Crítica | Em Casa Com Os Gil nos faz sentir como parte da família

O novo reality nacional da Amazon Prime Video, “Em casa com os Gil”, adentra a intimidade da família de um dos grandes mestres da música brasileira de forma acolhedora

Brasil, afeto, poesia são algumas das palavras capazes de abarcar a grandiosidade da obra de Gilberto Gil. Agora imagine tudo isso reunido em um lugar. Mais especificamente, em Araras, região serrana do Rio de Janeiro, onde a família Gil se reuniu em junho de 2021 para comemorar os 79 anos do mestre Gilberto Gil.

O reality “Em casa com os Gil”, produzido pela Amazon, reúne ao redor da mesa – e de algumas câmeras – a potência de mais de 4 gerações de uma família que marcou a cultura brasileira.

Amazon Studios/Prime Vídeo (reprodução)

Não tenho medo da morte

O suposto pivô deste encontro é a turnê pela Europa, que se iniciará no dia 26 de junho. Ao longo dos episódios, acompanhamos a saga da família para decidir o repertório que será entoado ao longo dos mais de 10 países pelos quais “Nós, a gente” vai passar. A turnê foi ideia de Preta Gil, a quarta filha de Gilberto, que com sua visão empresarial, estando a frente de uma das maiores agências do país, viu uma possibilidade de unir a família e “sair cantando por aí pela Europa”, como coloca Gil. O mote garantiu ao reality momentos emocionantes, risadas e aprendizados, sempre embalados pelo vasto repertório de Gil.

Dentre eles, destaque para a fala do neto Bento, que ao perguntado sobre qual música não poderia faltar na turnê, citou a canção “Não tenho medo da morte”, surpreendendo toda a família e, especialmente, o avô com a escolha e explicação. Em coletiva de imprensa com a família Gil e os produtores do programa, Gilberto relembra o momento: “É curioso que ele, um menino de 14 para 15 anos, quando fizemos as tomadas, já era desde vários anos antes a música favorita dele, indicando a presença na alma dele dessa tensão curiosa sobre a finitude, sobre a morte, num menino de 15 anos”.

Amazon Studios/Prime Vídeo (reprodução)

Se eu quiser falar com Deus

A maior potência do formato está justamente aí. Em função da pandemia, foi necessário reformular o projeto inicialmente pensado pela Amazon. O que ninguém diria é que de um contratempo colossal, capaz de paralisar todo o mundo, sairia a grande magia da obra. O fato de acompanharmos o dia a dia daquela família diante de um cenário tão catastrófico e atípico quanto o da pandemia, gerou aproximação não só entre o público e os respectivos personagens, como entre a própria família Gil, permitindo que emergisse ali algo muito sincero e íntimo.

Bem Gil narra como um dos eventos responsáveis por essa forte carga emocional, a morte de Paulo Gustavo em função da Covid-19, que ocorreu pouco tempo antes do início das gravações. A perda, além de representativa para todo o Brasil, também abarcou um luto pessoal de Preta, grande amiga do humorista.

O sexto filho de Gil narra também as angústias da falta de perspectiva do momento: “Chegamos ali tendo uma turnê adiada por dois anos. Estávamos montando um show na esperança de viajar esse ano (2022), mas também sem nenhuma garantia né, então eu acho que tudo isso, as pessoas morrendo (…) nesse sentido, os choros, os desaguares, representam um acumulo muito grande de muita coisa.”

Amazon Studios/Prime Vídeo (reprodução)

Andar com fé

O reality conta com apenas 5 episódios, que abarcaram com maestria a narrativa. Ainda assim, deixando um gostinho de quero mais. Nesse caso, não há motivo para choro. A segunda temporada do reality já foi confirmada e virá numa pegada completamente diferente da primeira. A mudança já está enunciada no próprio nome da série, que agora se chamará “Viajando com os Gil”.

A Head de Conteúdo Original Brasileiro para o Amazon Studios, Malu Miranda, conta que se a grande potência da primeira temporada foi adentrar nesse mundo intimista e voltar os olhares para dentro, a segunda parte prometerá mais aventuras e encontros de um mundo agora em movimento. Malu garante que, apesar da naturalidade apresentada pela família no reality, “Viajando com os Gil” contará com ainda mais espontaneidade, diante de uma gama maior de possibilidades.

Amazon Studios/Prime Vídeo (reprodução)

Sereno

Quando perguntando aos 2 anos por sua mãe o que queria ser, Gil conta que apesar de não lembrar, lhe foi contado que ele afirmou querer ser “musgueiro e pai de menino”. Ele conta que a fraternidade lhe foi passada como um bem de família e que, portanto, nasceu e cresceu pronto para ser pai. Talvez por isso, seja possível observar na série a força das palavras de Gil, sempre referenciado como um mestre. Essa presença ecoa de tal forma que a relação familiar se torna magnífica diante das câmeras. A fala da host Malu Miranda contempla a potência transmitida por esse encontro: “É uma honra poder mostrar pro mundo essa família unida com esses valores tão admiráveis, é um alento para os seres humanos e brasileiros”, disse ela.

O diretor Andrucha Waddington, parceiro de longa data de Gil, destaca o diferencial da produção: “Os realitys em geral são muito tentando puxar nas tretas, picuinhas, aqui aconteceu tudo que pode acontecer dentro de um reality mas de uma maneira que o que sobressaltava era uma família que pra mim é um exemplo, que abraça a diversidade, que tem tolerância, que tem o nosso mestre”. Amigo pessoal de Gil, ele afirma: “Em casa com os Gil é uma prova de que não tem pandemia, não tem nada que pare a nossa voz”.

Amazon Studios/Prime Vídeo (reprodução)

Cérebro Eletrônico

Logo em sua primeira aparição, ao se ver rodeada pelas câmeras, Preta Gil comenta : “Estou me sentindo uma Kardashian”. Sobre a exposição ao longo dos episódios, Preta conta que a produção colaborou para que todos se sentissem muito à vontade e agissem da forma mais natural possível. As câmeras e microfones camuflados na paisagem, ajudaram a capturar a essência dos afetos e conflitos do grupo. “A série é muito fiel ao que a gente é de verdade”, conta ela.

Diante da possibilidade de serem os “Kardashians” brasileiros, Gil conta que o maior desafio foi oferecer uma jornada audiovisual que fosse interessante e palatável para o público, diante das novas realidades da imagem e da televisão.

Amazon Studios/Prime Vídeo (reprodução)

Tempo Rei

Sobre o legado musical que perpetuou na família e que pode ser observado ao longo das muitas performances realizadas pelos membros do reality, Bem conta que tudo aconteceu com muita naturalidade. “Uma coisa muito cotidiana. De respeitar a natureza de cada um e colocar ali os ingredientes necessários para que a natureza de cada um florescesse de maneira orgânica (…) Tem gente que canta, que produz, que cozinha”. Na fala de Bela Gil, esse pensamento tem sido posto em prática na criação dos filhos como um espelho da educação concedida pelo pai Gilberto.

Nesse cenário, podemos ver nascerem gigantes muitos talentos na família Gil. Flor, filha de Bela Gil, que já havia cantado em uma turnê do avô, agora vai fazer parte oficialmente da banda e esbanjou todo seu talento a longo dos episódios. A mãe conta que a iniciativa partiu da própria Flor, seguindo o princípio de dar liberdade para a criança se expressar.

Nota: 100/100

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