Crítica | 5 anos do “Honeymoon” da Lana Del Rey

Honeymoon é aquilo que Lana Del Rey gostaria de dar para alguém que já tem de tudo.

Mesmo que já faça tanto tempo, ainda é fácil lembrar quando Lana Del Rey estourou… a estética noir caseira somada a um vocal que parecia sair sem esforço algum e uma beleza tão única, montavam uma aura de atração sobre quem era aquela mulher cantando “Video Games“.

Lana Del Rey, “Honeymoon” (2015) por Neil Krug

Depois dos comentários sobre seus lábios serem esquecidos, ainda sobrava muito do que se falar sobre, e a chegada com o álbum ‘Born To Die’ a colocou em um status que ela mantém até hoje; o de uma cantora única, inesperada e por algumas vezes profunda. Tal profundidade ainda gera dúvidas, já que nunca entendemos completamente se Lana sabe muito bem nos enganar a respeito de como apresenta sua persona, ou se ela é realmente uma pessoa que funciona justamente pela sua demasia.

Uma das suas maiores provas disso completa cinco anos em 2020, Honeymoon é seu quarto álbum de estúdio e também seu maior pecado, justamente por tentar elevar o grau de ‘divindade’ que seus fãs tendem a colocar na artista. Em um trabalho que aparenta ter sido feito sobre uma premissa de algo até descompromissado, ele já soa extremamente sofisticado logo a partir da faixa de abertura. Mas infelizmente, não de uma forma que exale um aprimoramento do álbum anterior (‘Ultraviolence’, de 2014).

Uma das maiores características da cantora é sua personalidade tão blasé, o que pode ser sua vitória mais significativa como uma mulher tão famosa; conseguir despertar simpatia mesmo aparentando ser uma pessoa que não simpatiza com coisa alguma. Lana Del Rey chegou a um patamar que poucos músicos chegam mas que muitos veneram: ela é famosa, mas não tanto a ponto de não conseguir viver sua vida, mas também não é uma desconhecida de uma maneira que ninguém se importe tanto com suas palavras. Pelo contrário, seus comentários já despertaram muitas polêmicas, mas nunca nada o bastante que pareça abalar sua estrutura com aqueles que gostam tanto do seu jeito incomum.

honeymoon sofre com a falta de harmonia devido ao emaranhado de ideias não filtradas.

Usar a palavra ‘desnecessário’ para definir um trabalho de arte é algo complicado, tendo o mínimo de empatia já é possível imaginar o quanto um projeto leva tanto tempo e pessoas para ser feito, mas diante de um disco que parece não ser algo que precisamos, resta um embate cerebral para tentar driblar uma definição que faria tanto sentido. Aproveitar Honeymoon do começo ao fim é um fardo, e caso o ouvinte decidir fazer isso pela ordem imposta na tracklist, a experiência poder ser como batalhar contra uma arma sônica.

As quatro primeiras canções soam como trombetas do apocalipse preparando para que o arrebatamento aconteça em um surto de narcolepsia. Apenas sua duração poderia ser quase um álbum inteiro de música pop nos dias de hoje, e a culpa disso é a obsessão da artista em tentar vender suas (já ótimas) habilidades de compositora como grandes poemas revolucionários. O que resta para que ela entenda é que seu público não precisa de uma pomposidade em suas letras, e perceber que seu maior erro é justamente tentar caprichar o já caprichado.

Lana Del Rey, “Honeymoon” (2015) por Neil Krug

Durante todos seus sessenta e cinco minutos só existe um momento em que somos sacudidos de uma sensação de drenagem mental, a sequência com ‘High By The Beach’, ‘Freak’ e ‘Art Deco’ é a melhor coisa daqui e até um dos maiores acertos de toda sua discografia. As três não combinam em nada, mas ao mesmo tempo servem como um tom de ligação que funciona contra quem poderia estar lutando com um estado de sonolência. A primeira citada é uma das melhores músicas da carreira da cantora, e mesmo que não se porte como algo tão inovador, ela oferece uma Lana que é aquela que fez as pessoas se apaixonarem durante seu início como possível super estrela.

Ainda restou gás para adicionar um cover de Nina Simone com ‘Don’t Let Me Be Misunderstood’, interpolações de ‘Space Oddity’ de David Bowie em ‘Terrence Loves You’ e um clima poético… que surge literalmente com ‘Burnt Norton’, uma leitura de uma das obras de T.S. Eliot. Tudo apresentado como um emaranhado de ideias que não foram filtradas da melhor forma, fazendo com que o álbum sofra com uma falta de harmonia. Os produtores responsáveis pelas faixas são Rick Nowels e Kieron Menzies, que parecem não servir para trazer coesão e sim apenas tentar impor um pouco de identidade.

a personalidade de lana del rey sempre apresentou sua complexidade, mas algumas vezes transparece muitos excessos.

Lana Del Rey é complexa, o que é ótimo pois sempre desperta curiosidade a respeito de como ela cria e trabalha… E a beleza disso tudo está justamente nesse mistério. Mas se já da para perceber o quanto ela é boa, então não é preciso que ela force um pedestal de criadora grandiosa. Mesmo que sua estética tenha sido criada como que baseada em hashtags de um tumblr adolescente, em alguns momentos ela consegue fugir deste estigma e se provar como algo acima da média. Mas a inconsistência faz com que em outros momentos acabe se saindo até pior, transparecendo apenas chatice e insolência.

Para quem já a acompanha não é surpresa que esse tropeço tenha acontecido em algum momento, já que todos os seus trabalhos parecem flertar com um linha tênue entre apenas contar os contos de uma mulher difícil contra um caminho que grita o pedantismo. Honeymoon é aquilo que a cantora gostaria de dar para alguém que já tem tudo, é seu excesso que faz dele seu álbum mais cansativo. Assim como também pode ser o que ela tenha tido as maiores inspirações para como realmente se vê como artista, o problema é que sua personalidade pretensiosa falou muito mais alto que seu som.

Nota do autor: 57/100

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