No dia 21 de maio de 2010, o mundo conheceu Innerspeaker, o disco de estreia do Tame Impala. Quinze anos depois, o álbum perpetua sua fama de ponto de virada na música psicodélica contemporânea. Tudo isso por reviver timbres que pareciam esquecidos nas décadas de 1960 e 1970, mas sobretudo por transformá-los em algo novo, vibrante e pungente.
O som de Innerspeaker era, e ainda é, um portal. E Kevin Parker, seu arquiteto solitário, estava só começando a desenhar essa viagem. Era o ritual de iniciação da psicodelia do projeto Tame Impala, bem como a apresentação do trabalho de Parker para o mundo. Menos de uma década depois, ele se tornaria o queridinho da produção de muitos hits da indústria fonográfica.
Psicodelia de quarto em escala mundial
Na virada dos anos 2010, a cena alternativa parecia tentar se reinventar após a saturação do indie rock dos anos 2000. Foi nesse vácuo que surgiu um jovem australiano, com uma Fender Jaguar na mão e muitas ideias na cabeça, gravando sozinho no seu quarto em Perth, Austrália. Kevin Parker, que sempre preferiu trabalhar na solidão dos fones de ouvido, compôs, gravou e produziu quase tudo no álbum, como se estivesse em transe, perseguindo sons que só ele ouvia. A psicodelia, ali, não era só predileção estética: era seu método.
O disco foi lançado pela gravadora Modular, que tem em seu currículo lançamentos de MGMT e Cut Copy. Innerspeaker chamou atenção de nomes como Dave Fridmann, produtor da banda Flaming Lips, que cuidou da mixagem final. O disco é um trabalho coeso e hipnótico de nascença, e na certidão de nascimento sonora constam riffs carregados de delay, vocais etéreos e grooves preguiçosos, típicos de tardes sem pressa.
Faixas como “Desire Be Desire Go” e “Solitude Is Bliss” não precisaram de muito para se tornarem clássicos instantâneos, condensando em três ou quatro minutos tudo que Innerspeaker tem de melhor: o mergulho solitário na mente alucinada de um perfeccionista com alma de rockstar. A última composição, inclusive, foi escrita como um “hino involuntário aos introvertidos”, e que surgiu em um momento de total isolamento e prazer. Mais tarde, virou uma espécie de “lema não oficial” de fãs do Tame Impala pelo mundo.
Um som que cabe em espiral
A capa de Innerspeaker, uma fotografia do Parque Nacional de Karri Valley, no sul da Austrália, foi manipulada para parecer uma espiral hipnótica que se repete infinitamente. Criada pelo artista Leif Podhajsky, a capa traduz a sensação de ser puxar o ouvinte – ou, neste caso, o observador – para dentro de si mesmo. Podhajsky, que mais tarde trabalharia com nomes como Foals, Bonobo e The Vines, capturou o espírito do disco com precisão. Tudo parece expandir e se contrair ao mesmo tempo: natureza, introspecção, isolamento.
Innerspeaker, hoje
O disco se personifica para mostrar os frutos que o trabalho de Kevin Parker gerou. O disco deu início a uma metamorfose que o levaria a explorar terrenos ainda mais eletrônicos e pop nos trabalhos seguintes (além de elevar o Tame Impala como uma dos projetos fonográficos mais expressivos da cena indie). Antes de tudo, ainda em 2010, o que havia era um garoto com um gravador de fita e uma devoção a Hendrix, Beatles e Can.
A estreia do Tame Impala trouxe um álbum que soa nostálgico e moderno ao mesmo tempo, melancólico e ensolarado, introspectivo e dançante. Em um mundo que ainda se surpreendia com o surgimento de tecnologias que, hoje, tornaram-se obsoletas, Innerspeaker soava analógico, artesanal, cheio de imperfeições charmosas. Talvez seja isso que mantém o disco tão vivo quinze anos depois: a sensação de que, ao apertar o play, a viagem começa de novo.