Crítica | Aly and Aj, “A Touch of the Beat Gets You Up On Your Feet Gets You Out and Then Into the Sun”

Depois de uma pausa merecida na carreira, Aly and Aj voltam com um projeto perfeito para o verão

As irmãs Alyson e Amanda Michalka, ou Aly & Aj, já passaram por diversas fases na carreira. Tudo começou quando elas protagonizaram Belas e Mimadas, um dos primeiros filmes do Disney Channel. Após o sucesso da época, assinaram com a Hollywood Records e lançaram 2 discos, Into the Rush (2005) e Insomniac (2007). Na época, as duas, guiadas pela gravadora teen, criavam sucessos prontos com batidas genéricas e que as acompanharam por alguns anos, até que resolveram se desligar do contrato e seguir carreira solo. Não deu muito certo e entraram em um hiato de quase 11 anos. Foi a melhor coisa que poderia ter acontecido com as duas.

A volta tímida e completamente renovada se deu com o EP Ten Years de 2018, um apanhado de canções synthpop e experimentais que serviu como escalada e teste de território para as irmãs, que entregaram qualidade cada canção lançada. Entre a formação do EP, uma crise de identidade sob o pseudônimo 78Violet e o álbum desta review, alguns outros singles chegaram a tomar forma como Joan of Arc on the Dance Floor, uma das melhores músicas de 2020. Depois de 14 anos desde o último álbum, Aly & Aj estão de volta com e se mostram completamente dispostas a se encarar verdadeiramente como artistas.

Mergulhado em referências de rock dos anos 60 e 70, o álbum A Touch of the Beat Gets You Up On Your Feet Gets You Out and Then Into the Sun traz uma verdadeira onda sonora atemporal com registros vorazes e versões maduras das artistas que buscam entregar algo puro e extremamente pessoal. Gravado no icônico estúdio Sunset Sound – onde lendas como Led Zeppelin e The Beatles já passaram -, o disco foi inteiramente construído em som estéreo, com todos os instrumentos captados ao mesmo tempo na gravação, trazendo ainda mais identidade à sua sonoridade.

De cara, a primeira a ser escrita do álbum, Pretty Places, mostra o porquê de ser a favorita das duas e abre o disco como um ótimo manifesto. Com batidas calmas e uma vibe quase que country, a música te introduz ao novo espectro sonoro que querem propor daqui em diante. Entoando um sentimento de companheirismo, seja ele amoroso ou familiar, a letra navega entre nostalgias passadas e o apego indeciso do futuro “all I need is you, I’ll go anywhere, all we got is us now”.

Mesmo que A Touch of the Beat (vamos simplificar?) se venda como um álbum vanguardista, algumas faixas se sobrepõem a esta estética, o que não é algo negativo. Lost Cause aposta num synthpop característico e ganha o apoio de um baixo onipresente na faixa, tornando-a marcante e uma das baladas coringas do disco. Em seguida, Break Yourself vem para trazer um ar refrescante que com certeza tem mais a adicionar do que deixar dúvidas.

Slow Dancing causa um sentimentalismo involuntário muito grande. É meio nostálgica, mesmo sem sabermos exatamente o porquê. Aly disse em um artigo para a Bustle que foi uma das últimas a serem finalizadas e que demorou a gostar, mas que foi crescendo nela até hoje, se tornando uma de suas favoritas. Aj disse que o clipe foi o favorito de ser filmado. Paradise, logo depois, chega para retomar a agitação do álbum e entrega uma balada rústica para falar sobre um ponto de partida de um amor que se foi.

Paradise e Sympthom of Your Touch parecem se complementar, o que torna o meio do disco satisfatório e suave. Já Lucky To Get Him parece um hino aos afortunados de amor. Na canção, Aj fala sobre o que significa sorte ao descrever que encontrou um verdadeiro amor. Uma produção arriscada mas com um grande acerto, a sonoridade aqui se desfaz do comum e entra em um novo patamar. De longe uma das melhores do álbum.

Listen!!!, lançada como segundo single do projeto, é uma ode ao comodismo que muitos se encontram. Hoje em dia é tudo tão automático, que acabamos passando por cima de emoções verdadeiras e esquecemos do que significa realmente escutar o outro, entender o outro, ajudar o outro. Don’t Need Nothing se destaca facilmente na trackslist por dois motivos: primeiro, é do refrão dessa música que o o título do álbum – a touch of the beat gets you up on your feet gets you out and then into the sun – foi retirado, traduzindo perfeitamente o mood geral do projeto, e é a melhor canção do álbum. Segundo, a produção, performance, e melodia incríveis, tudo se encaixa no eixo principal que é tornar o projeto algo líricamente único, mesmo que beba de fontes já conhecidas.

O trio que fecha o album não poderia ter sido diferente. Stomach resgata a balada que o álbum apresentou no início e dá indícios de que chegou ao fim, completando um ciclo. Personal Cathedrals se destaca não só pela produção, mas por se tratar de uma composição melancólica e íntima de Aj (com ajuda de Aly). Hold Out traz um tom agridoce ao encerramento de A Touch of the Beat e consegue refletir sobre as 12 longas faixas.

A produção de Yves Rothman (Conan Grey, Banoffee) é uma das coisas mais intrigantes do disco. Mesmo que a identidade sonora seja fiel às raízes das irmãs Michalka, é perceptível o toque de vanguarda que Yves consegue acrescentar em cada uma das faixas, algumas mais modernas que as outras, mas todas seguindo a linha sonora dos anos 50 e 60.

Aly a Aj rodeiam, dentre algumas variantes, o mesmo assunto. Os últimos meses foram de muita garra e esperança. Uma situação completamente atípica e que assola o mundo inteiro. Criar enquanto convive com uma ocasião pandêmica como a que vivemos é no mínimo admirável. Aly comentou em uma entrevista para a Rolling Stones que A Touch of the Beat se trata de um processo de descarregar coisas de dentro de si para que assim isso de alguma maneira encontre seu caminho até outras pessoas e assim faça seu papel de cura através da arte. E é disso que se trata. É um álbum que abraça com uma certa similaridade de positividade, perfeito pra te acompanhar em diversos momentos da vida.

A Touch of The Beat chega como um arrebatamento na imagem de “jovens da Disney” e prova que o talento sempre esteve tímido perto do que as duas gostariam de entregar em suas carreiras. Após uma pausa demorada, mas muito benfeitora para as irmãs, Aly e Aj se destacam em 2021 com um dos melhores projetos entregues no ano.

O disco, sonoramente falando, soa como uma obra atemporal e um registro de viagem de verão. É algo único, com nuances sendo descobertas a cada ouvida, surfando na contra mão do mainstream e se preocupando unicamente com a experiência de quem escuta. Aly e Aj querem entregar algo único e sentimental, pessoal, que deslize fluidamente a cada faixa – e foi exatamente isso que elas apresentaram.

Nota: 96/100

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