Com um pouco mais de dez anos de carreira, FKA Twigs tem uma discografia pequena, mas é uma das poucas artistas do momento cujos trabalhos poderiam ter sido lançados há meses, cinco anos ou daqui a duas décadas, e ainda assim soariam como se tivessem saído hoje. Antes denominada e limitada ao R&B experimental, agora é impossível categorizar o que é feito musicalmente, devido a uma visão artística tão única e sem limites, provando que tudo pode ser feito da forma desejada, e qualquer tipo de som produzido sempre irá soar como algo perpétuo.
Em 2014, quando o primeiro disco, intitulado “LP1“, foi lançado, a cantora já não era uma estranha para publicações sobre música, que já haviam aclamado o que havia sido feito em “EP1” e “EP2“, dois trabalhos curtos que vieram antes do grande estouro. Não havia muita criatividade para títulos, e isso também expressou a mudança de nome acontecida naquela época (antes chamada apenas de Twigs, mais tarde adicionando ‘FKA’ para diferenciá-la do duo The Twigs). Segundo a própria cantora, o novo nome era apenas letras maiúsculas fortes, e nada mais. Esse tipo de pensamento simplório pode explicar um pouco como funciona sua cabeça, mesmo criando obras colossais em criatividade, som e visuais.
FKA Twigs tem direções bem concretas na forma como enxerga o próprio trabalho. “LP1” se apresenta como um projeto sensual, mas há um pouco de solidão no olhar de Twigs para a sensualidade exposta… Em “Pendulum“, o sentimento de se sentir sozinha mesmo estando acompanhada é explícito, enquanto em “Kicks” é percebido que estar sozinha não é o fim do mundo, e apenas a própria companhia já é o bastante para alcançar uma satisfação pessoal.
Sonoramente, um projeto que liga de Sampha a Arca, passando por Emile Haynie a Paul Epworth, foi concebido como se todos esses produtores fossem um só. Sua voz e direção para como cada música teria que ser concebida foram bem entendidas, e o resultado são dez faixas diferentes uma da outra e, ao mesmo tempo, fazendo com que o ouvinte perceba que cada momento é um artefato imprescindível para a obra completa.
Em vários momentos do disco, uma sensação de desconexão entre voz e música é percebida, parecendo uma batalha, uma resistência musical que é derrotada quando encontra os sons emitidos pela boca de Twigs. Um canto de sereia é apresentado com apenas um objetivo: fazer com que o som dance de forma submissa a ela. O hipnotismo da cantora não é só vocal, mas também visual… Seja pela capa do disco, em um trabalho fenomenal executado pelo multiartista Jesse Kanda, ou através de vídeo.
“Two Weeks” é um exemplo de como alguém pode fazer o espectador se sentir tão intrigado quanto fascinado por alguém apenas performando movimentos. A direção de Nabil Elderkin, que já trabalhou com grandes nomes como Frank Ocean, Kanye West e The Weeknd, ainda é considerada um dos momentos mais belos da discografia dela. Anos depois, a cantora ainda seria surpreendente novamente, tanto na sua parceria com Andrew Thomas Huang para a música “Cellophane”, quanto para o vídeo de “sad day”, dirigido por Hiro Murai.
Hoje, dez anos após o lançamento de “LP1”, uma carreira estável foi seguida por FKA Twigs, em momentos tendo que lidar com problemas pessoais graves enquanto sua musicalidade florescia cada vez mais. Dor foi causada por relacionamentos passados, mas a aclamação sempre presente sobre cada trabalho continuou firme e forte. Uma trilogia de EPs foi completada com “M3LL155X”, sons mais agitados foram experimentados na mixtape “Caprisongs”, e a forma única e peculiar de se apresentar foi levada ainda mais além com o fantástico segundo álbum “Magdalene”.
A elasticidade que é praticada por Twigs tanto musical, quanto vocal (e até literal em suas coreografias) foi um dos pontos que marcaram seu debut e significam tanto para quem a acompanha. Mesmo que o público saiba que a vida pessoal da cantora gerou momentos traumáticos e feridas que ainda não fecharam, sua resiliência e poder de transformação quando está no palco são momentos de felicidade.
FKA Twigs é uma artista que pode não ter um alcance tão grande para a geração atual, mas ela é do tipo que será lembrada por décadas e ainda tem chances de ser vista como incompreendida, justamente por ter uma arte tão única. Em vez de apenas se render a subgêneros, subgêneros próprios foram criados por ela e apenas para ela, fazendo com que a artista e seu “LP1” se tornassem algo inigualável, raro, atemporal e um marco na música contemporânea mundial.