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Crítica | MØ, “Motordrome”

Feito com um equilíbrio que resgata momentos definitivos de sua estética sonora, novo álbum da MØ é como religar um motor e sair para diversão

Relembrar dos tempos em que escutar “Final Song”, “Kamikaze” ou “Drum” era como um tipo de terapia que acende chamas nostálgicas – para quem vos escreve é claro, se funcionava para você, compartilhamos da mesma sensação incrível. O interior dessas canções da são marcantes e hoje essa sinestesia é contínua. Infelizmente, as três músicas não chegaram a fazer parte de alguma tracklist dela, mas vale lembrar dos seus maiores tempos de ouro. 

Deixando o passado para trás e discutindo a pista de agora, “Motordrome“, quarto e completo projeto de estúdio da dinamarquesa, que chegou aos nossos ouvidos sexta-feira passada, 28, é como um carinho nas articulações daqueles que a acompanham desde os primórdios. Já vale o aviso: esse é mais uma das obras de Karen que se condensa muito positivamente. 

É decisivo captar que o novo álbum funciona através do superaqurcimento de um calor interno e próprio que exala a transformação da pele sonora que MØ assume agora. É como conectar estradas, religar motores antigos e usar o que funcionou tempos atrás para reverberar em um tipo de som que apresenta as mutações que todo artista possui com o passar dos anos. “Punches“, que encerra o disco, reflete essas questões e é engrenada diretamente através das camadas mais impenetráveis do seu primeiro trabalho. A guitarra lembra a atmosfera desprendida da cantora-compositora, mas as vertentes sonoras do atual momento se mostram maleável da mesma maneira; ponto técnico muito bem apertado para dar resultado no que é uma das melhores faixas. 

“You say: Love, where do we go from here? / I say: I, I don’t know / Just hold me closer to your hip bones”, verso de “Hip Bones“, exalta através de um usual grito de um jovem próximo ao precipício do amor uma canção estilosa sobre amar e entender traumas, é de longe o ponto mais alto de toda essa jornada. Quem também deve aparecer no pódio é “New Moon“, que longe dos únicos segundos que ousa trazer uma pausa, soa indescritívelmente dançante e dona de uma nuance feroz. 

MØ domina esse contexto de ligar caminhos como uma estrela cantando em um globo da morte (todo o cenário do motociclismo é vital na narrativa visual do trabalho, que em “Live to Survive“, carro chefe, mais se mostrou – essa, inclusive, vem envelhecendo muito bem), e a maioria das peças mais relevantes se encaixam mensuramente em um resultado de mais de 30 minutos. Mas mesmo que ofereça bastante qualidade, são nos momentos repetitivos que a tracklist do álbum machuca o seu calcanhar de Aquiles. Os refrões, que parecem soar o mesmo, outras vezes os batimentos das composições, ou o ritmo frenético que se mantém em uma única linha e não se permite ir além em algumas músicas, no quesito produção e compassos. Mas ainda há detritos e camadas que colocam em plano uma bela execução; caso do hino rebelde “Cool To Cry” ou “Youth is Lost“, que em seu pano de fundo traz uma construção de trama muito boa, como se em certos momentos fosse possível imaginar fantasmas gritando dizeres no rosto da protagonista da canção.

As faixas do “Motordrome” não são típicas para evocar no ouvinte arrepios ou coisas assim, mas a poesia que Karen implementa nesse novo registro, seja pela sua usual sonoridade e adereços nostalgicos lá do “No Mythologies To Follow”, ou pelo abraço ao rock (que é leve, mas insamente delicioso), mostram uma artista imponente alá seus princípios e sensações que quer entregar para seus fãs. Seguindo toda essa energia, temos mais uma peça incrível em sua discografia, e sim, seria interessante ver Karen indo cada vez mais fundo e usando esses aspectos que usa agora com uma intensidade maior. Enquanto isso não chega, é possível (e muito) apreciar o que temos na jornada até aqui. 

Nota do autor: 75/100

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