Não há dúvidas de que o último grande impacto do pop veio de um álbum que, à primeira vista, visualmente, não impressionava. A capa de Brat, de Charli xcx, foi criticada no anúncio justamente por seu aspecto simplista. Hoje, a tipografia de baixa qualidade e o fundo verde neon tornaram-se um conceito icônico, transformando o novo projeto da cantora em um verdadeiro evento pop mundial. E nada mais justo do que uma turnê que refletisse essa potência, marcando seu nome na história da música.
A Brat Tour percorreu o mundo com um show que não precisava de dançarinos, trocas de figurino ou efeitos mirabolantes para criar uma atmosfera dançante e arrebatadora. As apresentações eram basicamente Charli xcx e efeitos de luz — e bastavam poucos segundos para perceber que isso era mais do que suficiente.
Após o sucesso da turnê SWEAT TOUR, realizada em parceria com Troye Sivan, Charli xcx decidiu voltar aos palcos sozinha, dando continuidade a uma sequência frenética de shows. Em sua passagem por Dublin, a cantora transformou a área de Malahide Castle em uma grande festa, onde muitas das convidadas, em sua maioria garotas e mulheres — adotaram para si a frase “365 party girl”, determinando que esse seria o lema do momento. A conexão entre o verão e a palavra Brat deixou uma marca em 2024, mas engana-se quem pensa que essa associação tinha fôlego apenas para uma estação.
Charli transforma seus shows em lembretes de que seu disco não precisa mais estar ligado exclusivamente ao calor: qualquer época do ano pode e deve, carregar o espírito Brat. A representação do disco como algo festivo é ideal, e isso se torna evidente em momentos como quando a cantora desce até o público em “Von Dutch” ou quando a plateia se esgoela ao ouvir os primeiros acordes de “Girl, so confusing”. Este último momento é daqueles que fazem qualquer pessoa presente perceber o quanto mulheres se sentiram representadas pelo projeto, seja nos trechos dançantes, guiados por sintetizadores pesados, ou nos relatos sinceros de vulnerabilidade.
Em algumas entrevistas durante a promoção do álbum, Charli comentou que alcançar um pico de sucesso tantos anos após o início da carreira foi algo surpreendente. Como outras artistas da indústria, ela provou que o sucesso no pop após os 30 anos é o novo normal. Apesar de refletir uma estética de celebração, a cantora faz questão de mostrar seu lado sensível, como em “So I”, um dos momentos mais introspectivos e emocionantes do show. Um dos combustíveis da longevidade de Charli xcx é justamente sua honestidade sobre os dias em que não se sente bem. Em certo momento, a artista compartilha com a plateia que não estava se sentindo tão bem antes de subir ao palco, mas que ver o público cantando e dançando a fez se sentir melhor.
Um dos momentos mais aguardados ocorre com “Apple”, quando a onda de celulares levantados ultrapassa até aqueles que costumam esperar minutos apenas para registrar a entrada da artista no palco. Parte disso se deve ao apelo viral da faixa, mas vale lembrar que ela sempre foi uma das favoritas dos fãs. Com o foco direcionado ao álbum Brat, Charli não precisa incluir tantos hits antigos no setlist, mas é notável que, mesmo após mais de dez anos, “I Love It” ainda se mantém como uma das melhores canções de encerramento de qualquer turnê. A colaboração com o duo sueco Icona Pop, diferente de muitos hits genéricos da época, soa atemporal — e poderia, inclusive, se encaixar perfeitamente no próprio Brat.
Charli xcx fez com que o verão na música pop ganhasse um novo significado, alcançando um novo pico em sua carreira, conquistando mais fãs e realizando uma turnê de sucesso. O que a Brat Tour representou para a artista é a prova de que, independentemente de quantos álbuns alguém tenha em sua discografia, ainda é possível ampliar o público e reinventar a própria sonoridade sem perder a identidade.
Nos palcos xcx dominava apenas com sua presença, indo na contramão de propostas de superprodução. Como destaca a mensagem exibida nos telões durante o encerramento da performance: Brat não precisa durar apenas um verão. E, considerando o quão significativo esse projeto foi para a música contemporânea, torna-se fácil concordar que Brat é para sempre.