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Crítica | Malcolm e Marie se desfaz em diálogos densos e um poço com fundo

O longa original Netflix chegou essa sexta-feira (05) no catálogo e mostra um casal discutindo sobre a sua profunda relação, ou o cair dela.

Condensar toda a narrativa de “Malcolm & Marie” em poucas palavras não é tão complicado. Temos um casal (Zendaya e John Denzel Washington) discutindo nas entrelinhas se eles ainda funcionam como um duo. E fica claro que se funcionam ali em conjunto, isso acontece por apenas um deles ter se entregue o suficiente.

O começo surge quase como um presságio considerando o que está prestes a ser esboçado nos primeiros minutos. Eles chegam da super positiva estreia do longa do Malcolm, e Marie decide ir preparar macarrão, um ato simbólico explícito mais adiante. Vemos todo o decorrer dessa sequência do lado de fora, onde um dos momentos mostra os dois separados apenas pelas janelas. Indiciando ambuiguidades, indiciando que quem vê a situação de fora, não tem todos os sórdidos detalhes.

Palavras e densidade

É instigante ver o que o casal tem pra falar um pro outro, se não houver o cordial julgamento do que nos está sendo apresentado, fator impossível e crucial. Impossível, pois ambos Malcolm e Marie possuem muitas coisas a serem destiladas um para o outro, há sufocação, há palavras que não devem ser mencionadas, há ainda desejo, e talvez medo. Crucial, para desenhar a narrativa e clarear sentimentos profundos sobre como o amor pode ser amargo as vezes. Ponto extremamente positivo para o longa por concentrar essa fórmula de uma maneira densa e exemplar, artifício infelizmente esse que não perdura até o fim, mas que de alguma maneira procura se manter na correnteza.

Quando somos conduzidos à uma nova discussão, a coisa flui e não parece nada artificial, devido as atuações escandalosas, certeiras, cirúrgicas e quase irreais de Zendaya e John David Washington. Não há como os problemas daqueles dois simplesmente sumirem em poucos 30 minutos de um desenrolar de novelo de linhas e toda (ou um pouco) a faísca retornar com um bom momento vívido, alegre e que prepara um futuro positivo e mágico – se for considerar todos os delicados fatos apresentados.

Levantar essas estatísticas sobre o filme só proclama o quanto ele possui uma escrita inteligente e que não negligencia tanto o que Malcolm tem para falar e o quanto Marie tem para colocar na mesa e mostrar-se ciente o tempo todo sobre o quanto o relacionamento beira o mais profundo colapso. Mas não teria como sustentar as quase duas horas (completamente desnecessárias) com alguma outra coisa que não fossem diálogos entre o casal, todavia, talvez não fosse necessário estender até deixar ainda mais escancarado que de fato desde o começo do filme, o Malcolm nada mais é do que uma pessoa egoísta, que ama o amor que Marie tem por ele. Se a intenção era alongar até chegar em um ponto entediante, bom, o feito é alcançado mais adiante, precisamente, depois da metade.

E cabe ao casal salvar o que o filme já não exprime do seu melhor lado no caminho para o final. Zendaya brilha desde o começo, em mostrar uma personagem que sabe desde os primeiros minutos que não está contente, e que possui as respostas na ponta da língua. Dá pra sentir uma euforia imensa que a atriz exala com o papel. É ela em seu auge e a melhor coisa da produção. John Denzel Washington segue e complementa muito bem, mas se entrega sozinho também em certos momentos ao conseguir espalhar e ampliar com destreza um personagem que praticamente vive em um mundo lúdico e só seu. Ambos detalham traços imcompreensíveis e que salvam toda a obra.

Poço com fundo

Os fundamentos tomam uma outra proporção. Espinhos saltam para todos os lados, o corte parece chegar ao fim e o que era antes uma discussão até “rasa”, agora se enche como um copo prestes a cair e causar um estrago maior. Essa potência em ressaltar as reais necessidades das brigas são muito bem arranjadas pela atuação de ambos e o caminhar técnico do longa – o preto e branco torna toda a coisa agradável de se ver, ainda mais por desbravar uma estética linda ao lado da direção envolvente quanto aos protagonistas e o conjunto técnico do local.

Mas, esse conceito de poço com fundo surge pois o filme se entrelaça tanto em seus diálogos que as vezes não suprime tanto quando deveria. Não há dúvidas, os diálogos fácilmente contemplados pela dupla protagonista quase de maneira sobrenatural, realça e cria vida para todas linhas, porém, chega um ponto em que essas mesmas conversas já não erradiam a melhor característica do filme. Não é porque ele não tenta, mas sim porque fica tudo um pouco sem foco, quase que pairando no ar sem saber para onde seguir. Por isso, um poço com fundo. Sem o objetivo de entregar mais nada.

E atingido esse objetivo, “Malcolm & Marie” acaba por entregar uma história com muitos impedimentos, que não se desenvolvem bem pelo mundano erro de tentar contar mais do que deveria.

É visível que 20 ou 30 minutos a menos fariam muito bem, já que teríamos uma carga digna de despertar no telespectador as mais severas discussões quanto ao amor para com o próximo e as escolhas que tomamos sem pensar no outro. Mas tudo é feito com o objetivo de apenas de contar, e de não nos fazer destrinchar pedaço por pedaço.

Assista “Malcolm & Marie” na Netflix.

Nota do autor: 60/100

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