Crítica | Camila Cabello, “C,XOXO”

Camila Cabello apresenta novas facetas com “C,XOXO”, mas faz o ouvinte se perguntar se ela estava preparada para apostar em algo novo.

Camila Cabello é uma das ex-integrantes de girlband mais consagradas de todos os tempos. Mesmo que uma lista do tipo seja extensa, ainda assim seu nome estaria lá, doa a quem doer. Isso significa que seu sucesso é relativo à qualidade dos seus trabalhos? Com certeza não, até porque ela não se qualifica nem como a pessoa mais interessante musicalmente se contarmos apenas o grupo que a originou. Mas um fator que sempre fez Camila ser uma cantora reconhecida foi perceber que ela sabe fazer hits.

Havana” segue sendo uma das músicas mais legais do ano em que saiu, e joias escondidas para os que não acompanham de perto, como “Shameless” e “Psychofreak”, ainda são pontos altos de sua discografia. Mesmo vivendo em constante pressão, é válido até se surpreender com o quanto ela chegou longe e não acabou caindo no esquecimento como outras apostas de competições musicais.

Cabello sempre arruma um modo de tentar sair da bolha do pop básico que apresentou em seu primeiro disco, e agora, com seu quarto lançamento oficial, fica ainda mais claro que ir ao estúdio para gastar sua grande voz com baladas ou versos simples não é o que ela almeja. A impressão que fica é que, na cabeça dela, o talento que tem ainda é pouco, e o desejo de ir além e experimentar surge como uma forma de mostrar que sabe o que está fazendo. Em “C,XOXO”, Camila Cabello anda um pouco, tropeça, cai, se levanta, se limpa e, com um sorriso no rosto, dá três passos confiantes para frente, só para rolar um barranco quilométrico logo depois.

A ausência do que ela faz melhor é o que mais dói em seu novo trabalho. Há quem diga que “I LUV IT” tem potencial suficiente para animar, ou que “HE KNOWS” fica na cabeça como um hit… o que não é verdade. A primeira aposta para seu retorno musical não a apresentou da melhor forma possível e o resultado foi constrangedor. Mesmo assim, Camila segurou a onda e dominou as apresentações da música, principalmente quando apareceu de surpresa no set de Lana Del Rey, no Coachella deste ano. Ao vivo, tudo fica um pouco melhor, e é clara a felicidade dela com o trabalho que criou, mas um elogio aqui seria como dizer a um filho o quanto aquele desenho que deveria ser do poodle fofo da família ficou lindo, sendo que o resultado se parece mais com uma besta do apocalipse.

O principal produtor do disco é El Guincho, mais conhecido pelos trabalhos com Rosalía. A essência do parceiro continua a mesma, e isso também pode ter sido um problema, porque mesmo Camila Cabello e El Guincho tendo uma boa relação profissional, não parecem falar a mesma língua. “Chanel No.5” é o momento mais próximo de um alinhamento planetário dos dois, fazendo com que o piano leve e o romantismo nos vocais conversem de forma mágica.

Twentysomethings” e “DREAM-GIRLS” completam o trio de momentos em que Camila permanece de pé em “C,XOXO”. Ter poucos destaques em um disco com catorze músicas, onde se arrisca tanto, não é algo tão bom, mas também ajuda a pensar que a cantora mirou em vários alvos, ganhando mais pontos significativos apenas por tentar. “Camila” foi um bom começo de carreira, o segundo disco, “Romance”, seguiu em um nível decente, e “Família” é o momento mais orgânico, assim como também o mais ignorado da discografia.

C,XOXO” é disparado o projeto mais ousado e fica claro que Camila Cabello buscava algo que a fizesse ser vista por outros olhos também. Sendo justamente o momento em que houve a maior mudança em sua carreira, seria inevitável que essa era fosse acompanhada por mais pessoas. Como personalidade da mídia, seu nome está na boca das pessoas quase como quando namorava outro cantor. Mas, musicalmente falando, será que valeu a pena a direção escolhida?

Ao fim do dia, Camila Cabello soa mais focada em provar que pode ir além do arroz com feijão que sempre fez muito bem, mas apresenta um prato mal passado e perigoso para o consumidor. Às vezes, crescer musicalmente não significa apostar alto. Sabemos que uma mudança gradual e com o objetivo de aperfeiçoamento não tem tanto impacto quanto aderir a algo novo, mas, para alguns artistas, é mais seguro e interessante pisar em um terreno firme do que experimentar um caminho precário.

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