Crítica | Charlie’s Angels prova que a terceira geração de Angels é cômica, badass e atual

Apesar de opiniões negativas e um grande boicote, o filme consegue apresentar uma nova versão promissora de As Panteras

Esse texto contém spoilers do filme.

Não dá pra negar a comparação quase que automática com a segunda geração de Angels que foi As Panteras (2000) e As Panteras Detonando (2003). Drew Barrymore, Cameron Diaz e Lucy Liu se tornaram atrizes incríveis e seus papéis como Angels para sempre serão lembrados. Por mais que a versão dos anos 2000 que marcou uma geração inteira de fãs tenha permanecido quase que fiel ao show dos anos 70 à 80, em sua maioria como direção de arte, trilha sonora e muitos diálogos hoje icônicos, essa terceira geração trouxe novos e modernos rumos para novas e modernas Angels.

Charlie’s Angels: Full Throttle (2003)

Contudo, é inevitável não assistir o filme com baixíssimas expectativas depois de um bom tempo analisando reações negativas sobre atuação, abordagem e até mesmo de trilha sonora (que ganhou um disco inteiro com curadoria musical de Ariana Grande). Muitas críticas vieram sobre escolhas de papel, montagem e edição, abordagem e até (pasmem) o alto teor de empoderamento feminino. Achei que esse era o grande objetivo de As Panteras, mostrar que as mulheres podem tudo.

Desde o início de tudo, começando pelo anúncio de casting das atrizes principais, álbum com músicas pop até então sem muita relação com o gênero do filme e inúmeras promoções mal feitas até o lançamento, foram criando a impressão negativa que se alastrou pela estreia e baixa receptividade do grande público. O grande desafio do filme foi lutar contra a barreira nostálgica criada pelas versões anteriores e se desligar da imagem extremamente fantasiosa que o tema nos foi apresentando. Aqui, o intuito é nos aproximar mais ‘da realidade’ sem muitos efeitos especiais trash, com uma mensagem feminista super objetiva e cativante.

Elizabeth Banks é um gênio, isso todo mundo já sabe. Mas aqui ela fez ótimas escolhas, à começar por dirigir e atuar, escalar um time de roteiristas femininas pra compor a visão dela dessa franquia, e claro, escolher três protagonistas badasses com rostos já conhecidos como Kristen Stewart, Ella Balinska e Naomi Scott. Sim, Kristen Stewart de Crepúsculo. Sim, todo mundo criticou a escolha. Sim, ela surpreendeu muito no papel.

Caso você ainda não tenha visto, aqui vai uma contextualização do enredo: Sabina (Stewart) e Jane (Balinska) precisam deixar suas diferenças de lado para resolver um problemão de energia que pode afetar drasticamente a humanidade. No meio dessa união e da nova Bosley (Banks), se juntam à Elena (Scott), uma menina cientista aparentemente comum que precisa meio que se tornar uma Angel pra não acabar como alvo dos bandidões.

Reprodução SONY

Kristen Stewart, apesar de a toda polêmica envolvida na escalação do papel, fez uma diferença perceptível aqui. Todo mundo tem uma imagem sem sal dela desde Crepúsculo com expressões faciais 99% iguais, mas aqui, Banks resolveu se apoderar disso, da cara de deboche dela, aquele charme tímido e características autênticas, criando uma personagem engraçada, totalmente insana e disposta à tudo pelas companheiras. Esse alívio cômico misturado com a atitude badass adicionou bastante na trama e encaixou certinho, do início ao fim.

Naomi Scott deu tudo de si na atrapalhada Elena. Eu realmente consegui me sentir na pele dela caindo de paraquedas numa missão cheia de plot twists, ainda sim esbanjando carisma e simpatia. E o alívio cômico não ficou só com Stewart não, Naomi entregou bons momentos de risada. A cena em que ela utiliza as ‘balinhas de sonífero’ de maneira errada e acaba se auto aplicando, foi engraçadíssima. Ao final acompanhamos o tímido crescimento da personagem quando ela é recrutada para ser uma Angel. Definitivamente assistiria uma sequência pra ver seu desenvolvimento.

Ella Balinska conseguiu me fazer ter repulsa por Jane, personagem fria e arrogante, desde o início e depois chorar pela identificação tardia ao longo da trama, percebendo o porquê de ser tão fechada, por ter medo de perder mais pessoas que ama. Ela optou por fazer a maioria de suas cenas de ação sem uso de dublê, o que torna sua atuação ainda mais incrível.

O vilão água com açúcar pode ter sido um grande fator decisivo na hora de aceitar o filme.

Um dos plots principais, apesar de muito bom, não convenceu tanto com Jonathan “John” Bosley (Patrick Stewart) que também participou da versão original das Panteras. Apesar da ligação temporal, todo o enredo envolvendo o antagonista deixou a desenvoltura fraca e um pouco desconexa. Um vilão que busca vingança porque foi aposentado? Ainda mais com a participação do assassino sem sal Hodak (Jonathan Tucker) que teve o fim que mereceu.

Participações gigantes

A trilha sonora que dividiu opiniões ficou por conta da curadoria de Ariana Grande que escalou diversas amigas para compor o disco feito sob medida pro filme. Temos diversas surpresas como Kim Petras, Normani, Nicki Minaj, Kash Doll, ALMA, uma música em português da Anitta, e claro, o trio que quase fez meio mundo do pop falecer, Ariana Grande Miley Cyrus e Lana Del Rey, que acabaram lançando o clipe de ‘Don’t Call Me Angel’ para promover o longa.

O disco ficou incrível. O uso dele no filme não. Senti uma desconexão com o que estava assistindo e ouvindo. Sabe aquela sensação de ouvir uma trilha que combine perfeitamente com o momento, que cresça com a cena, que te envolva à ponto de nem perceber que ela existe, de tão encaixada que ficou?

Uma cena de ação e lutas com uma música pop alegre não caiu muito bem. Essa conexão ficou de lado na maioria dos momentos em que apareceu música no filme. A alternativa aqui seria: um disco de trilha sonora feito especialmente para compor a cena e criar o mood, e um promocional, que é o caso do disco feito por Ariana. Esse método tem sido bastante aplicado em filmes como Pantera Negra e Rei Leão, recentemente, e cairia como uma luva.

Nos final do filme temos diversas cenas pós-credito com participações incríveis como Laverne Cox (Orange Is The New Black), Hailee Steinfeld (Dickinson), Lili Reinhart (Riverdale), a lutadora Ronda Rousey (Velozes & Furiosos 7), a ginasta Aly Raisman, a snowboarder Chloe Kim e a piloto Danica Patrick. Todas já confirmadas nos materiais de promoção do filme. Pareceu desespero para atrair mais público? Pareceu. Mas ficaram engraçadíssimas. Com certeza adoraria ver mais cenas assim em uma sequência (adoro uma participação especial – menos do Noah Centíneo).

Pontos baixos

É um filme dinâmico, com muitas cenas de luta e ação (algumas deixam à desejar), e você acaba nem percebendo o tempo passar. Para os fãs da franquia, conta com diversas referências aos títulos anteriores como os icônicos figurinos nas cenas onde aparecem os closets e as músicas nostálgicas na trilha. O roteiro deixa a desejar em diversas parte do filme, mas não incomoda à ponto de odiar tudo.

Entrando no aspecto de produção, senti muita falta de uma coloração mais acentuada na fotografia do filme, o que poderia ter ajudado e muito na digestão e receptividade. Ficou tão sutil e simples que deu impressão de não terem tido esse cuidado. mas é o que estão aplicando nos recentes lançamentos, cores mais cruas e neutras (o que particularmente eu não gosto). A direção de arte dos letterings também não ficou nada legal, deveriam ter usado a tipografia dos materiais de promoção e do título do filme, criando unidade visual. Mas fica pra próxima.

A pergunta que fica é: Charlie’s Angels (2019) é tão ruim como todos dizem?

Não. Não é incrível, mas não é ruim. Pra quem espera uma continuação de As Panteras (2000) será extremamente decepcionante, apesar das ligações nostálgicas que o novo tentou pregar competir com um clássico amado por praticamente todos é difícil. Mas pra quem está aberto à novas histórias e uma sequência promissora de novas Angels, é uma ótima opção.

Mas não se enganem, eu como fã das Angels interpretadas por Drew, Cameron e Lucy, não fiquei desapontado. Apenas aceitei que uma sequência está fora de cogitação e é melhor me acostumar com a ideia de uma nova história. Porém podiam ter feito uma aparição no filme, iam gerar um buzz absurdo sem dúvidas. Fica aí a dica para uma sequência.

Nota do autor: 78/100

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