“The Bends” — O álbum que definiu o Radiohead

Com, provavemlmente, a capa de disco mais memorável do trabalho da banda, The Bends completa 30 anos de lançamento
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A quarta faixa do disco The Bends, da banda britânica Radiohead, conta a história de uma garota cujas posses são todas plásticas. Seu regador, sua planta chinesa, que comprou de um homem de borracha – assim como é o homem com quem mora. Seu companheiro costumava fazer cirurgias plásticas nos anos 1980, mas a gravidade sempre vence, como conta “Fake Plastic Trees”.

Lançado em 1995, The Bends faz referência à década anterior ao seu nascimento como se fosse um tempo distante. Época distante é o que nos deparamos em 2025, quando o segundo disco do Radiohead completa 30 anos de lançamento. Dessa forma, os anos 80 parecem ainda mais longínquos. No entanto, o som continua o  mesmo que o Radiohead sempre fez — isso porque The Bends é o disco que molda a banda em uma forma que se repete nos próximos trabalhos do grupo. Com suas modificações, porém sempre com uma semelhança notável.

Dois anos antes, Pablo Honey (1993) apresentou o Radiohead para o mundo com “Creep”, mas foi em 1995 que Thom Yorke e companhia estabeleceram sua identidade artística. O rock meio rouco trocou de lugar com as guitarras mais etéreas, porém a angústia permaneceu ali. Além de ser um marco essencial no rock britânico, The Bends antecipou as experimentações que a banda levaria ao extremo em OK Computer (1997) e adiante. Contudo, mesmo se tratando de uma experiência, o resultado foi bem sucedido. O laboratório ficou um pouco bagunçado, mas nenhum material estava quebrado.

The Bends

O disco se destaca por uma sonoridade grandiosa e ao mesmo tempo introspectiva. Produzido por John Leckie, que já havia trabalhado com o Pink Floyd e os Stone Roses, The Bends marca a transição do Radiohead de um grunge britânico genérico para um som mais sofisticado e emotivo (a tal dança das cadeiras mencionada anteriormente). As guitarras ainda estão presentes, mas agora dialogam com texturas mais etéreas, pianos melancólicos e a voz de Thom Yorke, que oscila entre a doçura e a explosão de desespero.

A faixa de abertura do álbum, “Planet Telex”, já entrega um Radiohead diferente. Com teclados distorcidos e uma batida pulsante, a paisagem sonora é nebulosa e remota. Em seguida, a faixa homônima ao disco traz guitarras vibrantes e um dos refrões mais explosivos da banda, evocando a claustrofobia e a alienação que permeiam todo o álbum (tanto sonora quanto liricamente).

Mas é a terceira faixa, “High and Dry”, que acabou se tornando uma das mais conhecidas do álbum. Com um tom mais acessível e melódico, a canção foi um dos singles de maior sucesso do Radiohead nos anos 90, apesar da relutância da banda em abraçá-la completamente. Em seguida, a já mencionada “Fake Plastic Trees” entrega um dos momentos mais emocionantes do disco, com Yorke derramando sua voz sobre um arranjo delicado e crescente que culmina em um clímax devastador. Essas duas faixas podem ser consideradas como alguma espécie de balada. Apesar do tom clichê e morno que essa característica pode evocar a uma primeira vista (ou escuta), elas estão longe de serem assim classificadas. 

A metade do caminho

No coração do álbum, “Bones” e “(Nice Dream)” oferecem contrastes interessantes: a primeira é intensa e radical, enquanto a segunda aposta em uma melancolia quase, novamente, onírica. Já “Just”, com seu riffzinho irresistível e mudanças de dinâmica que não estavam no script do ouvinte, é um dos momentos mais marcantes de The Bends. De fato, Radiohead buscou consolidar todo o seu virtuosismo nas canções de seu segundo disco.

O final do álbum é igualmente poderoso. “My Iron Lung”, lançada originalmente como um EP, combina agressividade e experimentação, preparando o terreno para os passos futuros do Radiohead. “Bullet Proof… I Wish I Was” desacelera o pace da corrida da escuta com — mais — um arranjo etéreo e introspectivo, enquanto “Black Star” pulsa com uma energia quase pop, que distoa completamente da tristeza da letra escrita por Yorke.

Arrumando a mesa

“Sulk” e “Street Spirit (Fade Out)” encerram o disco com maestria. A última faixa, em especial, acabou virando um dos momentos mais icônicos da discografia do Radiohead. 30 anos depois, o ouvinte sabe que a banda não parou no segundo disco. No entanto, à época, a hipnose da faixa encerrava The Bends como um adeus definitivo.

A verdade é que o grupo estava preparando a mesa para receber seus ouvintes com um banquete. Todos os trabalhos que sucederam The Bends conseguiram a devoção que receberam porque o disco lançado em 1995 arrumou a casa construída dois anos antes com Pablo Honey.

Do terceiro trabalho da banda em diante, tudo passou a ser decorativo. O alicerce estava pronto, a casa limpa e os móveis colocados no lugar. Radiohead sabia o que estava fazendo três décadas atrás — e as notícias da criação de novos trabalhos dos membros da banda colocam seus fãs em estado de ânimo, esperando por mais um trabalho de profissionais que fazem muito bem o seu dever de casa.

85/100

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