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Katy Perry insere o ‘143’ à sombra de seus grandes feitos

Nas entrelinhas, o “143” é sobre o amor. Em essência, é sobre a falta.

Nada faz muito sentido no que Katy Perry externaliza com suas pretensões no “143”. Seu sexto álbum chega em um momento que a indústria precisaria vê-la definitivamente com novos olhos. Afinal, muito da música atual gira constantemente para o que ela não deveria ter feito com o projeto. A proposta era simples: resgatar onde ela já esteve e, “às sombras de seus grandes feitos”, tentar, com um péssimo leque de escolhas, atingir de novo o holofote que nunca deveria ter saído.

O objetivo era trazer uma nostalgia renovada, revivendo a emoção das músicas marcantes de sua carreira. Essa era a proposta. No entanto, o que chega aos ouvidos do público é algo extremamente pobre, resultando, no final, em uma reflexão (ou não, depende de você) um tanto problemática sobre intenção e, principalmente, reinvenção.

Na execução, a solução para tudo isso pareceu apenas uma: entrar no estúdio após anos, deixar qualquer desespero criativo (por números ou o que seja) assumir o controle e criar uma variação de peças envoltas de melodias desinteressantes, grooves utilitários e desempenhos vocais que não ditam nada.

Ao longo das 11 faixas, há divisores de água desconfortáveis de se enfrentar. Esse projeto pode ser visto tanto como o ponto mais baixo da carreira de Katy quanto como um exemplo do que um artista jamais deve fazer ou sequer considerar.

Acima de tudo, “143” tenta expressar a necessidade de reinvenção. E é justamente nesse ponto que reside tanto a empolgação e a ambição quanto o erro, ao tentar fazer tudo valer a pena. No entanto, o que se perde é a atenção necessária para compreender que estar completamente envolvido na produção é vital — essa é a maior falha da obra. Em um cenário onde a coesão de um álbum depende da falta de cuidado com os detalhes, o oco disco acerta em cheio em sua proposta.

Absolutamente nenhuma montagem musical em momento algum pode ter apenas um único sentimento e linha de ritmo, parece que o registro inteiro daria um pedaço de uma só música de 6 minutos caso abracasse com apetite o ritmo dance. Nesse cenário, faixas como “GORGEOUS” e “NIRVANA” teriam força ainda maior e o estilo non-stop ganharia um notório espaço dentre álbuns que vimos isso recentemente. 

Todo projeto musical, especialmente no contexto que estamos discutindo, precisa se sustentar em vários pilares. Os mais básicos são: vocais, tonalidades, coesão e composição. Não é necessário que seja experimental ou conceitual, mas deve, sim, ter ousadia. Não precisa ser excessivamente complexo, mas deve trazer, ao menos, um toque de inovação. O segredo é se apoiar nas suas próprias lacunas e transformar elas em pontos de força.

Mesmo os ouvintes mais leigos conseguem perceber que toda a pulsação e estética de “143” revelam uma produção cheia de reciclagens estranhíssimas. Cada faixa parece algo já ouvido antes, com várias músicas começando pelo refrão e se repetindo ao longo do caminho, abusando do percurso com abuso de efeitos. Os redundantes frenesis das canções chegam a ser absurdos para uma artista como Katy, que tem momentos como “Walking On Air” na discografia.

A sensação que fica é que faltou coragem de se arriscar, saindo do espaço de conforto e intuito de “apenas se divertir” ao som de batidas genéricas — como se isso fosse apenas o real e a única necessidade. Aqui, infelizmente, todos esses pontos negativos são executados com grande força, resultando em algo negativamente datado. Katy parece errar a chance de atenuar um projeto em seu tempo de carreira, momento esse que é crucial para uma artista tão reverberativa, junto da oportunidade de se destacar em um ano repleto de novos e brilhantes artistas e projetos com um disco mergulhado no dance (estilo incrível e gigante).

O sucesso de recentes faixas como “Espresso” — essa carrega muito daquele tom lírico divertido de Katy —, de Sabrina Carpenter, e “Good Luck, Babe!”, de Chappel Roan, e a pista dance muito bem feita da veterana Ariana Grande com “yes, and?”, prova que o mundo hoje gira um pouco sim em volta do que ela costumava colocar em prática em seus tempos gloriosos, mas com a condição mínima daquela peculiaridade que atrai e faz o ouvinte se deslocar de tudo e apenas curtir.

Com tantas opções refrescantes que se reinventam usando a própria Katy como inspiração, é essencial entender que o mundo da música é dinâmico e em constante mutação. Não é possível recuperar o brilho sem antes compreender — ou ao menos tentar — o que significa se transformar continuamente naquilo que não vem sendo feito.

Com o efeito imediatista de redes sociais a parte, por que pensar que passaríamos a gostar de músicas feitas com pouquíssimos sentimentos? Sem demérito algum, mas onde está a intenção, cuidado e atenção? Se isso passa despercebido, o caos negativo ocasiona em uma tarefa e não num projeto verdadeiro e repleto de amor.

Talvez, por um momento, não devêssemos considerar peças como o “143” algo grandioso e bom o suficiente para o que uma legião de fãs verdadeiramente merece.

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