Na música, há diversos anos que definiram de maneira latente a música. Por exemplo, quando se pensa em 1995, é impossível não lembrar do britpop, que trouxe uma nova roupagem ao rock britânico. Enquanto o embate de Oasis e Blur, dois grandes destaques do gênero ocorria, outras alçavam seu lugar na cool britannia, uma delas foi o Pulp, que em outubro daquele ano, trouxe ao mundo seu álbum de maior sucesso: Different Class, que acaba de completar 30 anos em 2026.
Ao longo destas três décadas de vida, Different Class permaneceu no imaginário britânico, não apenas por sua sonoridade dançante, divertida e a icônica voz sussurrada, quase como um gemido do vocalista Jarvis Cocker, mas também por suas letras perspicazes, capazes de contar histórias tipicamente inglesas, mas que ao mesmo tempo são universais — quase como uma crônica musical.
No lançamento do primeiro single “Common People”, já é possível conhecer a primeira história: uma garota rica, amante das artes e totalmente fora da realidade, que decide experimentar um pouco da vida comum do trabalhador. Com um ritmo moderno e dançantes, o single sintetiza muito bem o que é o Different Class.
No final de outubro de 1995, o mundo pode conhecer melhor Pulp e desbravar a experiência da mundana vida de seus personagens, retratados não apenas em versos, mas também em cada escolha sonora, instrumento e influência.
Pulp e as crônicas britânicas
As décadas de 1980 e 1990 foram eras de predominância conservadora na política britânica, com participação em conflitos armados e crise econômica. Nisso, não é de se surpreender que neste álbum tão focado nas classes sociais que a primeira canção fosse um chamado ao protesto.
“Mis-shapes” se inicia com um ritmo que remete aos 60, algo como The Archies, enquanto descreve estas pessoas desajustadas, sem dinheiro e periféricas. Logo em seguida, o tom da canção puxa para o punk, com guitarras distorcidas, no momento em que Jarvis Cocker os chamam para pegar o que lhes é direito: casa, cultura e tudo o que a elite não os permite ter.
Agora, a partir de uma lupa, a banda começa a contar histórias da vida privada. Em “Pencil Skirt”, Pulp ousa em uma letra sensual sobre um caso extraconjugal, unido a um ritmo que acompanha essa estrutura sexy criada pela voz de Cocker, que sussurra em seu ouvido, te fazendo acreditar que quem está de saia lápis erguida é você. Ele ainda cria uma camada de complexidade com o uso da harpa, misturando o erótico ao recatado.

Da sensualidade quase exacerbada, o álbum passa para um retrato do constrangimento dos primeiros encontros íntimos em “Underwear” — passando por um fluxo de pensamentos do casal que surgem enquanto a garota se despe: a vergonha, a paixão e o erótico surgem de forma quase irônica, mas com um compasso quase epopeico e ansioso. A música harmoniza muito bem com o restante do álbum e traz um dos versos mais divertidos do álbum: “Se a moda é sua profissão/ Então quando você está nua/ Eu acho que você deve estar desempregada”.
Além de toda a influência evidente em todo o álbum, e no próprio britpop do rock dos anos 60, Different Class também é influenciado pela disco dos anos 70. A canção que mais se destaca nisso é justamente “Disco 2000”, em que somos apresentados a Deborah, a garota dos sonhos do eu-lírico, que parecia ser destinada a ele, mas pelos desencontros, eles nunca estiveram juntos. Agora, a única esperança é encontrá-la no bug do milênio, em que tudo pode acontecer.
Após 30 anos destas histórias, é impressionante como Different Class permanece fascinante! A cada faixa, o álbum vai se revelando ainda mais profundo, mesmo retratando as vidas mais mundanas e os sentimentos mais comuns.
Mas é justamente aí que está a genialidade da banda: sua habilidade em fazer poesia de maneira simples, sobre um mundo simples, mas com a sagacidade de trabalhar o humor, as funções de linguagem e um instrumental harmônico — além de contar com um vocalista e visuais muito originais. Tudo isso contribuiu para que Different Class se tornasse um dos melhores álbuns não apenas do Pulp ou do britpop em si, mas do rock em geral.