Primavera no Lollapalooza: O que esperar da nova edição, agora no Autódromo de Interlagos?

Estivemos nos dois festivais, Lollapalooza e Primavera Sound, analisamos ambos os locais e te dizemos o que esperar: de bom, de ruim e de diferente

Na última semana foi anunciado que o Primavera Sound, que teve uma primeira edição elogiada e aclamada pelo público no ano passado, agora mudaria de produtora — e de local. Antes organizado pela Live Nation e sediado no Distrito Anhembi, a edição de 2023 se torna comandada pela Time For Fun (t4f) e prevista para acontecer no Autódromo de Interlagos — casa já conhecida do Lollapalooza. Estivemos nos dois festivais, analisamos ambos os locais e te diremos o que esperar: de bom, de ruim e de diferente.

A produção

Se por um lado a t4f produz shows consagrados há anos no Brasil e comandou o Lollapalooza nos últimos 10 anos, a edição deste ano foi marcada por cancelamentos e incertezas: seis artistas cancelaram, incluindo dois dos três headliners anunciados inicialmente. A insegurança por parte dos fãs foi grande, principalmente após o cancelamento de Drake, no dia em que apresentaria seu show. Vários memes e reclamações surgiram na internet, juntamente de uma onda de reembolsos que fizeram com que o sábado de Blink-182 — também cancelado —, antes esgotado e demandando até um lote extra de ingressos, se tornasse o dia menos cheio da edição.

Crédito: Prídia Fotos / Primavera Sound São Paulo 2022

Quanto custa cancelar um show?

Decepcionados e descrentes, não foram poucas as brincadeiras e levantamentos que questionavam a “taxa de cancelamento” de um show. Após análises e entrevistas com organizadores e produtores, foi veiculado que muitos artistas sequer pagam a multa de cancelamento: apenas devolvem o cachê (ou parte dele, dependendo do investimento na apresentação).

Mas é comum?

No Primavera Sound do ano passado, quase todos os artistas do line-up se apresentaram no horário marcado, com a exceção de Gal Gosta, que faleceu quase um mês depois do anúncio do cancelamento de seu show e foi substituída por Liniker, que já estava escalada no line-up do “Primavera na Cidade” (shows extras que ocorreram em São Paulo fora do circuito do festival), e dos artistas Viagra Boys, Shellac e Anz, aproximadamente duas semanas antes dos shows. Ainda assim, a porcentagem foi pequena, principalmente entre os headliners do evento — diferente do Lollapalooza deste ano.

Infortúnios à parte, não é segredo que a Live Nation detém uma força maior na produção de shows globais, com mais artistas contratados e co-participação em grandes produtoras mundiais — incluindo a produção do Rock in Rio. Esse quase monopólio dos shows pode contribuir para que menos artistas envolvidos cancelem suas apresentações, temendo consequências de quebras de contrato e afins, e nos leva a pensar: será que o line-up do próximo Primavera, agora sob outro comando, se apresenta como prometido?

E as polêmicas?

Se no último ano o Primavera Sound fez barulho por seu line-up diverso e surpreendente, muitas piadas também foram feitas criticando as árvores do estacionamento do Anhembi — local que recebeu o principal palco do festival. Entre muitas polêmicas no Twitter, reclamações e questionamentos, a produção se encarregou de espalhar diversos telões ao longo do espaço para que todos conseguissem ver com tranquilidade. Mesmo assim, antes que o evento acontecesse, a distância entre os palcos e as árvores foram motivo de críticas ferrenhas contra a organização.

Com a realização do evento, nem mesmo as árvores foram empecilho para admiração e comoção que o festival causou: pouquíssimas pessoas mantiveram suas reclamações, enquanto a maioria alegou que conseguiu curtir os shows melhor do que imaginavam.

A falta de mobilidade na volta do festival talvez tenha sido o principal ponto de atenção para a organização: com shows que acabavam às 2 da manhã, o público não encontrava alternativas para voltar para casa. Todos os maiores nomes do line-up encerravam suas apresentações antes das 22h, tentando mitigar esse efeito, mas sem muito sucesso: com um line excelente, era praticamente impossível sair às 22h e abrir mão de atrações tão talentosas e queridas pelo público. O caos por um carro de aplicativo foi real, e muitas pessoas tiveram que esperar a reabertura do transporte público, que só acontecia em torno de cinco horas da manhã.

Se o Lollapalooza acaba mais cedo, existem ali outros problemas. A distância do Autódromo de Interlagos até a estação leva pelo menos 20 minutos, fora toda a saga dentro do espaço do festival até alcançar a calçada externa. Não são poucos os fãs de música que se aventuram em maratonas para chegar a tempo de conseguir concluir um trajeto maior nas linhas de trem/metrô: diversas linhas fecham à meia noite, logo, parte do público também não consegue chegar ao seu destino final.

Além dos cancelamentos, outra polêmica cercou o nome do festival devido à denuncias recorrentes de trabalho análogo à escravidão e produtoras (terceirizadas) do evento. Com seu surgimento ano após ano, o público já se questiona quando algo será feito a respeito de tamanho absurdo.

Crédito: Prídia Fotos / Primavera Sound São Paulo 2022

Os espaços

Se o estacionamento com árvores do Distrito Anhembi irritou antes, a localização acabou agradando nos dias do evento: atendendo a proposta do festival de integrar cidade à música, o Distrito contou com uma diversidade de espaços e palcos que abrigou bem o line-up diverso: havia um palco totalmente coberto, o Palco Bits, um palco em um teatro, também coberto e climatizado, que abraçava shows mais intimistas, Auditório Barcelona, os palcos Becks e Primavera que possuíam chão de asfalto e planícies que favoreciam a locomoção, e ainda o Palco Elo, que ficava de frente para uma parte pista e outra parte arquibancada — essa última, se tornando uma favorita entre os fãs do festival.

Já o Autódromo não permite tamanha pluralidade: com poucas áreas asfaltadas e nenhuma região coberta para shows ou praça de alimentação, o formato mais “parque” do evento conta com mais grama, mas também com mais lama em dias de chuva e nenhuma sombra nos dias de sol.

Para quem gosta de reparar nos banheiros, o Distrito Anhembi também agradou com seus diversos banheiros de instalações construídas, enquanto o Autódromo só conta com banheiros químicos. Esse ponto, porém, tende a ser corrigido: uma grande reforma será realizada no espaço de Interlagos, o que indica a construção de banheiros mais adequados. Nesse caso, precisaremos esperar para ver.

A região não tão plana de Interlagos, porém, pode ser um fator a agradar: a distribuição de seus palcos no Lollapalooza é feita de forma coerente, que tende a privilegiar a visão do público que se espalha pelos “morros” do festival, e assim, conseguem boa visão mesmo distantes da grade. Quando bem pensada, a grade de horários pode ter dois palcos com atrações similares e que não demandem tanto deslocamento do palco, como acontece com os palcos Adidas e Chevrolet, no Lollapalooza. Menos deslocamento também é menos cansaço, menos tempo perdido e mais aproveitamento de shows.

Crédito: Prídia Fotos / Primavera Sound São Paulo 2022

A capacidade de ambos também é bem diferente: enquanto o Distrito abrigou 45 mil pessoas em cada um de seus dois dias de festival, não é incomum um dia de Lollapalooza ter mais de 100 mil pessoas presentes. E se multidões fazem shows emocionantes, lembramos que elas também podem produzir mais fila em ativações, banheiros, bares e restaurantes, e ainda causar boas doses de confusão.

A logística do Primavera — que foi tão efetiva com quase nenhuma fila em sua edição —, precisará se reinventar para abrigar mais que o dobro de pessoas. A fama do festival pode trazer essa multidão, mesmo tendo em mente que a proposta artística é diferente de outros festivais mais mainstream como o próprio Lollapalooza. É preciso cuidado e atenção para que as possíveis falhas não manchem um festival que fez uma excelente estreia.

A redação do escutai, que esteve em peso no Primavera Sound São Paulo 2022, está ansiosa para ver tudo que virá na segunda edição — e torce para que o festival se mantenha promissor e aclamado, mesmo sob nova direção.

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