Ethel Cain é a personificação da solitude gótica em “Perverts”

Em uma jornada pelo seu lado mais obscuro, Ethel reforça sua paixão pelo diferente e traz o gênero drone como evidência principal em seu álbum mais experimental e poético até então

Uma fita de terror VHS com distorções, momentos de silêncio absoluto, zumbidos, frequência antiga de rádio e um medo oculto crescente em cada faixa. Estas são algumas definições para “Perverts”, segundo álbum de estúdio de Ethel Cain.

De fato, o projeto não foi criado com a intenção de trazer um grande sucesso ou um possível viral para as redes sociais. Pelo contrário, ele reflete toda a solidão e atmosfera que, desde seu primeiro EP, “Golden Age”, Ethel vem construindo ao longo do tempo com sua música. A abertura do disco, a faixa autointitulada, é um verdadeiro deleite para as próximas 1 hora e 29 minutos de duração. Ela apresenta um início cantado de uma música gospel —podendo enganar até os ouvintes mais otimistas a pensarem que sua sonoridade é similar ao “Preacher’s Daughter”— e que de forma repentina é perdida por ruídos distorcidos em uma ambientação auditiva fantasmagórica e silenciosa, que percorre toda a faixa nos seus seguintes 12 minutos de duração.

Em uma sequência harmoniosa, somos apresentados à segunda faixa do disco e seu lead single “Punish” (possivelmente a música que mais se aproxima do seu álbum anterior). Aqui, fortes ruídos contrastam com a doce voz de Cain, um misto de ânsia e angústia, que continua com “Housofpsychoticwomn”, de quase 14 minutos.

Um confronto à cultura atual da “fast music” ou música instantânea, com quase todas as faixas ultrapassando 10 minutos, nas quais algumas são apenas citações com melodias construídas para criar uma atmosfera densa e sombria para quem as ouve. A solidão permeia cada minuto do projeto. “Perverts” é a criação perfeita para Ethel se distanciar, experimentalmente, da imagem de “estrela pop dark” que estava sendo atribuída a ela. Pouco disso é uma reflexão direta de seu crescimento exponencial em popularidade nas redes sociais, como o TikTok.

O álbum apresenta uma única faixa com ritmo, “Vaccilator”, onde a bateria soa como uma banda de garagem tentando criar seu primeiro som e os vocais de Ethel como um sussurro de espíritos. “Onanist” tem uma forte aura remetendo a um sonho ou pesadelo. “Pulldrone”, com quinze minutos, traz Ethel recitando um poema que soa tão ocultista quanto uma leitura de uma história de possessão real, acompanhado por um ruído estridente e crescente. “Etienne” é um dos poucos momentos mais musicais do disco, uma canção folk com violão e piano.

O final de “Perverts” é marcado pelos sete minutos de “Thatorchia”, que começa com ruídos e evolui para um clima mais voltado para o dream-pop, e pelos quase doze minutos de “Amber Waves”, que finaliza o disco com mais uma faixa que se aproxima de seus trabalhos anteriores, mas ainda com a roupagem adequada para caber dentro da narrativa proposta, trazendo um foco no folk e no ritmo lo-fi em sua estrutura (ritmos novos explorados pela cantora).

“Perverts” é um álbum de estrutura densa e coeso do começo ao fim. De forma alguma é para qualquer um. Não é um projeto para todos os ouvintes. O trabalho —até então mais ambicioso de sua carreira— e que faz parte da trilogia que a cantora está explorando, reforça o que Ethel faz de melhor: contar histórias controversas através de músicas e proporcionar uma experiência sensorial sombria a cada projeto.

80/100

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