada sobre o mundo contemporâneo, “Cartoon Darkness” jamais perde seu espírito provocador e energético. O disco é uma evolução bem vinda para Amyl and The Sniffers, quarteto que não tem medo de arriscar e questionar as convenções do punk, enquanto mantém uma autenticidade que cativa e ressoa com seu público. O álbum é ousado, inteligente e, acima de tudo, divertido, marcado por uma visão crítica do mundo atual, sem perder a energia e o humor que sempre definiram o grupo.

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